Vai uma extensão aí? Crédito: Artic Circle cartoons
A pergunta que intitula este post está novamente na mídia. Quer dizer, não a pergunta em si. A maior parte das pessoas acha que o carro elétrico é a melhor saída para os nossos problemas ambientais ligados ao transporte. Até ontem todos achavam que o etanol era a saída (principalmente o Lula), mas devido aos acontecimentos da última semana parece que estamos trilhando outro caminho. Com o anúncio de um investimento pesado no Brasil, a montadora famosa pelas inovações ligadas a carros elétricos Renault-Nissan parece que também irá procurar este caminho por aqui. Como a Dilma não dorme no ponto, já pediu ao Mercadante um “estudo sobre a viabilidade de incluir automóveis elétricos na matriz de transportes brasileira“. Não sabemos nada sobre o conteúdo deste “estudo”, mas podemos dar alguns pitacos sobre a viabilidade teórica dos carros elétricos no Brasil.
O primeiro ponto que deve ser reforçado é que o discurso de “emissão zero” que os defensores dos carros elétricos querem passar é uma balela. Sempre devemos considerar todo o ciclo de produção de um combustível para termos uma melhor compreensão do seu impacto ambiental. E qual é a fonte da eletricidade utilizada nos carros elétricos? A melhor resposta seria “depende”. Depende principalmente da matriz energética do país onde este carro está sendo utilizado. Um gráfico interessante saiu na coluna do jornalista Celso Ming, no Estadão:
Claro que estes dados são de 2008, mas podemos ter uma boa noção de que ainda dependemos muito de combustíveis fósseis. É daí que vem a energia dos carros elétricos. Quanto mais suja é a matriz energética de um país, mas suja será a eletricidade utilizada por um carro elétrico. “Ah, mas o Brasil possui a matriz energética mais renovável do mundo. Então aqui não temos problemas!” Nem tanto. Sabemos que hoje em dia a maior parte do potencial hidrelétrico do Brasil está na região da Amazônia. Se os carros elétricos se tornarem algo realmente significativo na frota brasileira teremos que discutir ainda mais este problema, pois sem este acréscimo de demanda a situação atual já é complicada. Segundo a coluna do Ming, “(…) Se 30% da atual frota (de 30 milhões de unidades) fosse movida a energia elétrica de fonte hídrica, seriam necessárias nada menos que 13 usinas do tamanho da hidrelétrica de Itaipu para abastecê-la“. Quem gostaria de usar carro elétrico está disposto a aprovar projetos como Belo Monte e outros? Se trocar Belo Monte por eólicas não é possível, como resolver esta questão?
Dentre outros problemas que podemos destacar em relação aos carros elétricos está o seu alto custo, baixa autonomia das baterias e peso do sistema (que também compromete autonomia). Segundo uma reportagem do site Webmotors que testou o Nissan Leaf, a autonomia do carro é de 160 Km e a carga total da bateria demora de 8 a 20 horas (em 220V ou 110V, respectivamente). Ainda existe a opção de uma carga rápida de 30 minutos que pode recuperar até 80% do total. Em uma viagem de carro fazendo o trajeto Rio-São Paulo o consumidor teria que parar o seu carro para abastecer por 2 ou 3 vezes e esperar por pelo menos 30 minutos em cada parada para “encher o tanque”. Sem contar que a autonomia da própria bateria diminui com o tempo, até 80% em 5 anos. Será que isso é viável? Parece que os consumidores não pensam muito nisso. Uma pesquisa mostrou que grande parte dos consumidores gostaria de comprar um carro elétrico, mas pensa basicamente na economia em termos financeiros que isso iria trazer. Eles com certeza não sabem dos problemas técnicos e muito menos pensam na diminuição da poluição.
Falar de poluição é algo importante, já que o lítio (principal componente das baterias utilizadas nos carros elétricos) é altamente poluente e, além disso, apresenta reservas mundias não só limitadas, mas concentradas basicamente em um único país (que não é nada estável politicamente). Novas baterias estão sendo testadas, mas nada concreto por enquanto. Precisamos urgentemente aumentar a autonomia das baterias, utilizar materiais menos tóxicos e com maiores reservas globais. Sem isso o futuro dos carros elétricos é incerto. Os carros híbridos parecem ser um caminho muito mais coerente, pensando apenas nas tecnologias atuais. Mas o preço ainda precisa cair muito para se tornar uma realidade.
