O mundo bacteriano realmente é impressionante. Bem, esse mundo é o que nós vivemos. Isso mesmo! Nossa possibilidade de viver depende em grande parte da nossa interação com bactérias. Por exemplo, algumas importantes vitaminas são produzidas por bactérias que habitam nosso sistema digestório, ou ainda, esses pequenos seres nos protegem de infecções por outas bactérias (mas essas patogênicas). Fora a importância ambiental desses microorganismos, pois participam de quase todos os ciclos biogeoquímicos (carbono, nitrogênio, enxofre…)
Então achar que bactérias são somentes seres malvados e que querem nos matar é uma ideia completamente errada. Ideia essa reforçada por imbecis apresentadores de TV como o não-fazedor-de-sexo Doutor bactéria. Ou pelo lobby da industria farmacêutica e cosmética: o exemplo clássico é um comercial de pomada que, tentando se mostrar descolado, mostra vários casais, sendo que um formado por dois homens e uma criança solta a pérola “Eu odeio bactérias!”. Odeia bactéria, beleza, então tome doses diárias de Lysoforme para ir se esterelizando todo dia, ou melhor, entre numa autoclave e faça uma sauninha por 20 minutos. Assim, meu amigo, você estará livre de bactérias.
Nesse contexto de admiração divina pelas bactérias, assisto uma palestra da pesquisadora Bonnie Bassler (Universidade de Nova Jersey). Nessa palestra, Bassler fala sobre a capacidade das bactérias de conversarem umas com as outras. É claro que elas não falam, elas usam compostos químicos que possibilitam que esses microorganismos percebam quantos de suas espécie os rodeiam. Isso mesmo, elas liberam compostos químicos de presença, assim, essa população “sabe” quantas delas se fazem presente naquele momento. Essa comunicação se chama Quorum sensing. Mas por que isso? Bassler mostra que algumas ações tomadas por essa população de bactérias só acontecem a partir de um certo número mínimo da componentes. Assim, quanto mais desse composto químico, mais as bactérias percebem que sua população está aumentando. Até um momento que existe o disparo de um gatilho que permitirá que alguma ação seja tomada por essa população.
Mas ai você me pergunta: “Mas por que diabos elas se acedem?”. Agora vem uma das coisas mais interessantes que já vi na natureza. Essas bactérias ficam em associação com alguns seres marinhos, mas o mais legal são algumas lulas. Sendo que a mais interessante é a lula havaiana Bobtail.
Mas outra coisa mais incrível ainda é que estas lulas no início do dia (quando ela sente os raios solares) expulsam a grande maioria (95%) dessas bactérias de seu corpo. Evitando que imensas colônias desses microorganismos causem algum tipo doença. Assim, durante o dia, quando se encontra interrada enterrada na areia descançado e se escondendo, o pouco de bactérias que sobrou se multiplica até chegar a noite. No início da noite, essas bactérias atingem um certo número que (devido a sua comunicação) as fazem acenderem de novo. Tudo isso é bem regulado pela comunicação entre essas bactérias. Impressionante, não?
Essa é só a primeira parte desse mundo maravilhoso da comunicação bacteriana. Veremos em um post futuro como bactérias podem interceptar nossa comunicação corporal. Bactérias espiãs!
McLemos,
pelo que eu sei, somente dentro da lula que essa população de bactérias consegue chegar em um número de indivíduos sufucientes para gerar luminosidade. Então, pode ser que a lula sirva como um criadouro turbinado para essas bactérias, expulsando um grande números de indivíduos ao amanhecer. Essa é a vantagem que vejo para esses microorganismos.
Abraços e obrigado pelo comentário
Mas.. as bactérias só ganham a moradia em troca? Ou há algum benefício fisiológico? Acho que não pode ser classificado como mutualismo, neh? Uma vez que a lula deve ter uma população controlada de bacérias! Na verdade eu não saberia classificar essa interação!
Muito obrigado pelos comentários.
Desculpe pelo erro de portugês, sempre deixo um passar.
