Afinal, como devemos lidar com o bem-estar animal?

O conceito de bem-estar animal é complexo e envolve diversas facetas diferentes. Como a ciência por trás do bem-estar animal é ainda relativamente recente, pois basicamente começou a se desenvolver apenas a partir de meados da década de 60, muita discussão ainda envolve a definição e as aplicações práticas relacionadas ao bem-estar dos animais. Embora abordagens relacionadas à emoções tais como o sofrimento e também às respostas de preferência e motivação dos animais estejam mais em alta hoje em dia, elas representam apenas uma das facetas envolvidas no contexto do bem-estar animal. 

Inicialmente, quando pensamos em bem-estar animal, é fácil já imaginarmos alguns elementos mais básicos que devem fazer parte das considerações de bem-estar. Por outro lado, outras facetas envolvidas nesse conceito podem ser mais difíceis de serem associadas a ele… Se você acompanha as atualizações deste blog, deve ser mais fácil para você já pensar em alguns outros fatores que estão diretamente relacionados ao bem-estar dos animais. Saúde física, resposta imune, respostas fisiológicas tais como o estresse, expressão de comportamentos naturais, expressão de estereotipias, sofrimento, tédio, condições que propiciem prazer tais como opções preferidas… todos esses são exemplos de fatores que estão relacionados ao estado de bem-estar dos animais. Mas qual deles pode ser uma melhor ferramenta para lidar com o bem-estar? O que realmente indica as condições de bem-estar dos animais? Como determinar as condições de bem-estar dos animais?

Embora ainda haja muita discussão por aí, não há indicador completamente inequívoco de bem-estar… os indicadores são incompletos (ex: inferir que um animal está em boas condições de bem-estar puramente com base em sua saúde física) e/ou dependem do contexto (ex: resposta ao estresse na hora de lidar com uma situação ameaçadora e momentânea do ambiente é adaptativa, mas ficar sob estresse por longos períodos numa condição mais artificial certamente é ruim para o animal)… E, mesmo aqueles que não são exatamente indicadores, mas sim ferramentas que utilizamos para melhorar as condições de bem-estar dos animais, tais como o enriquecimento ambiental e os testes de preferência e motivação, são dependentes do contexto. O enriquecimento ambiental frequentemente é preparado com base no que nós julgamos, a partir da biologia e história de vida de um determinado animal, o que deve ser bom para esse animal…mas não necessariamente é… Além disso, veja que os testes de preferência estão sempre limitados às opções de escolha que o animal tem no teste, ou seja, a resposta de preferência do animal é sempre relativa.

As discussões sobre tudo isso ainda estão por aí e, provavelmente, a ciência ainda tenha muito a caminhar e a descobrir sobre o bem-estar animal. Entretanto, independentemente disso, um fato que não podemos negar é o de que todas essas facetas mencionadas acima estão, de fato, relacionadas ao bem-estar animal. É claro que, do ponto de vista prático, muitas vezes não temos como considerar todas essas facetas. Mas minha mensagem final aqui é a de que devemos procurar ter bom senso e refletir sobre as coisas. Ou seja, quando vamos procurar ajudar a melhorar as condições de bem-estar de algum animal, devemos ter em mente todas essas facetas e procurar buscar solucionar, do ponto de vista prático, o que for viável e mais relevante para o animal dentro do possível. O animal está saudável? Ele está sob alguma condição estressora mais artificial e/ou permanente? Ele tem ficado doente com frequência? Ele tem estímulos ambientais que são renovados periodicamente em seu ambiente? Ele tem ao menos algumas opções as quais prefere? Ele expressa alguma estereotipia? O que poderia estar lhe causando isso? Há algo no ambiente que potencialmente pode estar lhe causando algum tipo de sofrimento como dor, medo ou frustração? São essas as questões que temos que ter em mente… Assim, ao avaliarmos as condições do animal com tais questões em mente, além de considerar o contexto em que ele está envolvido no ambiente, teremos mais chances de procurar melhorar as condições mais relevantes para esse animal. E lembre-se que, mesmo que não sejamos capazes de mudar muita coisa no ambiente, uma única alteração em favor de melhorar as condições de bem-estar do animal pode fazer toda a diferença para ele…