Atualmente o uso de carros elétricos é uma iniciativa simplista, que reduz a emissão de gases nas grandes cidades, mas transfere o problema ambiental para onde a energia é gerada. Se for uma matriz energética suja isso é claramente ruim, mas se for uma matriz hidrelétrica como a nossa o problema pode estar nas entrelinhas. Passamos a utilizar o etanol no lugar da gasolina, diminuindo a emissão de CO2 nas grandes cidades e aumentando a devastação causada pela monocultura de cana-de-açúcar, principalmente no Cerrado. Agora queremos trocar o etanol pelas baterias elétricas, diminuindo ainda mais a visibilidade do problema ambiental nas cidades e talvez aumentando o problema longe delas.
Não existe solução mágica para gerar energia. No dia que acordarmos para isso começaremos a investir mais em diminuir nossos impactos e aumentar a eficiência e não em buscar o santo graal energético.
Alex,
Infelizmente eu prefiro trabalhar com dados e provas. Enquanto ainda não tiver dados de um ciclo completo do carro elétrico na mão prefiro não apostar na tecnologia atual. Mas pode aguardar que logo teremos mais estudos sobre isso.
É apenas logica, um carro precisa de gasolina todos os dia de sua vida, enquanto um a bateria apenas quando nasce.
Temos que planejar olhando para o futuro(2015-2020 que esta bem ali),
tudo esta convergindo para uma solução energetica mais barata que a fossil, que vira do sol, ou da quimica, isso tornara toda nossa frota num "elefante branco".
E em relação a sua "lógica" eu acho que ela está um pouco furada pois você continua achando que a única coisa que importa ser comparada é a emissão de CO2 e esquece que o cálculo de ciclo de vida inclui muito mais.
O custo energetico na produção(em minutos) é insignificante, visto que as
atuais tem 10 anos de duração,e a proxima geração tera 20 anos,
Apos esse tempo elas podem ser recauchutadas,e apos decadas de uso, podem ser 99% recicladas como a do Leaf.
Bateria da Toyota para 2015 com 1000km e 20 anos de duração:
http://bit.ly/oQMvBC
Custo energético insignificante? Baseado em qual fonte?
Estamos discutindo situação atual e não previsão. Ainda mais da própria marca...em 1015 então voltamos a conversar sobre isso.
Abraços.
Veja este exemplo la dos EUA, as refinarias usam 15% de toda a energia do estado, e 28% de todo seu gás natural.
Se é necessario um aumento de energia em 15% para substituir toda a frota de carros,então ou a sociedade é extremamente tapada, ou corrupta feito o demônio.
http://bit.ly/twH9Bu
Sem contar a mão de obra intensiva, transporte, atravessadores, e corrupção de toda ordem etc...
Alex,
Esse número de 15% é fictício. Temos que analisar toda a cadeia. E a energia da produção das baterias? E o tempo de vida das baterias? E o descarte? Cada etapa desse tem um gasto energético e consequente emissão de gases. E com certeza é nessa parte que os carros elétricos mais irão gastar energia...
Matéria muito bem escrita e que levantou uma questão super importante, até onde eles são menos poluentes, se levarmos em conta o processo produtivo!!!!
Excelente post, Luiz!
Lembram do filme "De volta para o Futuro"? Aquele em que o Dr. Emmett Lathrop "Doc" Brown abastece seu De Lorean com lixo e sai voando?
E o biogás, não é uma alternativa?
Olá Sibele,
Já fizeram protótipo de carro desde movido a chocolate até mesmo um estilo "De volta para o futuro", como você disse. A maioria é de garagem mesmo, sem uma viabilidade em larga escala. Dá uma olhada aqui:
Engenheiros da Califórnia criam carro movido a lixo
Biogás é sim uma importante fonte alternativa de energia. Mas um carro tipo o do filme ainda não 🙂
Vejam isso, novas baterias com 450km de autonomia.
