Por que usar testes de preferência e motivação?

Bem, eu já mostrei como podemos definir respostas de “preferência” e “motivação” nos animais aqui e aqui no blog. Também já discuti aqui com vocês sobre as dificuldades envolvidas na aplicação e interpretação das respostas nos testes de preferência, que também não deixam de ser válidas, ao menos parcialmente, para os testes de motivação. Em vista disso, por que então devemos usar tais testes buscando encontrar condições que melhorem o estado dos animais? Por que tais abordagens seriam significativas para as considerações de bem-estar? Então agora vou expor aqui para vocês o que eu, alguém que tem trabalhado com essas duas abordagens há alguns anos, penso sobre a aplicação dos testes de preferência e motivação para identificar melhores condições para manter os animais.

Os testes de preferência e motivação tem suas limitações. Basicamente, tais respostas dos animais devem ser vistas no contexto em que estão inseridas. Ou seja, as respostas de preferência e motivação são relativas, dependendo das opções disponíveis no ambiente e também podem ser influenciadas pela situação do teste. Claro que realizar os testes por vários dias com os mesmos animais devem minimizar tais influências e, além disso, a aplicação do Índice de Preferência, que recentemente publiquei em co-autoria com o Dr. Gilson Volpato, para determinar as preferências e não-preferências dos animais também minimiza muito a influência das situações do teste. Isso ocorre porque os cálculos do Índice de Preferência dão pesos distintos a escolhas feitas em momentos diferentes pelos animais. Quando no começo dos testes de preferência, os animais ainda não estão ajustados à situação de teste e, portanto, suas respostas de escolha devem ser mais variáveis e menos consistentes, devendo, portanto, ter menos peso nos cálculos para identificar o que realmente os animais querem. Por outro lado, as respostas de escolha mais recentes, mais próximas do agora (quando pretendemos mudar as condições ambientais do animal de acordo com suas preferências) devem ter maior peso em tais cálculos, pois devem melhor representar o que os animais querem no momento. Com o cálculo do Índice de Preferência, todo o histórico das respostas de escolha do animal é considerado (o que também deve ser relevante, pois a resposta só do momento pode ser influenciada por uma série de outros fatores, inclusive condições fisiológicas momentâneas do animal), mas com maior peso para as respostas mais recentes do animal. Entretanto, ainda continuamos com o problema das respostas serem relativas, portanto dependentes das opções disponíveis no ambiente.

Mas quais respostas não dependem do contexto? Quando pensamos em bem-estar animal, o contexto em que o animal se encontra sempre deve ser considerado. O comportamento expresso pelo animal muitas vezes é desencadeado por fatores externos e ambientais, ou seja, dependentes do contexto. É justamente por isso que alguns pesquisadores começaram a se questionar se necessariamente apenas comportamentos tidos como “naturais” quando expressos em animais cativos deveriam indicar que ele estava lidando bem com o ambiente. Afinal, o ambiente de cativeiro é completamente diferente daquele de vida livre, que é muito mais instável, imprevisível, mas controlável (já que o animal tem uma certa liberdade de poder sair de um ambiente caso se sinta desconfortável nele na natureza) que o cativeiro. Ou seja, não dá para esperar apenas comportamentos “naturais” em ambientes nada naturais! A mesma coisa pode ser vista quando falamos em respostas de estresse… Para dizer que um animal estressado está numa condição de vida ruim, também temos que observar o contexto em que ele se encontra, como já mostrei aqui no blog… Ou seja, considerar o contexto que cerca o animal deve sempre fazer parte das considerações de bem-estar.

Assim, é claro que testes de preferência e motivação tem suas limitações como já foi discutido no blog… Mesmo porque, não existe teste perfeito. Entretanto, ainda considero que tais abordagens devem ser não apenas consideradas, mas enfatizadas quando buscamos determinar condições ambientais que enriqueçam o ambiente e melhorem o bem-estar dos animais, pois preferências e motivações refletem o que os próprios animais querem das opções que estão disponíveis a eles. Ou seja, preferências e motivações indicam o que os animais querem no ambiente pelo próprio ponto de vista deles e não de acordo com o que nós, seres humanos que vemos, sentimos e ouvimos de forma diferente de, ao menos, muitas espécies de animais, decidimos que deve ser bom para eles. Preferências e motivações refletem os desejos dos animais pela resposta dos próprios animais, e esta, a meu ver, é a maior vantagem e relevância da utilização de tais testes para considerações de bem-estar animal.