Em um post anterior (Pós-graduação para quê?) contei um relato de minha experiência de vida acadêmica. Questionei a política de produção de pós graduandos do nosso país. Recebi muitos comentários de apoio e somente um não concordando muito.
Na última edição da revista Science, o grande cientista Bruce Alberts (um dos editores de um livro pouco conhecido chamado The Molecular Biology of the cell, uma bíblia para quem trabalha com citologia) expõe alguns dados muito interessantes. Em uma pesquisa feita na Universidade de São Francisco com 1000 estudantes de pós graduação, menos da metade que seguir a carreira acadêmica como a de seus mentores. Isto é, ele não querem viver dentro da academia sua vida inteira.
É para se assustar? Bem, para Bruce Alberts não e, na minha humilde opinião também não. Bruce argumenta ser ótima a presença de cientistas em outras áreas de nossa sociedade (política, educação básica ou mesmo na advocacia). Ele diz que temos que quebrar esse medo que vários segmentos tem em ter contato com cientistas, como se fossem semi-deuses, ou algo parecido. Porém a frase que mais me marcou foi onde ele diz que não devemos ver esses cientistas que partem para outra carreira como “desertores da ciência”.
A partir desse editorial, tentei fazer um paralelo com nossas políticas nacionais relacionadas com a pós-graduação. Realmente, o Brasil anda para trás. Mestres e doutores são números de uma pesquisa de desempenho da educação brasileira para gringo ver. Poucos são os que são absorvidos por outros segmentos para trabalharem com algo relacionado com suas formações.
Além de formar cientistas, nosso governo tinha que ter uma política pública de inserção destes profissionais no mercado de trabalho. Sim, inserção no mercado de trabalho, pois uma pessoa que fez pós-doc, por incrível que pareça, nunca deve ter tido sua carteira de trabalho assinada. É triste.
Além disso, a revista Science quer promover a interação entre grupos de pesquisa semelhantes. Ele mesmo diz que esta ação serve para aumentar a chances de sucesso em suas pesquisa. Sim! É isso! Nossa pesquisa virou competição. Quem publica mais ou quem publica em revistas internacionais ou, ainda, o climax extremo, quem publica na Nature ou na Science. É claro que para um aluno novo isso pode ser a coisa mais maneira do mundo, mas será que vai ter alguma utilidade para quem está te pagando para fazer pesquisa? Será?
Essa discussão é longa e polêmica. Claro que acentuei os aspectos negativos. Nosso país tem que incentivar a pesquisa, temos que ser capazes de gerar tecnologia. Só assim seremos prósperos. Mas o modo como estamos fazendo isso está certo? Só existe esse?
PS: É por isso que não falta emprego para engenheiros, eles criam demandas para o trabalho deles, cientistas da área biólogica e da saúde (principalmente) disputam quem tem o ego maior.
Caro colegas!
A nossa realidade é muito diferente do que pregam que vencem os melhores,mas na verdade sabemos que conseguem chegar ao topo quem tem padrinhos,os outros vivem a margem do sucesso por mais competentes que sejam.O governo não está preocupado colocar em prática a ciência que adquirimos em anos de pesquisa,mas dizer que as universidades estão cheias.Também lamento muito:Sou formada em Geografia e pós graduada em Psicopedagogia e vejo uma sociedade tão carente de meus conhecimentos,enquanto tenho que ganhar a vida realizando outras atividades.Abraços:Maria Lourdes.
Cara Liliane,
este é um assunto que me incomoda também. Os professores universitários são contratados para também dar aulas, e simplesmente não dão, ou dão de uma maneira horrível. Não preparam aulas, não existe planajamento na sua maioria. Claro, não são todos os professores, mas é a maioria. É um descaso com os alunos. Não são pagos só pra fazer pesquisa, mas para darem boas aulas também.