São pelo menos 89% mais baratas, 29% mais leves,
recarga em 6 minutos, precisam ser substituidas a cada 20 anos
http://www.youtube.com/watch?v=9XC24EG0VJI
Olá Alex,
Já tinha visto este vídeo também. Mas quando vejo este tipo de reportagem sou um pouco cético. Biocombustíveis de microalgas são pesquisados há mais de 3 décadas e estão longe de serem viáveis em larga escala, mesmo sendo muito promissores. Não quero dizer que não devemos investir em pesquisa destas tecnologias. Pesquisa é o caminho para elas serem desenvolvidas. Mas acho que existe um espaço grande entre o que é promessa e o que é viável em larga escala.
Vamos aguardar os desdobramentos desta história.
Abraços.
Luiz, concordo que a energia eólica seja a mais adequada. Porém, no caso de centros urbanos pode ficar um pouco mais complicado. Até podemos utilizar prédios que recebam pás eólicas, mas o problema é de viabilidade natural, pois provavelmente muito poucas cidades possuam potencial eólico.
Quanto ao uso de captadores fotovoltaicos, embora sejam caros, eles se pagam ao longo de uma média de 10 anos ou menos com a economia de energia. Além disso, possuem vida útil de pelo menos 20 anos. Linhas de crédito oferecidas pelo poder público para que moradores instalem esses captadores em suas casas é bastante viável. Evidentemente que esse mesmo poder público - prefeituras em conjunto com BNDES? - receberia o retorno. O munícipe pagaria parcelado no IPTU ou ainda com a própria energia excedente. Esse projeto é bastante viável atualmente, mesmo contando com equipamentos importados e caros. Imagine quando a industria de produtos de captação solar passar a utilizar grafeno e outros materiais melhores.
Olá Rafael,
Quando me referi a eólicas + hidrelétrica estava falando do uso de geradores eólicos perto das centrais hidrelétricas e não em cidades. Acho que este poderia e está se tornando um caminho interessante.
Em relação a energia solar pensando só em tecnologia atual acho que não seria viável em larga escala. Assim como carros elétricos, tentei focar o post apenas em tecnologias atuais. O investimento em novas tecnologias pode e deve ser feito. Mas não podemos focar os nossos recursos atuais implementando algo em larga escala sabendo destes problemas. Acho que vale um post apenas para energia solar.
Eu falei um pouco dos problemas da energia eólica e solar neste comentário do post sobre Belo Monte:
http://scienceblogs.com.br/discutindoecologia/2010/05/sobre_belo_monte_e_hidreletric/comment-page-1/#comment-1193
Mas acho que ainda preciso me embasar mais no assunto antes de escrever apenas sobre isso.
Abraços.
Mesmo que a produçao de energia venha pela queima de carvão(que não é o caso), ainda é 2,4 vezes menos poluente que motores à combustão.
Em relação a frota, se fosse totalmente substituida, seria necessario um aumento de 15% na produção de energia, lembrando que os eletricos irão ser introduzidos aos poucos.
vejam: http://bit.ly/hvfdCe
Alex,
Lembro que o exemplo citado é o americano e que uma análise apenas do CO2 emitido pelos dois combustíveis é rasa. 600 bilhões de kWh por ano por eólica e solar? Bem complicado...
Ainda tem alguns problemas no cálculo dele como perda natural de autonomia da bateria ao longo do tempo, o gasto energético na produção de baterias, dentre outros. Se você olhar os próprios comentários do post citado vai ver que tem gente que fez crítica mais profundas ao cálculo em si. A conta não é tão simples assim.
O mesmo problema acontece quando falamos das fontes "verdes" de energia. O cálculo tem sempre que levar em conta todo o ciclo de produção. Não podemos comparar apenas o consumo do carro. Isso é apenas uma das parcelas do cálculo.
Abraços.
Alex,
Achei alguns links interessantes. Talvez vale a pena até rolar um post futuro.
Electric Vehicles vs Gasoline Vehicles: A Cost and Emissions Comparison
The Dirty Truth about Plug-in Hybrids, Made Interactive
Abraços.
Olá Luiz. Antes, parabéns pelo blog, que me agrada sempre que leio.
A tecnologia do carro elétrico ainda é incipiente, e talvez por hora ela não seja vantajosa. Só depois de um bom investimento em tecnologia nessa área será possível avaliar.
O carro à combustão, por exemplo, era inferior em diversos aspectos se comparado ao carro elétrico. Um século de investimento em tecnologia graças ao baixo custo do petróleo (num primeiro momento), e hoje os dois tipos não são nem comparáveis.
