Romantismo de Farmácia

Eu amo-te, Mary, e tu amaste-me.
Nossa mútua chama é como a afinidade
Que existe entre dois simples corpos:
Eu sou Potássio e tu, Oxigênio.
Essa é a pequena jura que o sagrado matrimônio
Brevemente fará de nós um. Tal unidade,
é, afinal, tudo menos metafísica.
Oh, eu diria, minha Mary, que eu sou um ácido,
Um ácido vívido; tu, um álcali
Dotado de sentido humano que, quando reunidos,
Nós dois coalesceríamos em um sal,
Um homogêneo cristal. Oh, fosse tu
Carbono eu seria Hidrogênio
Nós nos uniríamos para formar um gás odorífero,
Ou carvão comum, ou nafta — pelos céus
Que eu fosse o Fósforo e tu fosses a Cal!
E nós de Cal formássemos um Fosfato.
Eu ficaria contente em ser Ácido Sulfúrico
Contanto que tu fosses a Soda. Nesse caso
Poderíamos ser Sal de Glauber. Fosse tu Magnésia
Nós formaríamos então o sal com o nome de Epsom.
Poderia tu Potassa ser; eu, Aqua-fortis seria:
Nossa feliz união seria composta de
Azotato de Potassa — ou seja, Salitre.
E assim, com nossas distintas naturezas, docemente misturadas,
Viveríamos e amaríamos juntos, até que a morte
Venha decompor o tertium quid carnal
Liberando nossas almas para a eternidade
Amalgamadas. Amada, teu nome é Briggs
E o meu é Johnson. Portanto não deveríamos
Concordar em formar um Johnsonato de Briggs?

— “Um farmacêutico de Rochester”, citado em The Medical Age de 11 de Outubro de 1886

Eu me pergunto se um composto tão romântico foi sintetizado. Ou será que houve uma separação reativa?

Vocabulário:

O Sal de Glauber é Sulfato de Sódio Deca-hidratado (Na2SO4·10H2O).

O Sal de Epsom é Sulfato de Magnésio Hidratado (MgSO4·7H2O).

Aqua fortis é como os alquimistas chamavam o Ácido Nítrico (HNO3).

Azotato (derivado de Azoto) é forma antiga de Nitrato (derivado de Nitrogênio). Em Portugal ainda se usa o termo Azoto para se referir ao Nitrogênio.

Potassa é a denominação arcaica do Potássio. (Todas as substâncias citadas eram vendidas em farmácias antigamente.)

Tertium quid é expressão latina que significa “terceira coisa” ou “terceira parte” e foi muito usada no período alquímico para se referir a uma terceira substância desconhecida em um meio com duas já identificadas.

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