É inegável que a disponibilidade de água potável será motivo para grandes disputas entre nações. Grande parte dos conflitos no oriente médio tem como causa não-tanto-divulgada a disponibilidade de água potável. A produção de alimentos depende primordialmente desta disponibilidade. Israel possui tecnologia avançadíssima no que diz respeito a técnicas de irrigação em ambientes quase desérticos, produzindo grandes colheitas. Porém, a disponibilidade de água não é o único fator limitante para produção de alimentos.
Recentemente, a disponibilidade de fosfato tem tirado o sono de alguns pesquisadores ao redor do mundo. O fosfato (PO43-) é um íon extremamente importante para os seres vivos. Por exemplo, ele é um dos componentes de um nucleotídeo (unidade básica de DNA ou RNA). Além disso, a moeda energética (o composto principal que transporta energia) do nosso corpo, o ATP (adenosina tri-fosfato), possui 3 fosfatos em sua composição. Ao desprender um desses fosfato (se tornando uma adenosina di-fosfato [ADP]) libera energia para que ocorram reações químicas importantíssimas para o metabolismo dos seres vivos.
O ciclo do fósforo é bem simples, tendo sua origem em rochas fosfatadas. Porém é aí que mora o problema. A descoberta de que se adicionando fosfato em nossas lavouras, teríamos maior produtividade (vulgo fertilização), levou a uma corrida desenfreada em busca de fósforo. Quanto mais achássemos, maior seriam nossas colheitas, e assim, mais seres humanos seriam possíveis de existir na Terra. Lembram-se de Malthus? Mas como dito anteriormente, a origem do fosfato são rochas, com isso, classificamos como uma fonte de recursos não-renovável, apesar de ter uma parte biólogica regulando o ciclo. Acredita-se que com o atual crescimento da taxa de demanda de fosfato para agricultura, nossas reservas tem tempo de vida de 100 a 150 anos.
E a partir desses cenários preocupantes? Como ficaremos? É aí que entra Don Mavinic. Don é um engenheiro civil que trabalhava em uma usina de tratamente de água e se deparava com um problema muito comum. Dentro dos canos, ocorria a formação de um precipatdo denso de cor escura. Esse composto é chamado de estruvita e é formado pela ação bacteria de “se alimentar”do esgoto que está sendo tratado. Don, que em um primeiro momento, foi trabalhava para se livrar desse incômodo, constatou que a coisa não era somente lixo. A estruvita é rica em fosfato, só que além disso, é rica também em magnésio e amônia. Ambos também nutrientes essenciais para o crescimento vegetal.
Mas o que fosfato tem em relação a questões ecológicas? Por ser um elemento limitante, e por isso, adicionado em excesso em plantações para aumento da produtividade, a fosfato pode ter destinos bastante danosos para o ambiente. Ao ser lixiviado para ambientes aquáticos, esses fertilizantes estimulam o crescimento desenfreado de produtores primários (algas e plantas aquáticas). Esse fenômeno é chamado de eutrofização artificial. Um exemplo carioca clássico é a lagoa Rodrigo de Freitas, apesar da origem desse excesso de fósforo ser o esgoto domético. A coloração de suas águas lembram uma sopa de ervilha, devido ao gigantesco crescimento algal. Com a formação do espesso filme algal (barreira para penetração mais profunda de luz solar) e posterior morte dessa grande biomassa (consumo de oxigênio pela decomposição), zonas de anoxia (falta de oxigênio) são formadas levando a episódios recorrentes de mortandade de peixes.
Ecologia não se resume somente em estudar animais ou plantas, mas também ciclos biogeoquímicos (parte esta que eu mais gosto e que tenho mestrado). Nem todo biólogo é caçador de borboleta, bem como, nem todo ecólogo trabalha com animais ou plantas!
Referência:
Gilbert, N. (2009). Environment: The disappearing nutrient Nature, 461 (7265), 716-718 DOI: 10.1038/461716a
Caro Breno
É ainda sobre o fósforo,esse elemento vital. Trata-se de
OSSOS
Como é sabido,os ossos foram o primeiro fertilizante fosfórico usado,antecendo o emprego,em meados do século dezanove,do superfosfato,obtido a partir de fosfatos ninerais. È que um dos componentes dos ossos,como se sabe também,é a hidroxiapatite,da família,como o nome sugere,da apatite,precisamente,o composto principal desses fosfatos. A hidroxiapatite é insolúvel,mas em contacto com a água do solo vai-se lentamente dissolvendo por acções várias. Entre elas,avulta a acção do anidrido carbónico do ar,e,sobretudo,da respiração,quer das raízes,quer dos muitos microorganismos,sendo de considerar,também,o efeito de produtos de decomposição da matéria orgânica.
