Escolha uma Página
Acho patético a capacidade das grandes empresas de utilizarem desastres como o vazamento de óleo no Golfo do México para enfiar goela abaixo da população “alternativas”, “mudanças”, “esperanças” e todas as palavras positivas que vocês possam imaginar para “salvar o planeta”. Isso pode ser visto no vídeo publicitário acima produzido pela Associação Nacional de produtores de milho dos EUA e vinculado na TV norte-americana na semana passada.

O problema do vídeo é que ele está basicamente errado, pelo menos pensando na questão ambiental. Entendo que os EUA têm uma dependência muito grande da importação de petróleo e que o aumento da produção de milho iria gerar mais empregos mas as vantagens se restringem apenas a este tema. O aumento da produção de milho “protege o meio ambiente”? “Renovável, abundante e seguro” ? Uma comparação muito interessante foi feita no ótimo artigo publicado pela revista americana Mother Jones:

“A mudança do petróleo para o etanol para salvar o Golfo seria como mudar de cheeseburguer à cocaína para salvar o seu coração.”

Simples e direto ao ponto. O grande uso de fertilizantes utilizados na produção de milho nos EUA é o principal causador da grande Zona Morta do Golfo do México. Zonas mortas são regiões com baixíssimas concentrações de oxigênio, causadas por grandes florações de microalgas que são estimuladas pelo excesso de nutrientes. Este processo forma verdadeiros desertos aquáticos, onde a vida aeróbica é bem prejudicada. Neste verão a Zona Morta do Golfo do México se estendeu por mais de 22 mil quilômetros quadrados. Algo no mínimo relevante. Além de ter um efeito direto na biodiversidade marinha, o aumento de zonas hipóxicas pode também aumentar as emissões de dióxido nitroso, um gás com potencial estufa 300 vezes maior do que o dióxido de carbono. A influência das Zonas mortas na emissão de dióxido nitroso foi discutida em um artigo do periódico Science publicado este ano. Discuti um pouco mais a importância do dióxido nitroso em um post bem antigo.

Como já ressaltei em outros posts (aqui, aqui e aqui) uma transição para fontes de energia mais limpas deve ser gradual. Atualmente os biocombustíveis não podem e não devem substituir completamente outras fontes de energia. Claro que o etanol de cana-de-açúcar brasileiro está muito a frente do etanol de milho norte-americano, mas isto não significa que expandir monocultura é algo “Renovável, abundante e seguro”. Fico muito preocupado quando em um período onde deveríamos investir em um aumento da consciência da população sobre o seu impacto ambiental, tanto individual como populacional, empresas e associações ligadas a fontes de energia ditas “limpas” tentem passar para o grande público uma ideia errada sobre o impacto potencial da “energia verde”.

Esse é um momento de transição. Devemos utiliza-lo para aumentar a crítica da população mundial sobre os rumos da sociedade. Não o desperdicemos com a troca de um cheeseburguer por cocaína, ainda mais quando a população não sabe as consequências reais da cocaína.

Via Mother Jones