A ciência pelos olhos da Dra. Marinilce Fagundes dos Santos

Publicado por Gabriela Mendes em

Para o meu primeiro post desta categoria, hoje trago para vocês a entrevista que realizei com a Dra. Marinilce Fagundes dos Santos, professora titular do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP) desde 2010. A Dra. Marinilce é graduada em Odontologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP), possui mestrado em Ciências (Fisiologia Humana) pela Universidade de São Paulo (1992) e doutorado em Ciências (Biologia Celular e Tecidual) também pela Universidade de São Paulo (1994).

Entre 1994 e 2008, ela realizou três pós-doutorados: na Universidade do Tennessee (EUA), na Universidade de São Paulo e nos Institutos Nacionais de Saúde (NIH – EUA), com ênfase em fisiologia e citologia e biologia celular. Como professora universitária e pesquisadora, a Dra. Marinilce conta com mais de 30 orientações de iniciação científica, dissertação de mestrado, tese de doutorado e supervisão de pós-doutorado. 

Com mais de 55 artigos publicados em revistas científicas nacionais e internacionais, a linha de pesquisa da cientista envolve migração celular, adesão celular, citoesqueleto, sinalização celular, matriz extracelular, hiperglicemia, microRNAs e GTPases Rho (informação coletada do seu currículo Lattes).

Além disso, ela foi colaboradora em um dos livros mais conhecidos nas áreas de ciências biomédicas e da saúde: “Histologia Básica” por Junqueira e Carneiro, traduzido para 14 idiomas e atualmente na 13ª edição, que contribui na formação de gerações de alunos e professores. 

Agradeço a Dra. Marinilce Fagundes dos Santos pela sua atenção ao responder a essa entrevista e pela oportunidade de poder divulgar um pouco da sua trajetória e suas opiniões como mulher, professora universitária e cientista.

Logo abaixo vocês podem conferir na íntegra essa entrevista muito interessante e motivadora, em que a Dra. Marinilce nos conta um pouco sobre sua visão e experiência como cientista. 

Cientista – era isso que você queria ser quando crescesse?

Não. Quando criança pensava em ser médica… me lembro, no entanto, de fazer muitas experiências misturando produtos de limpeza e outros produtos contidos na caixa de ferramentas do meu pai, todas as vezes que ficava sozinha em casa. Misturava aleatoriamente, armazenava em vidros pequenos e tampava.

Algumas misturas aqueciam, geravam gases e faziam a tampa do vidro voar longe, o que era muito divertido para mim. Mas não havia ali uma ideia de me tornar cientista, ou um sonho de curar uma doença até então incurável. Penso que havia uma curiosidade enorme e uma sensação de diversão com novas descobertas.

Algum cientista ou descoberta científica a inspirou na escolha dessa carreira?

Embora sempre tenha admirado muitas personalidades do meio científico, principalmente mulheres, minha escolha se baseou numa fascinação pelo método científico e pelas oportunidades de contribuição para a solução de problemas na área da saúde humana e animal.

A liberdade de poder estudar um problema considerado clinicamente relevante, pensar em uma hipótese, planejar uma estratégia experimental, obter e analisar os resultados obtidos para reavaliar criticamente a hipótese, avançando um conhecimento específico, são muito atraentes para mim. 

Além disso, o ambiente acadêmico/científico proporciona oportunidades ímpares de interação com pessoas diferentes, de diferentes nacionalidades, uma intensa troca de ideias e de conhecimentos… as fronteiras da ciência estão nas descobertas, e não na geopolítica tradicional.

Até hoje isso tudo me fascina, e continuo me sentindo como se trabalho e diversão estivessem em um campo comum. Continuo gostando das segundas-feiras e das semanas que começam, sempre trazendo desafios novos.

Você já enfrentou alguma dificuldade enquanto cientista por ser mulher?

Tenho a sorte de trabalhar num ambiente universitário, portanto a diferença salarial associada ao gênero não existe. Na minha vivência pessoal não tive qualquer impedimento para ser promovida por ser mulher (atualmente sou Professora Titular na Universidade de São Paulo), porque sempre houve uma séria análise de mérito na minha carreira.

No entanto, reconheço que a Universidade é muito diversa e que existem outros ambientes nos quais a promoção de homens é favorecida em detrimento de mulheres com mérito, para que assumam cargos de liderança.

Apesar disso tudo, em comum a muitas outras mulheres na sociedade brasileira, sofri com atitudes que eu considero muito inadequadas, até mesmo machistas. Me marcaram, por exemplo, uma declaração de um chefe imediato (já falecido), de que a possibilidade de uma gravidez seria considerada uma “traição a um voto de confiança dado a uma mulher, no ato da contratação” – com ameaças de punição, inclusive; e também declarações, por parte de uma outra chefe (sim, mulher!), de que mulheres solteiras e sem filhos deveriam apresentar produção científica maior e melhor, já que têm tempo de sobra na vida – um não reconhecimento à liberdade de cada um de fazer escolhas diferentes daquilo que a sociedade espera.

O machismo é social, está em homens e em mulheres, como todos sabemos. Vejo evolução, apesar das resistências e enormes retrocessos sociais que temos observado no país nos últimos anos.

Descreva, em poucas palavras, a ciência pelos olhos da Dra. Marinilce Fagundes dos Santos.

Ciência e educação de qualidade são nossa melhor aposta para o futuro. São investimentos, e não gastos, gerando muito progresso social no médio e longo prazo. 

 


Gabriela Mendes

É formada em Biomedicina e Mestre em Biologia Celular pela UFU, atualmente é doutoranda em Genética na Texas A&M University, College Station, EUA. Acredita que a educação transforma o mundo e que o conhecimento é libertador, principalmente para as mulheres.

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