Na perspectiva da exaustão anunciada de fosfatos minerais,é de prever que o recurso a ossos virá a fazer parte das medidas que, imperiosamente,têm de ser tomadas,pois sem fósforo,nada feito.
Terão ainda aqui cabimento estes ossos?
Muito boa saúde,Breno,e muito bom trabalho.
Caro Breno
Mais uma vez,o FÓSFORO bate-lhe à porta.Será abuso,será uma indiscrição,por se ter entrado no "quintal do vizinho"?
Como que a medo,aqui ficam
PRODUÇÕES(2008 e 2009)E RESERVAS DE FOSFATOS MINERAIS(MILHARES DE TONELADAS MÉTRICAS)
Estados Unidos 30.200 27.200 1.100.000
Austrália 2.800 2.500 82.000
Brasil 6.200 6.000 260.000
Canadá 950 900 15.000
China5 50.700 55.000 3.700.00
Egipto 3.000 3.30o 100.000
Israel 3.090 3.000 180.000
Jordânia 6.270 6.000 1.500.000
Marrocos e Sara Ocidental 25.000 24.000 5.700.000
Rússia 10.400 9.000 200.000
Senegal 700 700 80.000
África do Sul 2.290 2.300 1.500.000
Síria 3.220 3.000 100.000
Togo 800 800 60.000
Tunísia 8.000 7.000 100.000
Outros Países 7.440 7.000 950.000
Totais Mundiais (arredondados) 161.000 158.000 16.000.000
Dos números,vê-se que só Marrocos e Sara Ocidental detêm cerca de 35% do total das reservas,enquanto o conjunto destes dois e mais a China,a África do Sul e a Jordânia anda pelos 80%. A Europa depende,quase na totalidade,de importações. A maior parte das reservas,cerca de 80%,é de origem sedimentar,ou seja,marinha,sendo o resto de natureza vulcânica.
In http://minerals.usgs.gov/minerals/pubs/commodity/phosphate_rock/mcs-2010-phosp.pdf
Muito boa saúde,Breno.
Caro Breno
No rasto do seu cada vez mais actual texto,atrevo-me a deixar aqui mais umm meia dúzia de linhas com ele relacionados,na esperança de os não considerar redundantes.
É que,sem fósforo,nada feito,como bem indicou.
NADA FEITO
O fósforo,dada a sua vital importância e a relativa escassez das suas reservas mundiais,irá,nas suas variadas facetas,ocupar,cada vez mais,as atenções de muita gente. Como se sabe,face à crescente necessidade de alimentos,tem sido vultoso o recurso a fosfatos minerais,sobretudo de natureza sedimentar. Foi o caso da Austrália. Não chegando para as encomendas " a prata da casa",recorreu aos fosfatos de uma ilha do Pacífico,a Nauru. Ora,essa fonte secou. É o que irá acontecer,mais tarde,ou mais cedo,a outras fontes,que as exigências não param de aumentar. Assim,há que ir tomando medidas,nas quais se incluem uma melhor eficácia nas aplicações,a colaboração de microorganismos do solo,o aproveitamento de resíduos orgânicos,quaisquer que eles sejam, e a exploração de depósitos fosfóricos dos oceanos,à semelhança do que se tem feito com os combustíveis fósseis. Tudo isto,na certeza de que sem fósforo, nada feito.
Muito boa saúde,Breno.
Temos que acompanhar mais as pesquisas feitas em território brasileiro, principalmente as relacionadas a geologia em um modo geral. O Breno com sua experiência em geoquímica sabe muito bem que o buraco é mais embaixo, e todo leigo sabe que a natureza bem ou mal se transforma o tempo todo. Não sou petista e nem de democracia eu gosto, mas pesquisas estão sendo feitas em cima do fosfato em todo o território brasileiro e tem sido descobertas várias jazidas em boas condições a serem exploradas, inclusive no Rio Grande do Norte, onde estima-se que esteja a maior a céu aberto descoberta até hoje. Nordeste, celeiro de exploração desde que o Brasil conhece pés Europeus. devemos tomar cuidado com os lobos que usam pele de cordeirinho; o atual governo tem investido vigorosamente na pesquisa de recursos não renováveis, o petróleo e o boicombustivel são exemplos bem visíveis. Parabéns pelo blog!!!
Caro Breno
Pela importância do fósforo por ser um vital elemento,como bem frisou não parece demais o que à frente vai.
Como apontou,as reservas vão escasseando,e,assim,enquanto não aparecerem mais,há que ir poupando,entre outras medidas,pedir a ajuda de microorganismos do solo.
Foi nesse sentido que se realizou The First International Meeting on Microbial Phosphate Solubilization em 2002,noticiado em Plant and Soil 287:1-84.
