A doença da Covid-19 vem nos impondo uma série de desafios cotidianos. Para nós, no sentido individual, já temos percebido que a doença no Brasil não são apenas números que se somam dia a dia. Já são nomes de conhecidos, amigos e familiares que viram estatística, ou não – dependendo da gravidade dos sintomas e se é necessário hospitalização. Nos casos mais severos, acompanhamos apreensivos internações e, muitas vezes e infelizmente, a despedida de longe dessas pessoas – por medidas sanitárias. 

Por outro lado, cientificamente, temos tentado compreender a doença em uma velocidade recorde, sem o tempo comum para revisar estudos e debatê-los com colegas da nossa área.

Período de incubação, o que é isso?

Um dos artigos que nos chegou às mãos recentemente (publicado no dia 10 de março), aponta que “Nosso entendimento atual do período de incubação do COVID-19 é limitado”. Este estudo analisou o contágio e aparecimento de sintomas de 181 pessoas com infecção confirmada para SARS-CoV-2, ou também conhecido como Novo Coronavírus, antes de 24 de fevereiro deste ano, fora da província de Wuhan (China).

O período de incubação é o tempo entre o momento em que alguém se infecta pela doença, até o patógeno iniciar sua replicação (e a pessoa tornar-se infecciosa também). No caso da COVID-19, o período de incubação em média é de 5,1 dias.

Mas este período varia! Segundo a Organização Mundial da Saúde, o período de incubação da Covid-19 ocorre entre 1 e 14 dias. Este estudo, publicado por Lauer e colegas, mostrou que 2,5% das pessoas analisadas apresentaram sintomas em 2,2 dias após a infecção pelo vírus e 97,5% das pessoas apresentam sintomas em 11,5 dias. 

Qual a relevância deste debate para o combate à transmissão da doença?

Em geral, ao apresentar os sintomas da doença, o que temos chamado de estar sintomático, é associado à transmissão do patógeno (neste caso o vírus SARS-CoV-2). Entretanto, as evidências mais recentes de transmissão do novo Coronavírus por pessoas levemente sintomáticas e, até mesmo, assintomáticas, foi possível observar que o período de incubação pode ser menor que o período de incubação estimado nos estudos. E isto tem implicações importantes tanto para a dinâmica de transmissão da doença, quanto para a implementação de estratégias de contenção de seu espalhamento na sociedade.

Se formos compreender que a partir do dia 1 de infecção (isto é: algumas horas após termos sido expostos ao vírus) nós já estamos, potencialmente, transmitindo esta doença até 15 dias após esta exposição, a projeção de isolamento preventivo seria 15 dias, no mínimo. 

Como assim, 15 dias no mínimo?

Sim. Considerando, por exemplo, que eu me infectei hoje, dia 10 de abril, e em 15 dias eu não apresentei qualquer sintoma, tudo indicaria que eu passei do período de incubação e, não serei mais um agente transmissor do vírus a partir do dia 25 de abril (aproximadamente e de acordo com o que temos de dados neste momento).

Todavia, a partir do primeiro sintoma – mesmo que muito leve – este tempo de isolamento precisa se prolongar a contar do primeiro dia de aparecimento do sintoma. Alguns estudos apontam evidências, por exemplo, de carga viral alta e um longo período de eliminação do vírus, em pacientes que apresentam sintomas críticos da Covid-19 por muitos dias após início do tratamento da doença (estes são os pacientes que precisam de internação hospitalar com tratamento em UTIs).

De modo geral, a fase infecciosa se prolonga, para aquelas pessoas que demonstram sintomas, até (no mínimo) 7 dias após o aparecimento do primeiro sintoma e (conjuntamente) 3 dias após cessarem a febre e mais algum sintoma que esteja ocorrendo (coriza, tosse, espirros, falta de ar, dor de cabeça…). O mais prudente, portanto, seria o isolamento total durante esta fase.

Sobre isolamento social e espacial: qual a relevância disto?

Já falamos em algumas postagens anteriores e seguiremos apontando esta medida como a principal ferramenta de estancar a transmissão da doença COVID-19! Os estudos sobre a transmissão e o período de incubação apresentados neste post nos mostram que a transmissibilidade do vírus pode iniciar muito brevemente após a infecção e varia entre as pessoas infectadas.

