Capítulo 39
Surfando as crises globais: segunda onda da COVID-19 e ondas de calorp.283-286
3 de dezembro de 2020
Jaqueline Nichi
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Revisão: José Felipe Teixeira da Silva Santos
Edição: Ana de Medeiros Arnt
Arte: Carolina Frandsen P. Costa
A pandemia do coronavírus causou 1,3 milhões de mortes no mundo até o momento. A poluição atmosférica mata 7 milhões de pessoas todos os anos. Por que a crise climática não é vista como crise?
Semana epidemiológica #49
Média móvel de novos casos no Brasil, na ocasião de publicação deste texto
761 óbitos registrados no dia (175.393 ao todo)
A COVID-19 escancarou a vulnerabilidade da globalização e tem sido um experimento não programado sobre os impactos das mudanças do clima. Se por um lado, o confinamento afetou a economia e a sanidade mental, por outro, se revelou benéfica para o meio ambiente. Como resultado involuntário, as medidas de contenção da pandemia ajudaram a melhorar a qualidade do ar, com a redução das emissões de CO2, principal gás de efeito estufa (GEE), e dos poluentes tóxicos, especialmente nos centros urbanos.
Segundo a Organização Mundial de Meteorologia [1], o confinamento resultou numa redução de 17% nas emissões de GEE em abril, em comparação com 2019. Entretanto, um estudo da Nature Climate Change reportou que a redução nas emissões globais de GEE e de poluentes por causa da pandemia será “insignificante” para alterar o rumo das mudanças climáticas na Terra, levando a uma redução de apenas 0,005ºC a 0,01ºC na temperatura do planeta.
Esta não é a primeira vez que vivemos um período de redução das emissões de gases poluentes em decorrência de uma diminuição das atividades humanas. Durante a crise financeira de 2008, por exemplo, percebeu-se redução na emissão destes gases. Mas, após esse período, as emissões foram retomadas em níveis ainda maiores em decorrência do esforço econômico de recuperação. Isso só reafirma que as melhorias são efêmeras e pontuais, uma vez que não estão acontecendo transformações sistêmicas, nos processos decisórios, nas estruturas de produção de bens, no modelo de consumo, no uso da terra e na matriz de transportes atuais.
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A questão sanitária é vista como crise porque pressupõe a retomada ao estado “normal” após ser superada. Já a questão climática, não alcança esse status porque cresce de forma gradual.
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Por que a crise climática não tem o mesmo apelo da sanitária?
A questão sanitária é vista como crise porque pressupõe a retomada ao estado “normal” após ser superada. Já a questão climática, não alcança esse status porque cresce de forma gradual. Mesmo assim, esta é uma oportunidade de testemunhar um período propício para reavermos a implementação de políticas públicas e o esforço coletivo a fim de descarbonizar a sociedade e a economia.
Essas mudanças vão depender das políticas de recuperação das atividades no pós-pandemia, mas também de um esforço coletivo para garantir sua implementação para ue essa redução não seja apenas temporária.Além disso, apenas mudanças estruturais na economia e nas matrizes de transporte e energia não serão capazes de sustentar reduções em longo prazo porque são oriundas de respostas individuais. Em vez de atitudes tomadas por imposição, como a suspensão de voos e a limitação do uso de carros, é preciso maior conscientização para atingirmos as metas de emissões de GEE.
Doenças infecciosas são assustadoras porque são imediatas e pessoais, com impacto direto no dia a dia. A mudança climática pode parecer impessoal e distante, com causas difusas. ■
PARA SABER MAIS
- World Metereological Organization. State of the Global Climate (WMO-No. 1264), 2020. Disponível em: https://library.wmo.int/doc_num.php?explnum_id=10618
Outros materiais
- Forster, Piers M., Harriet I. Forster, Mat J. Evans, Matthew J. Gidden, Chris D. Jones, Christoph A. Keller, Robin D. Lamboll et al. Current and future global climate impacts resulting from COVID-19. Nature Climate Change 10, no. 10. 913-919, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.1038/s41558-020-0904-z