Todo trabalho científico deve ser publicado para análise da comunidade científica no geral. Mais importante que a análise do referee da revista, é a análise de toda a comunidade. Nesse contexto surge o grande clímax dos cientistas brasileiros: publicar em uma revista científica com alto índice de impacto.
Mas o que é isso? Bem, esse índice se baseia na razão entre citações dos artigos publicados por uma revista e o número absoluto de artigos publicados pela mesma revista. Isto é, quanto mais os artigos de uma revista são citados, mais alto é seu índice. Mas é claro que não adianta publicar um milhão de artigos por ano, deve existir um balanço. Por exemplo, a revista Science (índice de impacto por volta de 30). Esta revista é uma das mais famosas do mundo (quando aparece no jornal nacional algo sobre ciência, é porque foi capa da Science), as maiores inovações da pesquisa mundial são publicadas nela. Assim, por serem artigos referência para várias outras linhas de pesquisa no mundo, os artigos da Science são muito citados em outras revistas científicas.
Outra coisa que também vem inflando (ou desinflando) egos dos pesquisadores é a quantidade de vezes que um artigo seu é tido como referência por outros artigos científicos. Quanto mais melhor! É algo como uma conta bancária, se a minha é maior que a sua, sou melhor que você. Lendo o EurekaAlert, vi que saiu na revista Journal of Vision um editorial publicado pelo seu editor chefe Andrew Watson no qual procura-se novas maneiras de medir o índice de impacto dos artigos científicos. Ao invés de ser pelo número de citações (modo lento, pois demora até outros artigos comecem a usar o seu como referência), a nova maneira seria medindo o número de downloads do artigo (mais rápida, qualquer servidor tem a habilidade de dar esse dados em tempo real).
Novos métodos à parte, eu me pergunto: Para quê isso? Um artigo só é bom se ele for citado por muitas pessoas? Um artigo só é bom se for capa da Science? Um artigo só é bom se um dos autores for alguém muito renomado? É um absurdo perder tempo com isso, é o tipo comportamento americano: “Eu tenho que ser o melhor, os números mostram isso!!!” Parece que um cientista só é respeitado se for um grande publicador, ou se já tiver publicado no revista ultra famosa.
Science, nature e PNAS são revistas do hemisfério norte. São os quintais dos cientistas americanos e europeus. Pesquisa tropical era algo tido como curiosidade até pouco tempo. Na área em que trabalhei, agora que estão entendo a importância dos ambientes tropicais (principalmente no ciclo do carbono). Sabe o que deveríamos fazer? Publicar isso em revistas nacionais, para aí sim eles começarem a dar valor as nossas publicações. Mas não, logo que temos algo bom queremos mandar para revistas internacionais, mesmo se for uma do Paquistão! Com esse comportamento, nunca iremos ter revistas com grande impacto mundial.
Outro fato, é que do mesmo jeito que existe camaradagem aqui, lá também tem. Os editores dessas grandes revistas são cientistas renomados, os quais têm amigos que são favorecidos na hora da publicação. É fato, não é só o Brasil que é corrupto. Europeus, chineses, americanos também são. Além disso, os artigos que mais vão sair nessas revistas são (maioria) os que têm alguma importância para eles (tentem visualizar um artigo sobre esquistossomose saindo na Science. É meio difícil, apesar de ser de importância gigantesca para gente). Indo um pouco mais além, a pesquisa nesses países se encontra anos luz na frente do nosso, não em termos de recursos humanos (nossos cientistas são maravilhosos), mas em recursos físicos.
Na minha humilde reflexão, por que não fazer um índice de impacto no qual o que fosse levado em consideração fosse o número de vidas humanas salvas ou o número de pessoas que tiverem uma melhoria na qualidade de vida? O objetivo da ciência não é esse? Então, nada mais justo.
Parece piegas? Pode até ser. Mas é bem mais útil do que ficar vendo se o meu índice é maior que o seu! Pelos menos estaremos retribuindo o dinheiro investido.