Estes estudos também apontam que a pessoa infectada segue contagiando outras pessoas por vários dias após os sintomas desaparecerem. Considerando que cerca de 85% das pessoas infectadas apresentam nenhum sintoma, ou sintomas muito leves (muitas vezes não sendo contabilizadas em países que não estão realizando testes em massa), não sabemos quando ou se fomos infectados. Mas neste caso podemos estar espalhando o vírus mesmo assim!

Dessa forma, o isolamento social e espacial é a medida mais segura, uma vez que prevê que tenhamos pouco contato entre pessoas, diminuindo a possibilidade de nos contagiarmos e contagiarmos outras pessoas. Nosso contato com objetos contaminados e não desinfectados, ou com outras pessoas que estejam infectadas – mesmo sem apresentar sintomas e ou adoecimento aparentes – é a maneira mais rápida do espalhamento do vírus. 

Infelizmente, o tempo de isolamento é longo e, sim, têm impactos na nossa vida psicológica, financeira e afetiva. Mas não existe outro modo seguro de minimizar os efeitos da disseminação do Coronavírus na sociedade enquanto não entendermos melhor os outros aspectos desse vírus.

Mais uma vez: fique em casa

Não cansaremos de falar isto: fique em casa se você puder, diminua a sua exposição em espaços públicos, não visite, cumprimente, beije ou abrace pessoas – especialmente aquelas que não estão cumprindo o isolamento social.

Se for possível, em sua casa, tente não compartilhar objetos como pratos e talheres. Se você mora com mais pessoas e precisa sair, tome todas as precauções já indicadas em nossas redes sociais para manter as pessoas de sua casa sem contaminação também. 

Para saber mais:

LAUER, S. A.; GRANTZ, K. H.; BI, Q.; JONES, F. K. et al. The Incubation Period of Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) From Publicly Reported Confirmed Cases: Estimation and Application. Ann Intern Med, Mar 10 2020.

Liu, Yang; Yan, Li-Meng; Wan, Lagen; Xiang, Tian-Xin; Le, Aiping; Liu, Jia-Ming; Peiris, Malik; Poon, Leo; Zhang, Wei. Viral dynamics in mild and severe cases of COVID-19. Publicado em 19 de Março de 2020. DOI:https://doi.org/10.1016/S1473-3099(20)30232-2

Li, Ruiyn; Pei, Sen; Chen, Bin; Song, Yimeng; Zhang, Tao; Yang, Wan; Shaman, Jeffrey.  Substantial undocumented infection facilitates the rapid dissemination of novel coronavirus (SARS-CoV2). Science, 16 Mar 2020, DOI:10.1126/science.abb3221

 

Figura de capa: Por David S. Goodsell, RCSB Protein Data Bank; 

doi: 10.2210/rcsb_pdb/goodsell-gallery-019

Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.

21 respostas

  1. Tive sintomas leves, quase imperceptíveis, depois de 12 dias tive um mal estar severo com febre. No mesmo dia tudo passou, e fiquei apenas com um pigarro que me forçava a tossir voluntariamente, só isso. Depois de 11 tive falta de ar que durou menos de 2 minutos e passou. Como não estava com febre o 136 me indicava ficar em casa, apesar de sentir uma espécie de asma leve em alguns momentos... Fui ao médico e me diagnosticou com pneumonia - que depois desconsideraram e me deram antidepressivo - tomei antibiótico e passei sem qualquer sintoma. Depois de uns 10 dias começaram me aparecer sintomas sistêmicos - depois revelados em exames - que estão se intensificando passados mais de 50 dias da falta de ar... Agora, quando procuro atendimento, dizem que não sou suspeito de coronavirus por não ter febre, nem tosse ou falta de ar... Estou a própria sorte. Tenho 49 anos e minha saúde sempre foi ótima. Se meu caso interessar para alguma análise... Moro em São Paulo.

  2. PS. Desculpe, gostaria de saber se nos casos de sequelas ainda existe a transmissão. Já são mais de 2 meses que não vejo meus familiares. Obrigado.

