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Muito se fala da linguagem humana como algo extraordinário e sem igual na natureza. Conseguimos passar informações para outros seres humanos através de várias maneiras, como a escrita, fala, gestos, expressões. Fazemos até testes em outros primatas para ver como a nossa impressionante forma de passar informação pode ter evoluído ao longo do tempo. Não só com primatas. Outros mamíferos como os golfinhos e as baleias são considerados exímios comunicadores. Mas será que a passagem de informação se desenvolveu apenas nos grandes mamíferos?

Quem realmente domina o mundo animal em quantidade de espécies são os insetos. Estimativas da riqueza de insetos em todo o mundo variam de 10 a 30 milhões de espécies. Dentro de toda esta diversidade, a complexidade dos insetos sociais é algo realmente intrigante. Não só pela divisão do trabalho, mas também pela forma como os organismos de comunicam. As abelhas (Apis mellifera) apresentam uma forma muito original e complexa de se comunicarem, que vai muito além do contato das antenas e a passagem de compostos químicos.

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Apis mellifera. Crédito: Teone

As abelhas se comunicam através de uma espécie de dança. Imagine que uma abelha saiu para forragear (em busca de alimento) por perto de sua colméia e acha uma flor com bastante néctar. Esta flor não está localizada exatamente em frente da sua colméia e muito menos em uma linha reta. Como ela passará esta informação preciosa para as outras abelhas forrageadoras? Uma boa ideia seria levar todas as outras abelhas na direção da flor (o que deve ter acontecido muito há alguns milhares de anos atrás), mas isso aumentaria o custo energético para completar a tarefa. Uma solução evolutiva foi mostrar para as outras abelhas, através da chamada “linguagem da dança”, onde a flor estaria. Mas será que a complexidade da informação como a localização de uma flor dentro de uma floresta, cheia de obstáculos, poderia ser passada através de uma dança?

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Aprenda o passo-a-passo da dança das abelhas. Fonte: Grünter & Farina, 2009

 

Há 60 anos atrás, Karl Von Frisch realizou vários experimentos com abelhas e fontes artificiais de comida e descobriu que elas podem comunicar a localização de fontes de comina distantes através de comportamento estereotipado. Como outras espécies de insetos, as abelhas utilizam principalmente o sol para se localizar e este é o ponto de partida para a passagem da localização da nova descoberta nesta comunidade. Dependendo do eixo da dança em relação ao favo da colméia, a abelha forrageadora indica a posição da fonte de alumento em relação ao sol. Quando o curso da dança aponta para cima do favo, significa que a flor encontrada está na mesma direção do sol e quando o curso aponta para baixo, significa que a flor se localiza na direção contrária do sol. Além deste código binário, as direções intermediárias também são compreendidas, como 50 graus à esquerda ou à direta. Mas é claro que um fator importante para a localização da nova descoberta é a distância. Esta informação é passada principalmente pela taxa de balanço e pela emissão de ruído. Quanto mais perto está a comida, mais rápida é a dança. Acha este comportamento complexo demais para acreditar? Então acredite, pois as abelhas do hemisfério sul tem exatamente o mesma maneira de passar informação. Mas ao contrário, exatamente como o esperado devido a posição relativa do sol neste hemisfério.

“Galera, uma dança de cada vez senão ninguém se entende!”. Crédito: wildphotons

A dança das abelhas como forma de transmissão de informações é realmente interessante, mas estudos recentes e alguns experimentos feitos na época da descoberta da dança indicam que a importância deste comportamento para o sucesso de forrageamento total das abelhas pode ter sido superestimada. Sabemos que a informação passada pela dança pode ser perfeitamente entendida por outras abelhas, mas muitas vezes as abelhas que assistem a esta performance acabam ignorando a informação passada. Parece que a eficiência das abelhas dançarinas pode ser bem baixa em alguns casos.

Trabalhos experimentais e teóricos mostram que as abelhas precisam de apenas 5 ou 6 sequências de dança para entender a informação passada, mostrando que a linguagem é bem compreendida pelas companheiras. Mas nem sempre. Um estudo experimental mostrou que de um total de 8722 sequências de danças feitas por uma abelha forrageadora, apenas 153 abelhas foram recrutadas. Desta forma, as abelhas podem estar compreendendo mal a dança ou a dança pode estar sendo mal feita. Outros fatores como odor e a própria memória das abelhas construídas em forrageamentos passados podem superar a transmissão de informação pela dança. Problemas metodológicos aparte, a informação é realmente passada através da dança pelas abelhas forrageadoras, sendo compreendida pelas outras abelhas. Claro que devido a complexidade desta interação, a real importância para o sucesso de forrageamento da colméia como um todo e a eficiência de passagem desta informação foram e ainda devem ser muito estudadas.

Referências:

Grüter, C., & Farina, W. (2009). The honeybee waggle dance: can we follow the steps? Trends in Ecology & Evolution, 24 (5), 242-247 DOI: 10.1016/j.tree.2008.12.007
Richard Dawkins (1996). O Rio que saía do Éden. Uma visão darwiniada da vida. Editora Rocco. Rio de Janeiro.