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Rio Renato, município de Itaúba – MT, Brasil. Crédito: leoffreitas

ResearchBlogging.orgDesde a minha época de colégio já tratava-se o tema como algo “ultrapassado”. Se você chamasse a Amazônia de o “pulmão do mundo” era considerado no mínimo muito desinformado. Qualquer professor de biologia de colégio iria trazer a luz para os seus alunos dizendo: “A floresta amazônica respira todo o oxigênio que produz via fotossíntese. Sendo assim ela é neutra”. Bem, o cálculo não é tão simples assim.

Podemos resumir esta questão pensando em uma razão muito utilizada por ecólogos. A razão entre produtividade primária e biomassa em um ecossistema, a famosa razão P/B. Em um estágio inicial da sucessão ecológica a tendência é que um ecossistema apresente uma alta razão P/B, devido a maior quantidade de plantas pioneiras que apresentam uma menor biomassa em relação a sua taxa fotossintética. Já em um estágio mais avançado da sucessão a razão P/B tende a diminuir, pois as plantas tardias passam a dominar com sua grande biomassa não-fotossintetizante. Desta forma, a teoria da neutralidade das florestas maduras parece a mais correta. Florestas maduras são dominadas por plantas tardias, tendo uma baixa razão P/B. Assim a taxa de respiração total do ambiente seria tão alta como a taxa fotossintética, resultando em um consumo interno de todo o oxigênio produzido. Será que a prática corrobora a teoria?

Pelo título do post parece que estou defendendo a analogia do pulmão do mundo. É claro que ela está errada em princípio. Mas a explicação do professor de biologia de colégio e a teoria da razão P/B que citei acima pode estar sendo muito simplista. Hoje sabemos que a maior produção líquida de oxigênio é creditada as microalgas, mas será que as florestas antigas não podem também colaborar com este balanço positivo? A teoria de neutralidade das florestas antigas em relação ao ciclo do carbono recebeu uma forte crítica em Setembro do ano passado no periódico Nature. Vamos tentar entender este ponto de vista.

O artigo copilou mais de 500 trabalhos em florestas antigas e mostrou que a maior parte das florestas entre 15 e 800 anos apresentava uma produtividade primária líquida positiva. Esta taxa refere-se ao balanço entre produtividade primária e respiração. Quando apresenta um número positivo, indica que a produção de oxigênio e, consequentemente, a fixação de carbono, é maior que a taxa de respiração. Além disso os autores ainda criticam a ideia de que florestas novas são as que mais fixam carbono. Segundo eles, as florestas novas são formadas principalmente pela degradação de uma área previamente florestada, resultando em uma maior taxa de decomposição da matéria orgânica do solo e da serrapilheira devido a este impacto.

É claro que não devemos extrapolar os dados desta copilação. Mesmo sendo bastante significativa (519 trabalhos copilados), os dados são referentes apenas a florestas boreais (30%) e florestas de clima temperado (70%). Os dados referentes a florestas tropicais disponíveis para a copilação eram apenas 12 e foram descartados pelos autores devido ao baixo número. A maior média (ou mediana, depende) de temperatura e umidade (dentre outras peculiaridades) das florestas tropicais provavelmente poderiam alterar o resultado publicado. Mas, com certeza, um estudo com um n amostral desta magnitude não pode ser desconsiderado.

Cerca de 30% das áreas de floresta do mundo são consideradas primárias e, sendo assim, antigas. As florestas antigas boreais e de ambientes de clima temperado sozinhas podem ser responsáveis por até 10% da produtividade líquida global. Além do carbono acumulado durante séculos, tanto no solo como em biomassa viva, a importância das florestas antigas como fixadoras de carbono não pode ser negada. Mesmo sendo desconsideradas pelo protocolo de quioto, o artigo da Nature mostra que devemos conservar estas florestas pelo que elas são hoje e não apenas pelo que elas acumularam ao longo do tempo. Desta forma, não subestime quem diz que a amazônia é o pulmão do mundo. Ele pode estar usando uma analogia errada, mas não está tão longe da verdade.

Referência:

Luyssaert, S., Schulze, E., Börner, A., Knohl, A., Hessenmöller, D., Law, B., Ciais, P., & Grace, J. (2008). Old-growth forests as global carbon sinks Nature, 455 (7210), 213-215 DOI: 10.1038/nature07276

Update – 14/02/09 – 10:01

Não deixem de ler o comentário/post feito pelo Saci, do blog do pessoal da ecologia do Inpa. Deixei também um comentário no post dele, continuando a discussão. Muito obrigado pelo complemento de qualidade Saci.