O Horário de Verão e as Economias de Energia: o chuveiro elétrico

O Horário de Verão e as Economias de Energia: o chuveiro elétrico

Este é o primeiro texto em que são analisados os impactos de mudanças nos horários de uso de equipamentos elétricos em decorrência da introdução do Horário de Verão (HV). Estudaremos separadamente os principais equipamentos utilizados no setor residencial neste momento para verificarmos os impactos na conta do consumidor e também a possível contribuição para a economia de energia do sistema interligado nacional. Sabemos que o número de horas de luminosidade natural é especialmente maior em latitudes mais baixas, por isso é apenas aplicado no Brasil nos estados do Sul, Sudeste e parte do Centro-Oeste. A temperatura também varia ao longo do dia, concentrando médias mais altas nos períodos da tarde. Esses dois fatores, aliados fortemente a mudanças de hábitos de consumo (que ainda não conhecemos muito bem, a dizer a verdade) influenciam significativamente no desempenho e no consumo dos equipamentos elétricos que utilizamos em residências e edifícios em geral (iluminação, condicionamento e ventilação, refrigeração e aquecimento de água).

Conforme mencionamos no texto anterior, o período de pico do sistema elétrico interligado nacional (SIN) está se modificando como resultado de alterações não só no perfil do consumidor brasileiro mas também de temperaturas mais altas. Tradicionalmente, o horário da demanda máxima se encontrava entre 18:00-21:00, e o período do ano quando ocorriam as máximas anuais era entre maio e agosto (meses mais frios), ocasionadas pelo consumo das regiões Sul, SE e CO. Mais recentemente, isso se alterou: o horário de pico passou a ser durante a tarde (entre 14-16h) e se deslocou para os meses mais quentes de verão (dezembro a março). Isso já havia sido observado com bastante detalhe pelo colega A. Poole em 2011 em seu artigo “Implicações do Novo Perfil de Carga do Sistema Elétrico Brasileiro para a Nova Estrutura Tarifária, Gestão da Demanda e Eficiência Energética”.

Alguns equipamentos são pouco sensíveis com relação a variações de temperatura e, sua utilização com a defasagem de uma hora apenas contribui para reduzir sua coincidência com outros usos de eletricidade que não se alteram com o HV. É o caso do chuveiro elétrico, um equipamento muito disseminado no país. Ele é conhecidamente importante para a formação do ponta do consumidor residencial (especialmente nas regiões S, SE e CO, entre 18-21 h. Esse pico da demanda do consumidor residencial também coincide com o com o pico do SIN nesse período. Portanto, um dos objetivos é o de promover seu deslocamento com o HV. Uma estimativa que temos é que o consumo de eletricidade em chuveiros, cuja parcela representa cerca de 25% do consumo total de um uma residência nessas regiões, é um dos principais equipamentos residenciais que contribuem para o pico das 18-21h. Em pesquisas de campo entre consumidores de baixa renda da cidade do Rio de Janeiro verificamos um fator de coincidência de 20%, ou seja 20% dos chuveiros estavam sendo utilizados simultaneamente no horário em que a concessionária registrou sua demanda máxima entre 18-21h.

Se não houver uma alteração na duração de banhos (assumindo também que o consumidor não vai alterar a posição de potência do chuveiro e nem o próprio chuveiro por outro elétrico com mais opções de temperatura) o efeito no consumo e nos custos de energia para o cliente residencial é nulo, pois, em geral, o valor R$/kWh não varia com o horário de consumo. Entretanto, atualmente existe um tipo de tarifa – A Tarifa Branca – que possui diferentes custos de energia para o consumidor dependendo do horário de uso. O objetivo dessa tarifa é justamente o de promover o deslocamento da carga para fora do período de pico, oferencendo uma tarifa menor (conforme a figura ao lado). No entanto, para a presente análise não consideraremos essa situação pois é ínfimo o número de consumidores que optaram por essa tarifa. Embora, o HV tenha pouca influência no consumo de energia dos chuveiros ele certamente possibilita uma redução no pico do SIN (assumindo a manutenção do comportamento do consumidor durante o HV, comparado com o  horário normal – HN), pois deve diminuir a sua coincidência com o pico do sistema.

As premissas e o método utilizado

Ao longo dessa pequena série de artigos manteremos algumas premissas básicas para todos os equipamentos e faremos as estimativas considerando quatro situações: 1) o dia mais quente do período HV; 2) o dia mais frio; 3) o dia mais longo; e 4) o dia mais curto. Os cálculos foram feitos considerando os dados climáticos horários para o período do HV deste ano ano. Utilizamos o software GridLAB-D para realizar as simulações apresentadas.

Utilizamos esses resultados para estimar o consumo do dia médio e extrapolar esse valor para o período total de vigência do HV. Fazemos o mesmo procedimento para estimar o consumo considerando o horário normal (HN). O estudo tem como referência uma família composta por quatro pessoas, dois adultos e duas crianças, as quais vivem numa residência simples configurada em quatro cômodos, situada na cidade de Sorocaba-SP (em estudos futuros trataremos os dados de entrada de modo a melhor representarem a regiões abrangidas pelo HV). O uso do chuveiro elétrico na rotina da família, ao logo da semana, é caracterizado por dois eventos: às 05h35 cada banho tem a duração média de 10 minutos, com o seletor de temperatura posicionado em “quente”; enquanto que às 19h30, todos da família realizam um banho de mesma duração com o seletor de temperatura ajustado “morno”. Para o dia mais frio, assumimos que o seletor do chuveiro é posicionado em “quente” para o banho noturno. No caso do chuveiro elétrico assumimos um equipamento com as características na Tabela abaixo:

Resultados

Os resultados totais para o consumidor considerando o HV e o horário normal, estão apresentados abaixo para o dia mais frio registrado no período (dia 17/11/2014):     Para o dia mais frio o consumo de eletricidade foi de 4,4 kWh para os banho da residência, nos demais dias simulados o resultado foi de 3,1 kWh (não assumimos alterações no uso do chuveiro). Utilizamos o valor da média ponderada entre esses 4 valores de 3,4 kWh para o período. Neste caso, o consumo total durante os 126 dias de HV seria de 428,4 kWh, que seria o mesmo durante o HN. Conforme discutimos acima, a antecipação do uso dos chuveiros durante o HV ajudaria a diminuir sua coincidência com o pico do sistema, mas não teria impactos na conta de eletricidade do consumidor.

Conclusões

O HV não deve ter impactos no consumo de energia em chuveiros elétricos. No entanto, conforme discutimos acima, a antecipação do uso dos chuveiros durante o HV ajudaria a diminuir sua coincidência com o pico do sistema, mas não teria impactos na conta de eletricidade do consumidor com a tarifa residencial convencional. _ Essas estimativas foram realizadas com a colaboração de Eng. Humberto Jantim Neto, Mestrando em Planejamento de Sistemas Energéticos, UNICAMP.

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Gilberto

Professor Titular em Sistemas Energéticos do Departamento de Energia, Faculdade de Engenharia Mecânica da UNICAMP (Universidade de Campinas), Pesquisador Sênior do Núcleo Interdisciplinar de Energia da UNICAMP (NIPE-UNICAMP). Diretor Executivo da International Energy Initiative-IEI, uma pequena, organização não-governamental internacional, independente e de utilidade pública conduzida por especialistas em energia, reconhecidos internacionalmente e com escritórios regionais e programas na América Latina, África e Ásia. O IEI é responsável pela edição do periódico Energy for Sustainable Development, da editora Elsevier.

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