No mais, é isso aí mesmo, se o país tem uma matriz suja (como todos que eu me recordo), não tem muito pra onde correr. A questão é se, para o meio ambiente, mais vale queimar petróleo ou construir usinas. Só uma avaliação de ciclo de vida ou algo equivalente pra dizer.
E por fim, você está correto, o caminho mesmo otimizar e reduzir.
Abraços.
Entendo q, qq solução de transporte é basicamente um problema de como a energia necessária será gerada, armazenada e transportada.
Mas no caso dos carros elétricos...Em vez de carregar em casa, as baterias poderiam ser "destacáveis"..Tipo, ao chegar em um posto, o carro é docado, a bateria removida e trocada por uma outra carregada. Isto diminuiria e muito o tempo de recarga (de 30 min para em torno de 5 min) do automóvel. A bateria destacada poderia ser carregada no próprio posto ou enviada para uma estação de carregamento.
Outra solução seria "baterias molhadas" ou na qual a energia está armazenada quimicamente nos fluidos da bateria. Neste caso, para a carga, bastaria trocar o fluido gasto ou reencher a bateria, o q tb diminuiria o tempo de carga e facilitaria o armazenamento de energia.
Em qq um dos casos, não é resolvido os problemas principais, q é a geração, armazenagem e transporte de energia. Infelizmente, ainda não há uma solução que resolva bem estes três problemas
Luiz, concordo com o uso de carros híbridos para o momento. Quanto à autonomia dos carros elétricos, entendo que eles são mais de uso urbano. Com a capacidade das baterias presentes nesses veículos atualmente, não há como pensar em carros para viagens longas, mas táxis e veículos que não circulam fora dos centros urbanos seriam beneficiados. Porém, para tudo isso dar certo, a energia que servirá para impulsionar tais veículos deve ser gerada no local de uso, ou seja, nos próprios centros urbanos. A melhor saída é usar captadores solares sobre as casas ao invés de telhados. Acho que já está demorando muito pra isso acontecer de verdade. É a melhor saída para muitos problemas ambientais e energéticos. O problema é que existe um custo relativamente alto de implantação e a população dependeria de um incentivo.
Olá Rafael, ótimo comentário.
Acho a produção de energia local uma boa ideia, mas difícil de implementar. Os panéis solares atuais não são somente caros, há também o problema da viabilidade a longo prazo devido a produção dos painéis. Em termos de viabilidade a energia eólica atualmente está a frente da solar, mas depende de muitas variáveis para conseguir gerar energia de forma significativa.
Ainda continuo achando que no caso do Brasil a melhor matriz energética seria hidrelétrica associada a eólica. Claro que a hidrelétrica tem um custo ambiental alto, principalmente pelo potencial estar concentrado na Amazônia. Mas isso deve ser bem pensado e discutido antes de ser implementado.
Concordo com o uso restrito dos carros elétricos, mas não podemos esquecer que a energia usada neles vem de algum lugar. Acho muito fácil esquecermos disso quando chamamos eles de "emissão zero".
Abraços.
Vc chegou a verificar a eficiência de carros híbridos? Os que alternam entre as duas formas, dependendo do modo de conduzir o automóvel. Sei que não é uma solução, mas parece ser um aumento na eficiência energética do veículo.
Olá Brudna, com certeza!
Acho que atualmente os híbridos são os mais viáveis. Só falta começar a cair o preço.
Muito bom o texto Bento. Enquanto caminhava para o lab hoje pela manhã vinha pensando no tema. Algo que me ocorreu foi: será que é tão difícil gerar energia suficiente para abastecer um carro, utilizando para isso o próprio carro? São quatro rodas girando, seria possível algum sistema de transformadores acoplados às quatro rodas gerarem energia elétrica?
Não entendo bulhufas sobre transformadores e geração de energia elétrica, talvez meu questionamento seja muito mais básico do que penso.
Olá Felipe,
Sua ideia é realmente boa. Alguns modelos híbridos já fazem isso, mas com a tecnologia atual ainda não dá para sustentar o consumo completo de um carro. Mas é um caminho muito interessante.
Eu aposto mais em capacitores de alta capacitância para substituir baterias em um futuro dentro de algumas décadas.
[]s,
Roberto Takata
Sem dúvidas Takata. Mas como o etanol de segunda e terceira geração e as microalgas ainda falta muita pesquisa no meio do caminho...