Seleção sexual – continuação

Ainda sobre o tema seleção sexual, agora veremos sobre diferentes comportamentos e estratégias pós-copulatórias dos machos ou das fêmeas que aumentam seu sucesso reprodutivo. Com relação aos machos, um comportamento que eles podem adotar e que aumenta sua chance de paternidade é o que chamamos de “guarda” das fêmeas. Nessa estratégia, antes e após a cópula, o macho segue sua parceira prevenindo-a de acasalar-se com machos rivais. Entretanto, tal comportamento envolve muitos custos, principalmente com relação ao tempo e energia gastos na guarda, que podem impedir o macho de acasalar-se com outras fêmeas. Sendo assim, será que o comportamento de “guardar” as fêmeas compensa para o macho?

Sim! Observações práticas e experimentos conduzidos já evidenciaram que os benefícios superam os custos para os machos na “guarda” da fêmea. Helen-Chuang Dobbs e colegas estudaram a eficácia da guarda da fêmea em uma espécie de pássaro conhecida como Black-throated blue warblers.  Em tal espécie, um único par copula e cuida da prole respectiva, mas é comum que a fêmea de cada par acasale com outros machos (cópula extra-par), o que gera o risco do macho do seu par acabar cuidando de prole que não é dele! No estudo, os pesquisadores acompanharam os machos e suas parceiras nos dias logo antes da deposição dos ovos, que corresponde ao período de maior fertilidade das fêmeas. Basicamente, os pesquisadores registraram a distância entre os indivíduos e com qual frequência os machos seguiam as fêmeas quando se deslocavam. Os pesquisadores também coletaram amostras de sangue dos filhotes para análise genética a fim de determinar a paternidade de cada filhote. Como resultados, os pesquisadores viram que os machos que passaram mais tempo realizando a guarda das fêmeas tiveram menos filhotes provenientes de cópula extra-par. Ou seja, pode ser custoso realizar a “guarda” das fêmeas, mas tal comportamento previne o macho de gastar ainda mais tempo e energia cuidando de filhotes que não são seus!

Entretanto, nem todos os machos conseguem continuamente guardar as fêmeas… Mas há ainda outras estratégias através das quais os machos podem diminuir a chance de sucesso reprodutivo de outros machos. Por exemplo, o macho pode acasalar frequentemente com a mesma fêmea, aumentando assim a chance de seus espermatozóides fecundarem a fêmea no processo de competição espermática com outros machos que acasalarem com ela. Nesse contexto, Susan Crowe e colegas testaram a eficácia dessa estratégia em uma outra espécie de pássaro, conhecida como tree swallows. Nessa espécie, a fertilização extra-par é muito comum e os machos gastam bastante tempo cuidando e protegendo a prole. Tal fato acaba realmente propiciando a evolução de mecanismos que minimizem a perda da paternidade, ou os custos para os machos será muito alto! Os pesquisadores observaram que 53% dos filhotes eram provenientes de cópulas extra-par, mas que o aumento na frequência das cópulas pelos machos aumentou consideravelmente a porcentagem de filhotes que ele próprio gerou.

Uma outra estratégia utilizada pelos machos e que leva ao aumento de suas chances de paternidade é simplesmente causar injúrias ou ainda remover o esperma de outros machos da vagina da fêmea durante a cópula. Por exemplo, há pênis que apresentam estruturas semelhantes à espinhos que danificam a vagina da fêmea e podem ajudar a fixar melhor o órgão durante a cópula, evitando assim que a fêmea acasale com outros machos por causa da vagina danificada, além de promover uma transferência de esperma mais bem sucedida. Além disso, o próprio formato do pênis pode ajudar a remover o esperma de outros machos ao penetrar e fecundar a fêmea. Há espécies em que os machos até mesmo inserem estruturas que funcionam como “plugs” na vagina da fêmea, impedindo-a de acasalar-se com outros machos…

Por outro lado, não apenas os machos apresentam estratégias que aumentam seu sucesso reprodutivo… As fêmeas também tem suas estratégias! Por exemplo, a fêmea pode realizar uma “escolha oculta”(cryptic female choice), que ocorre após a cópula com os machos. Tal comportamento de escolha resulta no esperma de um macho fertilizando uma frequência desproporcionalmente maior dos óvulos da fêmea do que o esperma dos outros machos com os quais ela copulou. Dessa forma, a fêmea pode direcionar o sucesso de fertilização a favor do macho de mais alta qualidade com o qual ela copulou. Além disso, tal estratégia ajuda a evitar a fertilização dos óvulos pelo esperma de um macho que seja um parente próximo, uma vez que filhotes gerados por pais com alto grau de parentesco (endogamia) tem qualidade genética mais baixa, pois a genética dos pais é mais similar entre si (depressão por endogamia).

Mas será que a “escolha oculta” da fêmea realmente ocorre ou seria apenas uma simples competição espermática dos machos? Klaas Welke e Jutta Schneider são pesquisadores que responderam a essa questão examinando se as fêmeas de uma espécie de aranha conhecida como orb spiders evitavam a depressão endogamética de sua prole realizando a escolha oculta. Nessa espécie, as fêmeas ocupam teias que são visitadas pelos machos e geralmente acasalam com 2 machos diferentes. Cada fêmea contém 2 órgãos independentes que armazenam o esperma dos machos, são as espermatecas. Essas estruturas são preenchidas por 2 cópulas distintas, que podem ser realizadas com o mesmo macho ou com machos diferentes. O que os pesquisadores observaram é que as fêmeas prontamente acasalaram com machos irmãos e não-irmãos e que o número de espermatozóides do macho irmão na espermateca não diferiu do outro macho com base no parentesco com a fêmea. Entretanto, as fêmeas estocaram mais esperma e tiveram mais ovos fertilizados de machos não-irmãos (menos aparentados) dela do que daqueles machos mais aparentados com ela. Assim, vemos que a escolha oculta da fêmea acaba direcionando a paternidade para aqueles machos de melhor qualidade, reduzindo assim a depressão endogamética.