Os cinco domínios

Já vimos aqui no Blog sobre as famosas “cinco liberdades”, que compõem um marco importante para a história do bem-estar animal. Hoje vamos ver outro marco histórico relevante que se refere basicamente a uma “expansão” das cinco liberdades, os “cinco domínios”, mas que apresenta algumas importantes diferenças. Os domínios englobam outras características também importantes para o bem-estar animal, que foram posteriormente sendo percebidas e então caracterizadas nesses domínios pelos pesquisadores Mellor e Reid em um artigo publicado em 1994.

Os cinco domínios são:

  • domínio 1 – nutrição: envolve questões de privação de alimento, privação de água e desnutrição.

  • domínio 2 – ambiente: envolve questões relacionadas a desafios ambientais, tais como frio, calor, falta de espaço, problemas de manejo…)

  • domínio 3 – saúde: envolve questões relacionadas a doenças, ferimentos e comprometimento funcional

  • domínio 4 – comportamento: envolve questões de restrições comportamentais e de interações com outras ou com a própria espécie.

  • domínio 5 – estados mentais: envolve tudo o que se refere a estados mentais negativos, tais como dor, fome, sede, medo, debilidade, solidão, ansiedade, frustração, depressão e desesperança.

Os primeiros quatro domínios representam componentes físicos, enquanto o quinto domínio representa o componente mental. Veja que o domínio 5 (mental) na realidade é afetado por todos os outros domínios (físico). Por exemplo, se um animal é privado de alimento, ele deve sentir fome ou quando um animal é privado de desempenhar um comportamento importante, ele deve se sentir ansioso e até frustrado. Portanto, o domínio 5 é uma consequência do que está acontecendo com o animal nos outros domínios e, mais ainda, é esse domínio que reflete o estado de bem-estar do animal, segundo os autores. Isso mostra outra diferença em relação às “cinco liberdades” que vão além da abrangência de cada domínio. Essa clara separação e classificação em componentes físicos e um mental, que é afetado pelos físicos e que reflete diretamente o estado de bem-estar, ocorre apenas com a classificação nos “cinco domínios”.

Mesmo assim, é importante salientar que quando analisamos os “cinco domínios”, assim como no caso das “cinco liberdades”, aparece apenas a descrição de “coisas ruins” que devem ser evitadas em cada domínio a fim de melhorar o bem-estar dos animais. Mas e quanto às sensações positivas em relação ao bem-estar? Será que quando evitamos ou ao menos reduzimos “coisas ruins” tais como fome, sede, frustração, medo, ansiedade, etc., automaticamente estamos gerando alguma sensação de prazer para os animais? Não, nós não estamos… e isso foi posteriormente percebido pelo próprio Mellor, um dos autores que propôs os “cinco domínios”…

A partir de meados de 2010, os estados mentais positivos começaram a entrar com força nas discussões sobre o bem-estar animal. Os cientistas e estudiosos da área começaram a perceber que apenas evitar estados mentais negativos não resolve completamente questões de bem-estar animal. É nesse cenário que o próprio Mellor, num artigo publicado em 2016 na revista Animal Welfare, faz uma nova proposta para os “cinco domínios”, de forma que ele propõe um modelo ampliado que incorpora os estados positivos no bem-estar animal.

Nesse trabalho, Mellor argumenta que não podemos eliminar completamente algumas experiências mentais negativas, tais como fome, sede, desconforto e dor, mas apenas temporariamente neutralizá-las, sendo essas experiências adaptativas para os animais. Essas sensações negativas motivam os animais a se comportarem de maneiras específicas para obter recursos importantes, evitar ou reduzir danos físicos ou facilitar a recuperação de infecções ou ferimentos. Mellor também argumenta nesse trabalho que, como mencionei acima, a neutralização temporária desses efeitos negativos, que muitas vezes podem ser fundamentais para a sobrevivência do indivíduo, não gera por si só uma experiência positiva, sendo esta importante para o bem-estar.

Assim, a nova proposta de modelo dos “cinco domínios”, publicada em 2016, abrange estímulos positivos em cada domínio. Nessa nova proposta, os domínios são então apresentados e descritos de forma mais abrangente, sendo importante considerar em cada domínio tanto a eliminação ou redução de estímulos ruins quanto a aplicação de estímulos positivos que possam fornecer algum prazer aos animais.