Classificar em “caixinhas” gera extremismos…

Há algumas semanas eu postei aqui no Blog sobre meu ponto de vista em relação ao problema dos extremismos na Ciência do bem-estar animal. Hoje gostaria de especificar um detalhe que tem muita relação com tais extremismos… ou seja, o problema de classificar questões que envolvem o bem-estar animal em “caixinhas” e seguí-las à risca sem uma análise mais profunda, detalhada e com bom embasamento científico associado. Agora você deve estar pensando: mas o que ela quer dizer com “classificar em caixinhas?” Abaixo vou esclarecer isso brevemente.

Quando tratamos de questões relacionadas ao bem-estar animal não é incomum nos depararmos com pessoas bem intencionadas, que de fato querem proteger os animais, mas que acabam tomando atitudes descontextualizadas. E isso pode, inclusive, colocar os animais numa situação ainda pior do que aquela em que eles se encontravam antes. E como isso acontece? É fácil… as pessoas têm os seus próprios conceitos já bem estabelecidos em mente e seguem tais conceitos meio que “cegamente”. Ou seja, mesmo bem intencionadas, essas pessoas acabam não percebendo a necessidade de sempre contextualizar cada caso específico…

Por exemplo, algumas pessoas acreditam que todo animal silvestre deve viver em liberdade e, portanto, é contra a existência de zoológicos. É claro que muitos zoológicos têm um padrão bem ruim de qualidade dos recintos em que os animais permanecem. Além disso, também sabemos que educação ambiental e reprodução adequada dos animais visando a conservação das espécies ainda está bem defasada nos zoológicos em geral aqui no Brasil. Entretanto, também sabemos que algumas espécies foram salvas da extinção na natureza pela ação dos zoológicos e também que muitos animais que chegam nos zoos são frutos de apreensão de tráfico ou de condições que não permitem que esses animais sejam inseridos novamente no ambiente natural. Assim, na ausência de zoológicos, o que faremos com esses animais? Sabemos que ONGs e outras organizações/instituições não seriam suficientes para receber esses animais…E esse foi só um exemplo, mas temos inúmero outros…

Por exemplo, sabemos dos problemas relacionados ao abandono de animais domésticos e o quanto tais animais podem sofrer. Mas será que todo animal de rua está numa condição rum e precisa ser resgatado? E se ele for bem cuidado pela vizinhança e não se adaptar a ambientes internos como são as casas e apartamentos? Outro exemplo: sabemos que existem testes que causam dor ou outro tipo de sofrimento aos animais de laboratório e que as pesquisas podem ser mal planejadas ou conduzidas de forma equivocada, prejudicando mais ainda os animais envolvidos. Mas será que podemos eliminar todos os testes científicos realizados com animais, especialmente quando pensamos na indústria farmacêutica? Para onde levaríamos os animais utilizados para testes científicos? Será que não há medidas que podem minizar o sofrimento desses animais e reduzir o número deles que precisamos usar para os testes?

São esses tipos de questionamentos que devemos nos fazer antes de tomar medidas extremistas que podem, inclusive, gerar um problema ainda pior… Veja: antes de apenas criticar uma condição de um animal é importante pensar sobre uma solução prática que seja adequada para o problema considerando as questões de bem-estar animal e da sociedade em que vivemos. É claro que há inúmeras situações óbvias em que os animais estão em péssimas condições de bem-estar e que, ao mesmo tempo, não há nenhuma necessidade disso ocorrer, mas há outras situações bem mais complicadas. Nesse sentido, veja que simplesmente considerar que qualquer animal silvestre deve viver em liberdade ou que qualquer animal de rua ou de laboratório deve ser resgatado não basta… Essa classificação das situações que envolvem questões de bem-estar animal em “caixinhas” imutáveis e pré-determinadas pode levar a sérios problemas, inclusive piorando as condições de bem-estar dos animais envolvidos. Assim, veja que em se tratando de bem-estar animal, tudo deve ser bem pensado e contextualizado. 

Então, lembre-se sempre: o bem-estar animal é um conceito que envolve inúmeras facetas, sendo que cada caso é um caso… Assim, é sempre importante contextualizar a situação e, principalmente, pensar em quais são as opções para o animal frente a situação que ele se encontra… Existe uma opção melhor? Tem certeza de que será melhor ou corre o risco de ser ainda pior? Na situação atual, tem algo que podemos fazer para melhor as condições do animal considerando as facetas que envolvem o bem-estar? É fundamental considerar questões de bem-estar animal, mas é importante tomar decisões com bases racionais, lógicas e, sobretudo, científicas, por mais que nosso emocional esteja envolvido. Assim, nosso objetivo deve ser sempre melhorar as condições de bem-estar dos animais dentro do que for possível considerando o contexto, a situação, a espécie e o indivíduo.