Abraços
O texto está muito bom! Recentemente comecei a ler mais sobre QS e encontrei artigos interessantíssimos. =D Agora tenho mais um exemplo!
Ah, só um toquezinho: Na sétima linha de baixo pra cima, no lugar de interrada, penso que você quis dizer enterrada. =)
Não achei a música chata, pelo contrário: é genial como o vídeo capta e re-utiliza as técnicas do cinema mudo. Genial! Genial! Genial!
Hilário isso de "eu odeio bactérias". Um organismo multi-celular simplesmente não sobreviveria sem a simbiose com bactérias e elas são uma grande proporção do material vivo de qualquer sistema multi-celular. Fora que mesmo as patogênicas são importantes e muitas delas se tornam patogênicas por um desbalanceamento do organismo, pois estão lá em condições de saúde, desempenhando funções das quais dependemos. A contaminação por bactérias patogênicas é também importante para informar o nosso sistema imunológico, que funciona mais ou menos como uma programação fuzzy que é capaz de aprender. Uma mãe super-protetora que ouça a anamariabraga e desinfete com perfeição o ambiente de seu bebê está de fato causando um grande mal ao infante.
Para além disso, sem a simbiose intracelular com uma bactéria, ocorrida há talvez bilhões de anos, jamais seria possível a formação de organismos multicelulares. Falo da mitocôndia (e para a planta, da qual dependemos para o próprio oxigênio e alimentação, através de uma cadeia de alimentação ecológica, também dos cloroplastos, sem os quais nada disso seria possível). A mitocôndria foi a responsável pelos nossos parentes unicelulares lá no início dos tempos, serem caapazes de utilizar uma substância tóxica - o oxigênio - para amplificar sua produção de energia a partir dos alimentos - a chamada respiração aeróbica (do ponto de vista celular, a respiração é a conversão de substãncias em energia, via ATP e ADP que possibilitam a realização de outras tarefas metabólicas, como a produção das moléculas constitutivas das células e a reprodução - fazemos, nossas células eucariontes fazem tanto a respiração anaeróbica - repiração, ou seja, produção de ATP e ADP, sem oxigênio - como a respiração aeróbica - e temos uma bactéria que invadiu uma célula primordial e ficou lá como convidado especial para sempre, temos a mitocôndia, essa tatatatata...tataraneta dessa bactéria invasora a agradecer por isso). Sem essa invasão de uma bactéria, as células que deram origem a organismos multi-celulares jamais teriam energia química suficiente para tanto.
Portanto, se você odeia bactérias, se mata.
Hahahahaha
Acho que vou trabalhar com esse genero de vibrio.. me pouparia o trabalho de marcar os meus com sondas fluorescentes.. show de bola!
Muito legal o post!
Ps: Também detesto o Dr. Bactéria (plaquear E.coli até minha prima de 6 anos faz!)
Aê, muito interessante o post. Trabalho uma oficina chamada "espiral da vida", puxando do microcosmo quântico até Gaia ou o universo, passando pelas interações sociais e biológicas que acontecem nesse interim. Aí trabalho com documentos e referenciais coletivos como o Tratado de EA Carta da Terra, Agenda 21, tecendo conexões com a realidade local. Agora tenho mais uma abordagem pra me basear, com foco justamente na dimensão comunicativa. A interação bacteriana!
Muito bom... posso te linkar?
Abção, paz e bem!
Olá,
muito interessante, e escrito de uma maneira gira. gostei. Sempre a aprender.
Sensacional, lembro de ter estudado o Quorum sensing na faculdade, mas estudei bem na teoria e sem muitos exemplos práticos. Parabéns pelo artigo.
Mutualismo em ação. Interessante as cartadas da evolução. Em algum momento, uma lula com este tipo de bactéria tornou-se mais adaptada ao ambiente, simplesmente porque conseguira enganar suas presas. Suas descendentes de hoje e amanhã agradecem às primeiras que deram carona às bactérias...