Abraços
Isso é a mais pura verdade, e infelizmente como um mero espectador (estudante de graduação) e futuro participante (espero) tenho visto que grande parte do problema é culpa dos próprios acadêmicos phD’s, que simplesmente se acomodam em suas instituições e visam apenas numeros (publicações, orientações e etc), e dessa forma se isolam cada vez mais da sociedade, e os orgãos de fomento a pesquisa acabam cobrando exatamente o que eles aprenderam a fazer… pra digamos facilitar a vida de todos…
E não adianta tentar aplicar modelos estrangeiro aqui no Brasil,sonho de grande parte dos phD’s que foram pra fora mas ficam dentro de seus laboratótios e não fazem nada, NADA, pra tentar mudar sua propria realidade.
Otimo blog, parabéns!
Breno, sou mestranda em Química e logo que terminei a graduação me deparei com este problema. Definitivamente, o mercado de trabalho não consegue absorver facilmente profissionais graduados e pós-graduados. Isso é muito claro na Química, há muitas vagas para técnicos químicos (eu também sou técnica e valorizo muito esse profissional, conheço suas competências e sei que ele tem seu lugar no mercado) mas para graduados a situação é mais complicada… e para mestres e doutores, a situação é ainda pior. Isso acontece porque o investimento em P&D é muito baixo, portanto, não há muitas vagas para profissinais graduados e pós-graduados. A maioria das empresas prefere contratar mão-de-obra mais barata, como a dos técnicos. Sendo assim, é muito comum que os profissionais das ciências puras (Química, Física, Bilogia, Matemática etc) continuem no meio acadêmico por falta de opção ou entrem no mercado de trabalho atuando em áreas diferentes de sua formação. Infelizmente, vejo muitos estudantes nessa situação, que acabam se tornando profissionais frustrados e infelizes. Muitos se tornam péssimos professores, aqueles que detestam dar aula e só se preocupam com suas pesquisas e em publicar artigos. Neste ponto, entramos em outra discussão: o problema da importância dada à quantidade de artigos que um acadêmico publica. É o que você comentou, até que ponto este parâmetro é válido para medir a competência profissional? Será que esses artigos são realmente relevantes? Ou ainda, será que essas pesquisas são realmente relevantes? Já estou entrando em outra polêmica, a importância/utilidade das pesquisas realizadas… sobre isso já cansei de discutir…
Gostei muito do post mas gostaria de incitar a sua reflexão sobre uma frase sua:
“Nosso país tem que incentivar a pesquisa, temos que ser capazes de gerar tecnologia”
Leonardo Boff neste video (link abaixo) faz uma importante reflexão sobre nossa civilização e fala sobre uma mudança de paradigma. Fala que não adianta esperar soluções científicas produzidas numa visão de paradigma extremamente debil! Não fala com essas palavras mas fala. Sei que Leonardo Boff não deve ser considerado ninguem muito importante para vocês do meio academico mas garanto que na palestra dele a uma reflexão a ser feita sobre esse assunto. Para que entrar num mercado que tem como paradigma a competição e por conseguinte a destruição da nossa casa comum como diz Leonardo boff. Não seria a hora de refletirmos para onde queremos ir? Não seria a hora de nos doarmos para uma verdadeira mudança? Não seria a hora de romper com as instituições que tenham uma paradigma que vai nos levar a destruição? O rio da vida corre e a escolha de cada um de nós é importante para encontrarmos uma certa estabilidade e não o fim.
Fica minha reflexão!
http://video.google.com/videoplay?docid=-2153095444219898991&ei=3abfSfLFEYmQrAKr87TMCQ&q=leonardo+boff&emb=1
Concordo e ressalto a dificuldade de você desenvolver um trabalho de pós-graduação com um tema de maior aplicação ou conexão com a “vida real” (necessidades do mercado, ou dos gestores ambientais). Tenta propor um projeto do tipo para uma banca de seleção de pós-graduação em Ecologia (será que você consegue ser selecionado?). Parece até que a teoria é só para ficar nos livros, como se não pudesse ser aplicada aos problemas cotidianos.
É por essas e outras que eu desisti de fazer doutorado no Brasil…não há oportunidade nem estímulo para alguém desenvolver competências ou ganhar experiência em ciência aplicada fora das engenharias.
