No livro Desvendando o Arco-Íris, Richard Dawkins escreve, dentre outras coisas, o quanto a ciência pode ser poética. Isso se deve ao fato que alguns poetas não enxergarem beleza na ciência. Pelo contrário, a ciência desvendava segredos que pairavam dentro das mentes dos poetas, sendo fontes de inspirações para seus textos.
O título vem daí, a ciência foi capaz de revelar o singular e místico arco-íris. O pote de ouro não se encontrava mais distante e inalcançável, mas agora é só luz sendo decomposta quando passando por gotículas de água presentes na atmosfera com alta umidade.
Para a maioria dos homens; um prazer ignorante é melhor do que
um bem informado; é melhor conceber o céu como um domo azul
do que como uma cavidade escura, e a nuvem como um trono dou-
rado do que como uma névoa de granizo. Eu questiono se alguém
que conhece óptica, por mais religioso que seja, pode sentir com
igual intensidade o prazer ou a reverência que um camponês ile-
trado sente diante de um arco-íris.Ruskin (
Modern Painters III, 1856)
O conhecimento matou o Sol, transformando-o numa bola de gás
com manchas […]. O mundo da razão e da ciência […], esse é o
mundo seco e estéril que a mente abstratan habita.
D. H. Lawrence (
Unrhyming Poems, 1928)
Isto acontece devido a capacidade de desaceleração que a água exerce sobre a luz, como quando esta passa por qualquer meio transparente. Cada comprimento de onda da luz visível sofrerá um desaceleração própria, sendo assim, a luz branca é decomposta em todos os comprimentos de onda que a compõe, gerando as cores do arco-íris.
Ouvindo a rádio Band News, no quadro do ator Juca de Oliveira, escuto ele recitar este poema:
Budismo Moderno
Tome, Dr., esta tesoura, e … corte
Minha singularíssima pessoa.
Que importa a mim que a bicharia roa
Todo meu coração, depois da morte?!
Ah! Um urubu pousou na minha sorte!
Também, das diatomáceas da lagoa
A criptógama cápsula se esbroa
Ao contato de bronca destra forte!
Dissolva-se, portanto, minha vida
Igualmente a uma célula caída
Na aberração de um óvulo infecundo;
Mas o agregado abstrato das saudades
Fique batendo nas perpétua grades
Do último verso que eu fizer no mundo!
Augusto dos Anjos
Porém quando vou procurar mais informações sobre Augusto do Anjos me deparo com este trecho na
wikipedia:
“Mas a Ciência, que marca fortemente sua poesia, seja como valorizada ou
através de termos e conceitos científicos, também lhe traz sofrimento,
como nota Kopke. É marcante também a repetição de temas nessa poesia, e
um sentimento de solidariedade universal, ligado à desumanização da
natureza e até do próprio humano, o que reduziria todos os seres a uma
só condição.“
Daí meu estranhamento, será que Jonh Lenon tinha razão:
“A ignorância é uma espécie de benção. Se você não sabe, não existe dor” Não, não para isso! Nessa hora me lembro da alegoria da caverna de Platão. Estamos acostumados com as sombras, elas fazem muito sentido. Mas por trás delas existe beleza e luz. Eu, como pesquisador que fui (mas querendo voltar a ser um dia), acredito que a ciência pode tirar as pessoas desse vale das sombras da ignrância. Como não achar belo a base bioquímica do funcionamento de uma
ATP sintase. Observem esse vídeo (é em Inglês, mas dá para entender), só de observar a animação fico de boca aberta. Isso acontece dentro de todas as células do seu corpo, o dia inteiro e por todo a sua vida (quando pára você morre!rs).
Não existe beleza nisso? Claro que existe, mas como qualquer coisa, precisamos entender para admirar. O estranho não é belo, é apenas curioso. Quanto mais pudermos nos familiarizar com o que a ciência revela, e pudermos entender onde isso atua e como afeta nossas vidas, a beleza surgirá. É um dever político, mas também dever de quem produz o conhecimento mostrar isso para a sociedade que financia estas pesquisas. Nós blogueiros somos um facilitador desse processo, uma ponte sobre o fosso entre o castelo da academia e a população. Uma sociedade mais esclarecida entende melhor seus direitos e, assim, pode protestar por eles.
Muito bom Breno. Parabéns pelo texto.
Acredito que outra contingência é o grande volume de literatura científica (em artigos, livros técnicos, etc), de linguagem predominantemente hermética e especializada, que os pesquisadores são obrigados a consumir para acompanhar sua área, deixando muito pouco tempo para outros tipos de leitura.
Há que se conseguir um tempinho para essas leituras - elas são importantes para arejar a mente e estimular a imaginação dos pesquisadores - refletindo até mesmo de forma positiva no seu trabalho.
Para Barthes, "A ciência é grosseira, a vida é sutil, e é para corrigir essa distância que a literatura nos importa".
(BARTHES, Roland. O prazer do texto. São Paulo: Perspectiva, 1996. p.19.)
Já repararam como os artigos científicos antigos têm uma escrita mais palatável? Eu diria, até, mais prazerosa?
Elvis
Concordo com vc. E divido o mesmo pensamento que Dawkins, conhecimento por si só, para mim, é algo incrível e soa como poesia soa no ouvidos dos poetas.
Manuel
Muito obrigado, agora sobre a morte da poesia... isso filosófico.rs
André
Vc disse tudo. Pegue os artigos publicados por volta da década de 60. São lindos, tenho como exemplo o Conclunding Remarks do Hutchinson. É uma obra de arte.
Sei lá, Breno...Acho q a falta de poesia na ciência deve-se mais a falta de cientistas poetas (ou poetas cientistas) que a falta de tema e "mistério"...Tipo: Pode-se enxergar a beleza em uma pilha de fezes que, através de vários processos bioquímicos acaba por compor uma rosa, por exemplo, em vez de descrever que há fadas no jardim...
O pesquisadores de hoje precisam correr para escrever artigos. E,apesar das vantagens óbvias, a própria forma de citar artigos aliada a pressão de publicação torna muitos artigos em um imenso "bloco quadrado de Lego", sem umas "curvas de boa escrita" que valorizariam bem o texto, o tornaria belo como um poema e mais bem compreensível ao público leigo
Caro Breno Alves
Encantado com o seu texto e o vídeo. Mas haverá alguma coisa que mate a Poesia? De um Poeta,António Gedeão,um cultor da Ciência,deixo-lhe os últimos versos de Pedra Filosofal.
Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.
Acrescento ainda: conhecimento não é esgotável. quanto mais sabemos, mais sabemos que sabemos muito pouco. Daí que o prazer de descobrir só aumenta, como aqueles mágicos que puxam um lenço da manga, e no lenço tem outro amarrado, e nunca param de sair lenços.
Conhecimento abre portas para ainda mais mistérios, desvendá-los é muito mais prazeroso que mistificá-los. O mito até pode ser bonitinho e poético, mas se eu entendo um pouco o ponto do Dawkins, também é muito sensacional olhar para a natureza e enxergar nela tudo (e saber que se está enxergando só uma pequena parte) o que está acontecendo.