Cubo instantâneo

Não lhes peço que aceitem nada, se acharem que não há base para tanto. Em breve irão todos concordar com as minhas premissas. Todos sabem, imagino, que uma linha geométrica, uma linha de espessura igual a zero, não tem existência real. Estudaram isso, não é? Assim como um plano geométrico também não existe. Tais coisas são meras abstrações. Do mesmo modo, um cubo que possua apenas altura, largura e profundidade não pode ter uma existência real.

Nesse ponto talvez você discorde, afinal corpos sólidos existem. Podem não ser perfeitos como cubos, mas os objetos ao nosso redor são corpos sólidos com altura, largura e profundidade. Essa foi a mesma questão que o senhor Filby fez para o Viajante no Tempo do livro A Máquina do Tempo de H. G. Wells publicado originalmente em 1895, do qual o primeiro parágrafo foi extraído.

Como resposta o Viajante no Tempo questiona o senhor Filby sobre cubos instantâneos existirem? Ou seja, se temos um cubo com altura, largura e profundidade, mas que dure apenas um infinitésimo de tempo, podemos dizer que esse objeto ainda assim é uma existência real?

Nesse sentido, o Viajante no Tempo explica que: qualquer objeto real deve se estender em quatro direções: ele deve ter Altura, Largura, Espessura e Duração. Mas devido a uma limitação natural dos nossos sentidos, que já explicarei, temos uma tendência a desprezar este último aspecto. Existem na verdade quatro dimensões, três que constituem os três planos do Espaço e uma dimensão adicional, o Tempo. Temos, no entanto, uma tendência que nos faz estabelecer uma distinção irreal entre as três primeiras dimensões e a última, porque nossa consicência se move de maneira intermitente em uma direção só, ao longo desta última do começo ao fim das nossas vidas.

Parece um conceito estranho, talvez até mesmo sem muita relevância para nosso dia a dia. Mas certamente aqueles que já se colocaram a escrever algum código de computador, em dado momento devem ter criado objetos de duração infinitesimal.

  1. Pense comigo, estou aqui escrevendo o código que gerará a aplicação de um cubo;
  2. Defino um vértice e dele obtenho 3 vetores linearmente independentes;
  3. Dou para o computador essa informação, que é suficiente para gerar um cubo;
  4. O computador compila e dá tudo certo, porém não vejo aparecer cubo nenhum.

De fato o computador gerou uma representação de um Cubo com as 3 dimensões espaciais (altura, largura, profundidade). Porém, sem duração, desse modo, o computador logo após gerar o Cubo, já encerrou o código. O Cubo gerado obedecia a todas as características de um Cubo no espaço tridimensional, mas alguém o viu? Sabemos que esse objeto existiu por apenas um instante de tempo, um Cubo Instantâneo.

Assim, retomando a discussão do Viajante no Tempo para nosso contemporâneo. Embora esse Cubo Instantâneo tenha um sentido para a realidade de quem programa, para a realidade sensível e tangível na qual vivemos, esse Cubo teria ainda algum sentido?

Dessa forma, o Viajanta no Tempo defende que os objetos tenham também sua duração. Por exemplo, um cubo de gelo, ele tem uma período de existência. Nem sempre ele foi aquele cubo de gelo e um dia ele não será mais. Então, além da Altura, Largura e Comprimento, temos o tempo que o objeto existe naquela forma. Um cubo de gelo quando começa a derreter, já não pode mais ser considerado o mesmo cubo de antes.

Assim como um programa que compila os dados e gera um Gráfico com apenas Altura e Largura e então desaparece. A função do Gráfico que é facilitar a interpretação dos dados pelo usuário não pode ser concretizada, visto que a dimensão tempo não estava presente nesse objeto. Assim, para que alguém visualize o Gráfico e ele cumpra seu papel de fazer parte da nossa realidade, mesmo esse objeto de estrutura aparentemente bidimensional (Altura e Largura) também precisa de uma terceira dimensão (tempo), ou seja, computacionalmente falando, este seria um Gráfico tridimensional 😛

Gostou dessa discussão esquisita? Fica a dica de livro, A Máquina do Tempo, de H. G. Wells, é uma leitura bem curta e com um estilo de descrição que explora bem o indescritível, te dando muita liberdade para imaginar as coisas impossíveis!

Crédito da imagem de capa à PIRO4D por Pixabay


Como referenciar este conteúdo em formato ABNT (baseado na norma NBR 6023/2018):

SILVA, Marcos Henrique de Paula Dias da. Cubo instantâneo. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS. Zero – Blog de Ciência da Unicamp. Volume 6. Ed. 1. 2º semestre de 2021. Campinas, 01 set. 2021. Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/zero/3464/. Acesso em: <data-de-hoje>.

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