(Isso sem nem considerar a inserção no mercado de trabalho em si)
Caro Ronaldo,
Mais uma vez me assusto com as novidades. É uma pena tanto desperdício…. Realmente ser doutor aqui no Brasil não deve ser fácil.rsrs Mais uma vez repito: não havendo políticas de aproveitamento desses pós-granduados, geraremos uma massa de desempregados super qualificados.
Abraços
E aí, Breno? Rapaz, aqui em Anápolis tem o chamado pólo-farmoquímico, isto é, uma série de empresas que fabricam remédios (boa parte genéricos). 1 – Boa parte dos médicos em Anápolis não receitam os remédios fabricados por aqui, pois não confiam neles. 2 – Se você for até estas empresas e perguntar sobre o Laboratório ou Departamento de Desenvolvimento de Fármacos delas, descobrirá que estes simplesmente não existem ou só existem no papel. No mundo ideal estes departamentos deveriam contar com vários doutores para desenvolver os remédios. O apelido das indústrias é algo como “lugar de misturar pózinhos” pois elas só “montam” os remédios, à partir de matéria-prima e receitas já previamente definidas. Mas a indústria brasileira é assim. Aposto que você já ouviu que certas faculdades particulares preferem contratar mestres ou mesmo especialistas no lugar de doutores porque estes “ganham muito”. Se é assim pra uma instituição de ensino, imagine pras indústrias. Se é assim pra indústria farmacêutica, imagine para aquelas empresas de consultoria ambiental…xiiiii.
Breno, já falei outras vezes mas insisto: o Brasil não tem jeito. Esqueça. Você tem que ser honesto, trabalhador, cidadão, porque isto é bom pra você e pro pequeno mundo que te cerca. Quanto ao país e as grandes questões, etc…forget about. Acho que foi uma escritora argentina que disse: se Machado de Assis existe é porque o Brasil é possível. Eu faria o trocadilho: se Machado de Assis é possível, então o Brasil existe. Abr.
A competição existe em todas as áreas. Na ciência não pode ser diferente. A competição estimula, instiga e faz com que as pessoas se dediquem ao trabalho com mais afinco. A corrida por publicar um Nature ou Science, ou em revistas menores não pode ser considerada te todo vazia, mesmo que não supra imdiatamente a sociedade que a financia com uma resolução de algum problema. Não podemos esquecer de que essas revistas tem em seu quadro Editores e revisores que devem aprovar esse artigo, esse pedaço de conhecimento produzido por um grupo. Geralmente, Editores e Revisores são pesquisadores de renome e com responsabilidade científica. Não digo, porém, que não haja trabalhos merecedores do ignóbil. Claro que há! Mas não me parece que a resolução desse problema deva vir de instâncias governamentais, mas sim de dentro dos departamentos dos nossos institutos de pesquisa.
Entretanto, fica a questão: Como não se render aos caprichos da CAPES e continuar a carreira, sem restrições financeiras?
Não podemos esquecer que os nossos laboratórios recebem muitos estudantes de ensino médio e da graduação que utlizam seu tempo alí para desenvolver habilidades específicas, mas tb para desenvolver o senso crítico e muitas vezes um certo dever cívico, pq fazer pesquisa aqui, as vezes, só por amor à pátria!
Com relação ao aproveitamento dos PhDs e postdocs pela sociedade, acredito que a sociedade não saiba o que nós temos para oferecer. Como querer que nos contratem se o público leigo tem uma visão mistificada de nós? Que contratria um cientista maluco ou um fazedor de Franksteins?
Há um trabalho na UFRJ sobre a popularização e desmistificação da ciência uqe deveria ser exemplo em todo o território nacional. O Prof. Leopolde de Meis é um dos únicos que eu vejo fazendo algo efetivo para mudar a nossa situação.
O que nós podemos fazer? Que tal abrir um fórum de idéias?
Adorei o blog de vcs!
Parabéns e contem com os meus comentários sempre!
Adicione os cientistas da computação ao seu post. 🙂
“Mas computação tem muita vaga no mercado”. Tem muita vaga para técnico e graduado. Mestres, doutores e pós-docs estão na mesma que a galera da biologia e da saúde. No Brasil, o mercado rejeita esses profissionais como se não tivessem segundo grau. Lamentável.
[]s