Uso de ferramentas

O uso de ferramentas tem sido muito estudado em primatas, tanto em campo como em laboratórios, sendo que geralmente é associado à solução de problemas e também com a capacidade de inteligência dos animais. Desenvolver e usar ferramentas envolve um alto grau de processamento cognitivo, sendo que muitas vezes é necessário selecionar ou ainda “moldar” a ferramenta de acordo com a necessidade imposta pelo contexto. Nesse contexto, já foi frequentemente observado que galhos de árvores são modificados por primatas tornando-os apropriados para alcançar e sondar alimentos, o que é considerado como manipulação e aperfeiçoamento de ferramentas.

Nos processos de aprendizagem por imitação e de transmissão cultural entre os animais que recentemente apresentei para vocês aqui e aqui no blog, a informação transmitida a outro indivíduo pode envolver o desenvolvimento e uso de ferramentas apropriadas para obter alimento, por exemplo. Assim, agora vamos ver especificamente sobre o uso de ferramentas nos animais.  

Segundo o Dr. McFarland, no dicionário de comportamento animal, o uso de ferramentas pode ser definido como o uso de um objeto externo como uma extensão funcional do corpo, alcançando um objetivo imediato. Dessa forma, isso exclui muitos casos de manipulação de objetos por animais que tem uma semelhança superficial com a utilização de ferramentas mas carecem de certos elementos. Segundo tal definição, por exemplo, pássaros que derrubam itens alimentares em rochas abrindo-os não estão usando as rochas como extensão de seus corpos. Entretanto, um abutre que joga uma rocha em um ovo para quebrá-lo está sim usando tal rocha como uma ferramenta. Um ninho poderia ser considerado como uma extensão do corpo que permite criar os filhotes, mas este não é exatamente um objetivo imediato e sim mais a longo prazo. Além disso, os ninhos geralmente não são considerados como ferramentas pelos pesquisadores. Por outro lado, a manipulação de material ambiental para usar como material do ninho pode parecer com o uso de uma ferramenta, mas a maioria dos biólogos distinguiria entre o material sendo manipulado e o significado para o qual o material é manipulado.

Assim, parece até um pouco complicado saber exatamente quando um animal está usando e quando ele não está verdadeiramente usando uma ferramenta… Mas se focarmos em pensar numa ferramenta como uma real extensão do corpo, ou seja, uma ferramenta como algum objeto do ambiente que o animal manipula como se fosse parte de seu corpo e que permite que ele atinja um objetivo, fica mais fácil de compreendermos o significado do uso de ferramentas.

Para finalizar, podemos ainda distinguir situações em que os animais usam objetos da forma como se encontram na natureza daquelas em que os animais modificam objetos para utilizá-los de forma mais adequada dependendo do contexto. Assim, segundo o Dr. McFarland, em alguns casos um animal deve meramente pegar um objeto e usá-lo como uma ferramenta, mas em outros casos, o animal aplica um esforço para alterar o objeto e torná-lo mais eficaz como uma ferramenta. Por exemplo, um pássaro conhecido como Galapagos Woodpecker finch utiliza “sondas” que detectam a presença de insetos (alimento) em fendas e aberturas na casca das árvores. As tais sondas são constituídas por um espinho ou um pequeno galho que a ave segura pelo bico, os quais são selecionados de acordo com a necessidade e podem até mesmo serem quebrados para atingirem um comprimento mais adequado. Assim, o animal utilizou não apenas um objeto do ambiente como uma extensão de seu corpo para atingir um objetivo imediato, mas também modificou tal objeto, tornando-o mais eficaz para a tarefa. Isso deve representar um processamento cognitivo ainda mais elevado nessas situações em que os animais chegam a modificar objetos do ambiente utilizando-os como ferramentas mais apropriadas as circunstâncias em que se encontram.