Balões de átomos e agulhas de matéria-escura

Procurar uma partícula de matéria-escura tem sido como buscar uma agulha num palheiro escuro para os físicos. Podemos ignorar a palha de matéria comum, mas como encontrar a agulha? Dois cientistas propõem usar átomos como balões para fazer um estouro.

Detectar sombras num quarto escuro como o universo não é fácil. Nós só sabemos que a matéria-escura e a energia-escura existem porque interagem fracamente com a gravidade dos aglomerados de galáxias. Guardadas as devidas proporções, é como perceber que há uma sombra na escuridão por meio de um ruído muito, muito baixo e muito distante. Como o barulho de uma agulha caindo num quarto totalmente escuro.

Então porque não amplificar esse ruído até que ele se torne audível e reconhecível? Seria simples, se nós soubéssemos como fazer isso com ondas gravitacionais. Para contornar essa limitação, Benjamin Varcoe (professor de física e astronomia da Universidade de Leeds) e Diego A. Quiñones (pós-doutorando em Informação Quântica da Universidade de Leeds) propõem uma abordagem mais viável: amplificar não o som, mas os microfones que o captam.

Embora nem tudo o que existe seja feito de átomos, tudo o que podemos manipular e mensurar é de origem atômica. Avançamos tanto na manipulação da matéria comum que hoje em dia é possível prender e manejar um único átomo com grande precisão. Essa tecnologia de construção átomo-por-átomo já nos deu coisas como lasers e relógios atômicos — além de algumas esculturas engraçadinhas, como essa:

A boy and his atom, IBM, 2013. Monóxido de carbono sob microscópio de tunelamento.
A boy and his atom, IBM, 2013. Monóxido de carbono sob microscópio de tunelamento.

Brincadeiras à parte, estudar e controlar átomos individualmente continua sendo difícil e problemático, pois essas partículas são extremamente sensíveis a qualquer perturbação externa. Não há perturbação mais externa que um pouco de matéria-escura. Que tal, então, usar átomos como sensores de matéria-escura?

Usar choques entre partículas conhecidas para procurar partículas desconhecidas não é novidade nenhuma na física. O que pode parecer uma ideia idiota é botar átomos para interagir com matéria-escura sabendo que essas duas coisas não interagem quase nada. Segundo o artigo que publicaram em 9 de dezembro passado na revista Atoms, os átomos que Varcoe e Quiñones querem usar não são comuns.

Inflação atômica

Orbital eletrônico de um átomo de Rydberg (n = 12). As cores representam fases quânticas de elétrons altamente excitados. [Imagem: Wikipedia]

Como o ruído da matéria-escura que nos cerca é fraquíssimo, os dois cientistas pensaram em amplificar os átomos que serviriam de microfone para captar esse ruído. Para os físicos de Leeds, os chamados átomos de Rydberg seriam um bom microfone amplificado. Num átomo de Rydberg, as distâncias entre o núcleo e seus elétrons são maiores, o que significa que os elétrons têm maior energia potencial. É como tirar uma bola da prateleira mais baixa e levá-la à mais alta, para que ela caia com o máximo de velocidade.

Para inflar os átomos e deixá-los no ponto — ou melhor, no estado de Rydberg —, é necessário prendê-los e iluminá-los com um laser de grande precisão e de frequência específica. O resultado é um átomo inchado feito um balão, com até 4000 vezes o tamanho original.

Os cientistas estimam que, inflados dessa forma, os átomos seriam maiores ou mais pesados que as partículas de matéria-escura. Lembra-se da agulha fazendo um ruído num quarto escuro? Não podemos iluminá-la diretamente, mas podemos jogar uns balões pelo quarto. Aquele átomo inflado que cair sobre a agulha de matéria-escura iria estourar de maneira bem audível.

Situado a quase 1500 metros de profundidade, dentro de 260 metros cúbicos de água, está o Large Underground Xenon, outro dispositivo para detectar matéria-escura. [Imagem: Wikipedia]

Existem vários experimentos que tentam detectar algum tipo de partícula escura. Para alguns físicos, essa partícula desconhecida seria maior ou mais pesada que um átomo comum. Para outros, seria algo menor e de massa muito pequena — como um áxion, por exemplo. Varcoe e Quiñones afirmam que o modelo de detecção atômica que propõem funcionaria em quase todos os tipos de partículas-candidatas, mas apostam em algo parecido com o áxion.

Embora ainda exija muito cuidado e sofisticação, um detector atômico de matéria-escura seria algo mais simples de ser feito pelo simples fato de que não seria necessário construir imensas instalações subterrâneas como as usadas em outros experimentos. Os átomos de Rydberg, segundo Varcoe e Quiñones, seriam menos suscetíveis aos raios cósmicos e suas interferências.

Referência

rb2_large_gray25Quiñones, D.A.; Varcoe, B. Decoherence in Excited Atoms by Low-Energy Scattering [Decoerência em átomos excitados por espalhamento de baixa energia]. Atoms, 2016, 4, 28. doi:10.3390/atoms4040028

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