    1. Oi Ricardo,
      sequelas, teoricamente, não teriam risco de transmissão do vírus. No entanto, não existe confirmação e diagnóstico preciso de que foste infectado... Neste sentido, o isolamento ainda vale como regra.

      Além disso, temos que lembrar que não somos apenas agentes transmissores do vírus... Mas podemos estar com roupas e sapatos contaminados, por exemplo. Assim, a visita ainda é arriscada, mesmo nós estando imunes por já termos adquirido a doença.

      Sabemos que o distanciamento de familiares não é fácil, mas ainda assim é a única maneira de diminuir as chances de contágio...

      Obrigada pelo comentário, verei se consigo mais complementações sobre teu comentário anterior.

  3. Excelente artigo!
    Muito esclarecedor.
    Tenho amigos que tiveram sintomas leves do Covid mas não fizeram o teste.
    Agora estão em isolamento faz um tempo. Acho que já faz mais de 14 dias mas, para garantir, não tem se encontrado com pessoas de idade ou pessoas que estão em grupo de risco.
    Vou indicar este site para eles para esclarecer as dúvidas que temos.

  4. Olá!

    Aqui em Campinas estão considerando todos dos casa, se um pegar, como paciente de Covid também.
    Está correto? Se a pessoa começa a transmitir o vírus logo após entrar em contato com algum doente, então faz todo sentido... Mas se não, fica complicado.

    1. Olá, Debora,

      O recomendado é ficarmos cerca de 15 dias em distanciamento social após os sintomas passarem. De qualquer modo, ter sido diagnosticada não é passaporte imunológico após estares curada da doença. Ainda estão sendo estudados os processos de imunização da doença para conseguirmos nos assegurar de que não existe risco de reinfecção em médio e longo prazo. A regra do distanciamento social aliado ao uso da máscara e da higienização correta, após estares curada, segue sendo a regra sempre que possível.

      Espero que fiques bem, um abraço

      Ana Arnt

  5. Boa noite, meu exame de sorologia deu positivo para covid-19 no dia 25/07/20 com IgM 1,4 e IgG 0,1. Segundo informação, esse exame só apresenta como reagente para Covid-19 apartir do 10º dia de infectado, de forma que eu nem sabia que estava infectado, .tive uma dor de cabeça fraquissima dia 23/07 e mais nenhum sintoma. Minha pergunta, se o exame só apresenta positividade com 10 dias eu terei que ficar apenas mais 5 de quarentena ??

  6. Tive contato direto com uma pessoa que ainda não havia apresentado sintomas e esses vieram a se manifestar 3 dias depois. Hoje já se passaram 12 dias após esse contato. Ainda corro risco de desenvolver?

    1. Oi Aparecida,

      o ideal é se cuidar e isolar por 15 dias após a exposição. Pode ser que a pessoa também não estivesse contaminada ainda. No entanto, por segurança das pessoas que têm contato contigo de forma direta e mais constante, cuidar nos próximos dias.

      Um abraço

  7. Meu filho trabalha em outra cidade,chegou na minha casa na quarta passada,já resfriado,quinta feira febre alta de 39 ,5 graus,fez o teste na sexta a noite ,positivo,eu fiz o teste na segunda feira ,positivo, começo a contar os dias a partir da quarta feira quando estive com ele?Ele mora comigo.

      1. Olá, Sou Alexsandra de Fortaleza. Também concordo que este blog é bastante esclarecedor. Eu estive em uma reunião em que a pessoa afirmou que esteve em isolamento por 15 dias, por ter sido diagnosticada com covid e ainda estava com dor de cabeça. O período de isolamento é somente 15? No caso de persistindo algum sintoma o período de transmissão é até estes cessarem?

  8. Olá Ana,
    Depois de ler essa matéria, fiquei mais em dúvida sobre o período de transmissão e isolamento...
    Recebi do hospital onde fui diagnosticado, que deveria permanecer 14 dias em isolamento, contados do PRIMEIRO SINTOMA. Agora, pelo que entendi, fala-se 10 dias DO ÚLTIMO SINTOMA.
    O que seguir e porque informações contraditórias ?

