Livro Animal Machines, Brambell Report e As cinco liberdades

Como eu já expliquei aqui no blog, embora o estudo do comportamento animal seja praticamente inerente ao desenvolvimento e evolução da espécie humana, a etologia como uma ciência é ainda recente. Assim, a ciência do bem-estar animal é ainda muito mais recente! Seu desenvolvimento gradual começou na década de 60, provavelmente impulsionado pela publicação do livro “Animal Machines” de Ruth Harrison, publicado em 1964. Tal livro expôs uma série de práticas envolvidas nos sistemas de produção que se desenvolveram especialmente após a segunda guerra mundial e que ignoravam o sofrimento animal. A publicação desse livro pode ser considerada como um marco histórico, pois levantou o questionamento sobre a forma como os animais de produção eram tratados.

Nesse contexto, em 1965,  o governo do reino unido encomendou uma investigação liderada pelo prof. Roger Brambell sobre as condições dos animais de produção. Tal fato acabou culminando com o famoso relatório”Brambell Report”, onde constavam algumas recomendações para manutenção dos animais de produção, visando assegurar condições mínimas de bem-estar, evitando assim o sofrimento desnecessário desses animais. Tais recomendações ficaram conhecidas como as “cinco liberdades de Brambell”, que determinavam que os animais de produção deveriam ser capazes de levantar-se, deitar-se, virar-se, limpar-se e esticar seus membros.

Como resultado do relatório do prof. Brambell, foi criado o Farm Animal Welfare Advisory Committee para monitorar o setor de produção animal. Posteriormente, as cinco liberdades passaram a incluir outras características e foram formalizadas por volta de 1979 pelo UK Farm Animal Welfare Council, que havia substituído o Farm Animal Welfare Advisory Committee. As cinco liberdades, como são atualmente reconhecidas, incluem: – liberdade de fome e sede (liberdade nutricional); – liberdade de desconforto (liberdade ambiental); – liberdade de dor, ferimento ou doença (liberdade sanitária); – liberdade para expressar comportamento normal (liberdade comportamental); – liberdade de medo e angústia (liberdade psicológica).

Desde então, as cinco liberdades tem sido adotadas por profissionais como biólogos, veterinários e zootecnistas, influenciando nas práticas de manejo que envolvem não mais apenas animais de produção, mas também animais cativos de forma geral, incluindo aqueles de zoológico e de laboratório. Com base nas cinco liberdades, o manejo que visa manter condições mínimas de bem-estar animal deve então incluir: – água limpa e fresca e dieta saudável e equilibrada, de acordo com a espécie; – ambiente adequado, incluindo abrigo e uma área de descanso confortável; – prevenção ou diagnóstico e tratamento rápido de doenças; – espaço suficiente, instalações adequadas e companhia (preferencialmente de sua própria espécie); -proteção, garantia de condições e tratamento que evitem sofrimento mental, medo e estresse.

Assim, o estabelecimento das cinco liberdades e seu reconhecimento pelos profissionais e organizações envolvidas no monitoramento do manejo dos animais cativos promoveu um grande avanço na forma como tratamos os animais que utilizamos, seja na produção, na ciência, em zoológicos ou ainda incluindo os animais que tratamos como pets. As cinco liberdades vem assim minimizando o sofrimento animal, alertando as pessoas sobre a crueldade envolvida em algumas práticas de manejo inadequadas e assim evitando o descaso para com o sofrimento animal desnecessário. Entretanto, será que atender as 5 liberdades bastam? Esse é um questionamento que será abordado numa próxima publicação aqui no blog!