é gente, tenho que concordar com o que dizem sim, MAS, tem que haver algum critério. o número de citações é uma delas. não acho mau que pesquisadores se sintam realizados quando publicam em revistas estrangeiras com impacto alto. é necessário valorizar sim a publicação local, mas meu DEUS, não precisa satanizar os critérios para medição dos índices de impacto actuais;
O fortalecimento de nossas revistas e um forte investimento nelas por parte da CAPES/CNPq seria uma alternativa para fazermos frente ao atual panorama. De que adianta publicar em uma revista estrangeira um assunto tão importante para nós? Parace haver medo dos agentes de fomento de não conseguirem fazer frente ao grupo de editores internacionais. Mas se não reagirmos agora, vamos ficar como ficamos até agora, sempre dependentes de tecnologia externa. Façamos como os indianos: publicam tão intensamentee fora do país quanto dentro. Estão fortalecendo as revistas deles e se tornaram referência em tecnologia. Os chineses, estes apesar de publicarem vorazmente fora do país não deixaram de fazer o mesmo em suas revistas. Acho humilhante ter qee se associar a cientistas estrangeiros apenas para poder publicar em certas revistas. É isto o que está ocorrendo. Além disto temos de pagar fortunas para permitir o acesso aos nossos próprios artigos em revistas estrangeiras. E quem banca isto? Nosso enorme salário de professor, pesquisador e bolsista.
É válido que a publicação numa revista científica seja avaliada por pessoas capacitadas para tal. Além do mais a análise prévia de uma publicação não é realizada por apenas um referee. Outra coisa, se é privilegiado um determinado autor em relação a outro e que não seja pelo caráter da publicação isso é uma questão de falta de ética e princípios morais. Faz-se necessário valorizar e incentivar mais as pesquisas nacionais e depois criar meios de avaliar o índice de impacto de uma publicação nacional.
Concordo com o que você expõe.
Pelo menos a minha área (ecossistemas áquaticos) é bem mistificada (no sentido da população em geral não entender muito). As publicações de alto indice não vão dar espaço a minha pesquisa, por exemplo, sobre degradação bacteriana em lagoas, quando o que dá visão na midia é uma pesquisa sobre novas formas de se ler um DNA, por mais que já tenha várias formas de se ler um DNA.
O investimento seria minimo para financiar uma pesquisa sobre esquistosomose no nordeste brasileiro, mas os órgãos financiadores preferem investir naquilo que dará 'fama' e não no que é realmente útil. Não digo que pesquisas sobre genetica não sejam úteis, são sim, e muito, porém séria muito bom se as pesquisas menos visadas mas com utilidade prática também tivessem um investimento legal!
É útopico? pode até ser, mas prefiro acreditar que o Top 5 das pesquisas um dia mude e dê oportunidade para outros assuntos!
(Não adianta saber ler um DNA de 10 formas diferentes e ter crianças morrendo por causa de coléra só pq falta pesquisa em tratamento de água)
Nossa concordo plenamente.
Literalmente "pagar pau" pra resvistas estrangeiras é só mais um tipo de cultura que acredito eu (como já disse) provém de uma geração de cientistas que só chegaram ao seu nível acadêmico saindo do país, e hoje desprezam tudo que veem por aqui. Conheço muuuitos assim, e creio que não sou o unico...
Caro André,
O que eu propus no final do post foi para reflexão. É claro que não temos como avaliar isso com certeza para ser um índice (mas se pudéssemos seria ótimo!). Além disso, não é só pesquisa de ponta que tem resultados práticos e importantes para sociedade. Pesquisas básicas podem também se revelar de grande importância. Alguns problemas são simples e de fácil resolução, a questão é investimento mínimo e comprometimento político.
Abraços
Concordo com o fato de que essas medidas de 'excelência' acadêmica são extremamente falhas e criam um agonismo no discurso acadêmico completamente desnecessário.
No entanto, como ficaria a pesquisa básica caso o índice de impacto incluisse medidas como número de vidas salvas ou melhoria na qualidade de vida?
Mas de novo: concordo com o ponto principal do post: o termômetro sobre o que é bom/válido na academia deveria ser outro.