E ,no mesmo sentido,suponho eu,se fez o seguinte trabalho:
Effects of rhizobia ,mycorrhizal fungi and phosphate-solubilizing microorganisms in the rhizosphere of native plants...in Brazil.Matias,S.R.et al. European Journal of Soil Biology 45(3).2009.
Com as minhas cordiais saudações,a continuação de um bom trabalho.
Muito bom dia
Mais uma vez pedindo desculpa pela invasão do vosso espaço,deixo aqui,à vossa consideração, a seguinte meia dúzia de linhas,um tanto aparentadas com a matéria do texto
"Se o único problema....".
A PROPÓSITO DO ANIDRIDO CARBÓNICO E DO OXIGÉNIO
Como se sabe,na combustão,liberta-se anidrido carbónico. Neste passo,consome-se oxigénio.
O oxigénio consumido provem,em boa parte,da fracção que deixou de poder ser usada na respiração,por seres irem perecendo. Desses seres,restam,pelo menos,
hidrocarbonetos, que andam por aí,sob a crosta terrestre.
Vindo esses hidrocarbonetos à luz do dia, para serem combustados,anidrido carbónico será libertado,e menos oxigénio ficará para respirar. O mesmo acontecerá se,em vez de hidrocarbonetos, se tratar,por exemplo,de etanol,venha ele de onde vier,ainda que diferenças existam no montante de anidrido carbónico solto. O mesmo acontecerá se floresta,ou lenha,for queimada.
Muito boa saúde.
.
Desculpe a intromissão,Breno Alves,que peca também por tardia. É que o assunto é desafiante para um agrónomo pela sua perspectiva preocupante.
Como bem apontou,tal como fez o Ítalo,o Fósforo,um nutriente essencial para os seres vivos, está causando muitas dores de cabeça a muita gente,pois as reservas que tem sido mais utilizadas estão-se exaurindo a olhos vistos.
É natural,assim, que seja grande a preocupação. Mas o Fósforo,como qualquer outro nutriente,em particular o Azoto,tem o seu Ciclo. Mais tarde ou mais cedo,ele vai fazer parte de sedimentos afins dos até aqui explorados,depois de terem estado ,mais ou menos sossegados,durante muitos anos,lá nas funduras,a seguir à morte de muitos,muitos seres.
Muito Fósforo deve andar ainda por aí, por essas bacias oceânicas,e não só,que outras formações sedimentares guardá-lo-ão ainda. É uma questão de o procurar,e aqui,os Brasileiros estão bem preparados,como têm mostrado com o Pré-Sal.
Quanto à eutrofização, o Fósforo dos fertlizantes não está isento dessa maldade,mas mais,como sabe,por via do escorrimento superficial,que os solos,exceptuando os muito arenosos,muito dificilente o deixam fugir. Os maus da fita são os esgotos,sobretudo por via dos tetergentes,e também os "feed-lots".
E pronto,mais uma vez as minhas muitas desculpas pela invasão. Muito boa saúde.
Ítalo,
o fósforo é o nutriente mais limitante em ambientes aquáticos tropicais, pelo menos para o bacterioplancton. Mas como essa comunidade é a que possui maior requerimento de N e P, podemos generalizar para o todo. Trabalhava no Laboratório de limnologia da UFRJ, e lá tinha o Vinicius Farjalla e ele tinha bons trabalhos confirmando esse comportamento em lagoas em restinga e uma em ambiente urbano no município de Macaé.
Com certeza, o grande problema é a eutrofização artificial (por isso de origem antrópica), a de origem natural só ocorre em estágios tardios de sucessão em ambiente aquáticos lênticos (quando estes já estão deixando de ser aquáticos...).
Poxa, escreva sobre o artigo também, não concordo com você sobre deixar de escrever só porque escrevi primeiro sobre ele. Ainda mais com sua experiência, outra visão poderia ser dada sobre o mesmo assunto, o que enriqueceria ainda mais a divulgação.
abraços
Breno,
Aí é que está a questão. Por causa da grande fixação do fósforo em solos tropicais, ele é um nutriente muito limitante inclusive nos corpos d'água. Mesmo quando há poluição por excesso de nitrogênio, a eutroficação talvez não seja tão intensa pela limitação em fósforo. Quando por alguma razão o fósforo chega, aí a coisa explode mesmo. O grande vilão na verdade são as atividades humanas que permitem a chegada em quantidades excessivas destes elementos nos corpos d'água. Em termos de agricultura tropical, creio que a contribuição maior é em nitrogênio. Agora em termos de fósforo, em regiões de solos intemperizados, acho que o grande vilão são atividades urbanas e industriais mesmo. Esqueci de comentar, mas também tinha lido a matéria na Nature, aliás muito boa, tinha pensado em escrever um post, mas agora acho que vou só linkar para
Grande abraço.