    1. Olá, Marcelo

      O tempo que tem sido mais indicado é 10 dias após o último sintoma, em função de os sintomas estarem relacionados à permanência da infecção no corpo e, portanto, permanência do vírus. Quando nosso corpo "elimina" os sintomas, ele ainda não eliminou todos os vírus do nosso organismo ainda, isso leva alguns dias. Neste sentido, a indicação tem sido de 10 dias após o último sintoma, para garantir que nosso corpo já combateu a infecção e não possui mais o coronavírus.

      A indicação de 14 dias em isolamento sempre foi (e permanece válido) para possíveis riscos de contaminação, quando não sabemos se fomos ou não contaminados. Assim, se precisamos realizar visitas a pessoas de risco, tem sido indicado que façamos isolamento RESTRITO (isso inclui supermercados e outros contatos com pessoas que saiam de casa e circulem em espaços públicos) a fim de garantir que não estejamos contaminados.

      Ao saber que estás contaminado, no entanto, a indicação é sempre contar o isolamento estendendo-o 10 dias APÓS sumirem os sintomas. Não há contradição nesta prescrição.

      Qualquer dúvida, estamos à disposição.

      Atenciosamente,

  9. Minha dúvida e tive os primeiros sintomas no dia 14 (tosse) 15 ( febre) até uns 3 ou 4 dias no dia 20fiz o teste do cotonete deu positivo !! DEIXEI PASSAR MAIS uma semana fiz de novo o teste ( sorologico ) deu um pouco de reagente , marquei de novo pra próxima segunda dia 5 um novo teste minha dúvida é se pode dar dando ativo mesmo ter passado os 15 dias queria uma orientação pois não quero contaminar ninguém!!! Em resumo entrei em isolamento próprio apartir dos primeiros sintomas 14/3./15/3, 16/3 fiz o teste no dia 22/3cotonete é voltei a fazer o teste já sorologico no dia 29/3 E marquei para dia 5/4 na próxima segunda um novo teste mas fico preocupado se ainda estiver dando reagente ou se continuo no sorologico ou volto pro cotonete!!! Desde já agradeço

    1. Boa tarde, Marcelo

      Ficamos tranquilos em saber que tiveste sintomas leves apenas. Espero que sigas assim.
      Quanto a tua pergunta, o teste sorológico não é necessário - só fará tu circulares e ele não indica a presença do vírus, mas dos anticorpos produzidos para reagir. O ideal é ficares isolado até 15 dias após sumirem os sintomas
      Se fores repetir o teste para garantir que estás sem vírus, seria o PCR (de cotonete), depois deste tempo de isolamento.

      É importante que, se precisares sair de casa neste tempo (e mesmo dentro de casa, se moras com outras pessoas) permaneceres de máscara PFF2.

  10. Minha filha foi a um Karaokê dia 11/12/21 - sábado(absurdo kk), algumas pessoas em 13 de dez(segunda-feira) tiveram sintomas e fizeram o teste e deu positivo e outras negativo. Minha filha fez o teste dia 14 dez(terça-feira) deu negativo. Foi a um aniversario local aberto dia 18dez21 sábado e dia 20dez apresentou alguns sintomas de nariz entupido, cansaço e dia 21de(terça amanheceu ruim e febril de 37,2. No dia 22dez(quarta-feira) fez o teste deu positivo. Ficou com sintomas bens leves, tosse leve, cansaço leve. Eu e meu marido fizemos o teste e deu negativo. Que data considero de liberação dela? para não mais transmitir? Como tenho uma netinha recém nascida e minha filha amamenta gostaríamos de ter saber para não prejudicar. Andávamos de máscara em casa e ela isolada no quarto.

    1. Oi Eliane,

      desculpe a demora da resposta para você. O mais seguro seria cerca de 10 dias após os sintomas de febre e tosse desaparecerem. Ela usar máscara PFF2, inclusive (e principalmente) quando estiver com a criança é fundamental. Vocês também para evitarem a contaminação.
      Até o momento a amamentação não tem evidência de ser uma via de infecção.

      Se vocês tiveram contato com ela enquanto ainda não tinha sintomas, seria muito bom também usarem máscara perto da bebê.

      Ana Arnt
      (autora do post e coordenadora do Especial COVID-19)

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