Beatbox no laboratório

Qual o segredo de quem consegue fazer batidas usando apenas o aparelho vocal? Para descobrir, cientistas colocaram beatboxers sob exame em tempo real.

Flauta, tambor ou maracas? É difícil saber qual é o instrumento musical mais antigo que inventamos mas nossas cordas vocais sempre estiveram com a gente. Embora o beatboxing pareça uma prática moderna, o ato de fazer sons percussivos — e muitas vezes guturais — talvez seja até mais antigo do que a própria fala. O que (talvez) seja recente é o fato de beatboxers usarem essas vocalizações batidas para performar junto a um grupo ou individualmente. Alguns conseguem até cantar e fazer uma batida simultaneamente.

Beatboxers podem aprender algo diferente do que estão falando ao se preparar para fazer um som”, explica Timothy Greer, doutorando da Universidade do Sul da Califórnia (EUA). Para estudar o mecanismo físico que resulta numa batida perfeita, Greer e seus colegas levaram beatboxers para o laboratório, submetendo-os a exames de ressonância magnética (RM) em tempo real.

Alguns estudos têm indicado que os sons feitos pelos beatboxers são os mesmos existentes nas línguas que eles falam. O problema é que essas pesquisas antecedentes são apenas estudos de caso com amostras muito limitadas: poucos beatboxers são consultados de maneira um tanto subjetiva. Para contornar isso, Greer e seus colaboradores gravaram os exames de RM feitos com uma amostra formada por vários beatboxers de diversas idades, gêneros e línguas maternas. “Usar a RM em tempo real nos permite investigar a diferença na produção de música e linguagem e observar como a mente alterna entre essas diferentes modalidades.”, diz o cientista.

howbeatboxer

Apresentados em artigo publicado no The Journal of the Acoustic Society of America em outubro, os resultados dos beatboxers escaneados por Greer et. al. revelam uma complexidade acima do esperado. Segundo o pesquisador, “os beatboxers podem criar sons que não se observam em qualquer linguagem. Eles têm uma habilidade acrobática para reunir todos esses sons diferentes.”

Embora possa parecer um tanto óbvio, chegar a esse resultado não foi fácil. Inicialmente, o linguista Reed Blaylock registrou cada parte do sistema vocal envolvida na produção dos sons das diferentes batidas. Esse registro foi feito com base nas gravações em vídeo dos exames de RM, mas anotar cada movimento mostrou-se tão complicado que os pesquisadores precisaram recorrer à ajuda do computador. Com base nesse registro inicial, foi criado um algoritmo para rastrear as imagens registradas e identificar cada parte móvel da garganta de um beatboxer.

Além de esclarecer as diferenças e semelhanças entre uma batida vocal e a fala, estudos como esse podem abrir caminho para explicar como passamos a falar. Se as batidas como a do beatbox realmente surgiram antes da fala, estudá-las seria como observar uma semente de proto-linguagem. E, como mostram os resultados, a pré-história da fala pode ser mais complexa do que parece. De quebra, a descrição do processo de beatboxing feita por Greer sua equipe pode ajudar até os beatboxers a ensinar ou aperfeiçoar suas técnicas.

Para quem se interessar em ler mais sobre a pesquisa de Greer e seus colegas, eles fizeram uma página onde é possível aprender o vocabulário do beatbox (com exemplos em vídeos de RM) e comparar diferentes batidas com gravações paralelas. Apesar de não terem som, os vídeos de ressonância magnética podem ser instrutivos ao demonstrar como é feito cada movimento — se quiser ouvir o som, você pode tentar fazer sozinho.

Referência

rb2_large_gray25GREER et. al. How beatboxers produce percussion sounds: A real-time magnetic resonance imaging investigation [Como beatboxers produzem sons percussivos: uma investigação por imageamento com ressonância magnética em tempo real]The Journal of the Acoustical Society of America 144, 1827 (2018); https://doi.org/10.1121/1.5068052

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