Caro Ítalo,
nada como a opinião de especialista. Obrigado pela participação. Então o grande vilão deste tipo de eutrofização seria mesmo o nitrogênio oriundo de fertilizantes, pelo menos em ambientes tropicais.
Sobre as outras fontes de fosfato orgânico, englobei todas no esgoto doméstico in natura que chega a esses corpos d´água via ligações clandestinas na rede pluvial. Com isso, dejetos humanos (também riquissímos em fósforo) em conjunto com os detergentes vão em conjunto tipo de fonte.
abraços
Caro Breno,
A questão da utilização de fosfatos e adubos fosfatados derivados pela agricultura em regiões tropicais, como o Brasil, não é tão simples, em termos de poluição ambiental. Primeiro de tudo, o grande problema da utilização de adubos fosfatados de origem mineral em solos intemperizados de regiões tropicais é que uma vez no solo, a mobilidade do fosfato é baixíssima, principalmente porque o íon fosfato se covalentemente a óxidos metálicos típicos destes solos, como gothita e gibbsita. Este fósforo torna-se quase indisponível mesmo para as plantas, daí por que recomenda-se, nestes solos, a adubação o mais próximo possível das raízes das plantas. Como é que este fósforo, então, pode poluir corpos d'água, se ele é tão pouco móvel. Na verdade, em solos de regiões temperadas, onde estes óxidos metálicos não são comuns, a mobilidade do fósforo é maior. Mas o fósforo realmente móvel nos solos é o de origem orgânica. Nos Estados Unidos há problemas de eutroficação de corpos d'água pela lixiviação de fósforo orgânico em áreas em que se usa esterco animal em excesso, principalmente o suíno. Creio que no Sul do Brasil há potencial para ocorrência deste problema. Uma outra importante fonte de fósforo orgânico são detergentes e outros produtos de limpeza.
Ps: também admiro borboletas, mas esse rótulo que nós biólogos ganhamos é muito pejorativo.
Abraços
Caro Maurício,
obrigado pelo comentário, mas não foi o carlos que escreveu esse post. E sim, eu, Breno. O carlos é do Brontossauros.
Sobre suas colocações, concordo que as proporções utlizados pelos nossos agricultores excedem em muito o ótimo necessário para os vegetais. E é esse excesso que é lixiviado para os corpos aquáticos, como disse, o mesmo ocorre com os nitrogenados.
Precisamos que os pesquisadores se aproximem mais dos agricultores para esclarecer essa questão, senão o desperdício continuará, e ainda por cima, degradando os corpos aquáticos.
Abraços
Carlos,
Poucas observações de um biólogo geopedólogo, e que também admira borboletas:
. Há que se considerar, no caso do ciclo do "fósforo", de que as variações empregadas na agricultura apresentam baixa "atividade" e boa parte das quantitades empregadas sofrem um processo de fixação muito maior do que "lixiviação" - dependendo do tipo de solo; com poder residual. O que parece haver é na verdade um desperdício com relação ao uso de fertilizantes fosfatados - Fosfatos naturais (Gafsa é um exemplo), Superfosfatos, etc.
Abraço e parabéns pelas matérias
Bem colocado!
Para quem achava que apenas o petróleo é um problema e que seria substituído por alternativas racionais...
Mas não tem uma problemática maior na utilização da estruvita?
Lembro de um caso no Canadá que utilizavam (de uma forma bastante anticonstitucional e mentirosa) o lodo oriundo do tratamento - porém em nossos esgotos há uma carga alopática gigante, que por si só é preocupante (e aí que ferrou com toda a história - mas é de uns 10 a 15 anos esse caso, ou mais).
Pois, qual a diferença entre o lodo (ou biossólido) e a estruvita (eu sabia que era cálculo infeccioso, agora mais uma acepção!)?
E dá pra ficar só com a cerveja e com a vista???
Fala Carlos!
Muito interessante o que você disse. Moer fósseis... nossa... o que deve ter sido perdido com isso. Ainda bem que as coisas evoluem.
No próprio artigo, o autor diz que do mesmo modo como falamos em países produtores de petróleo hoje em dia, no futuro, falaremos em países produtores de fosfato. Terão importância muito grande, pois o petróleo pode ser substituído, já o fosfato não.
Abraços
Fantástico! Já havia lido que o Marrocos poderia ter uma importância estratégica equivalente ao Oriente Médio por causa de seu fosfato.
On a related note, os ingleses moíam fósseis para usar como fertilizantes no começo do século passado...