Conhecendo Carreiras de Exatas: a Física

Albert Einstein e Marie Curie, entre tantos outros cientistas famosos, tinham uma paixão em comum: a Física

Tempo de leitura: 5 min

Junto à Medicina, a Física é uma das áreas que mais acumula prêmios Nobel [1] e que concentra nomes famosos que aprendemos na escola: desde Arquimedes até Galileo Galilei, Isaac Newton, Albert Einstein, Marie Curie, Stephen Hawking e tantos outros [2]. Dentre as formações acadêmicas destes cientistas, a Física é a principal ou uma das principais.

Apesar dessa lista de pessoas notórias conter poucos nomes de mulheres, as quais enfrentaram muitos desafios para poder exercer a profissão que queriam, o número de meninas e mulheres interessadas por essa área cresce e elas continuam a batalhar por seu espaço e conquistá-lo a cada dia.

Como é o curso de Física

A graduação em Física pretende formar uma profissional que consiga explicar os fenômenos da natureza, como a eletricidade, acústica, óptica, por meio da matemática [3]. Ou seja, é um curso que dará conhecimentos para que seja possível testar na prática as teorias que estudam a matéria, a energia e suas relações e interações no universo [4]. 

A duração é de 04 (quatro) anos e a grade curricular básica envolve quatro principais assuntos:

Física Geral: teoria fundamental e práticas de laboratório

Matemática: cálculo, probabilidade, estatística e computação

Física Clássica: mecânica, eletromagnetismo e termodinâmica

Física Moderna e Contemporânea: mecânica quântica, física estatística, relatividade

A formação pode ser por meio de bacharelado que permitirá a atuação em pesquisa e nas empresas ou mediante licenciatura, no caso da atuação como professora nas escolas. 

O currículo das disciplinas é variado e a professora e pesquisadora Marcia Cristina Bernardes Barbosa, atualmente atuando na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, conta como optou por esta área: “Eu atuava no lab da escola pública e fiquei encantada ao montar um experimento de efeito fotoelétrico. Foi incrível. Eu tinha um professor que fazia doutorado na UFRGS e me ajudava na montagem. Nos finais de semana lançamos foguetes“. Além de sua admiração pela Física e combate a discriminação de gênero na ciência, ela fala o que achou mais chato e mais divertido nas disciplinas durante seus estudos:

“OSPB, Organização Social e Política Brasileira, lavagem cerebral da ditadura brasileira foi a mais chata. Termodinâmica foi a mais interessante. Entender o equilíbrio térmico, o desequilíbrio que leva a tantos fenômenos de temperatura, pressão, máquinas térmicas e o maravilhoso conceito de entropia. Foi algo encantador, a mistura do prático de explicar o dia a dia com conceitos profundos como a superfície de energia.”

Leia a entrevista completa aqui:

Áreas de atuação

Ao pesquisar o significado da física no dicionário, tem-se que é a “ciência que investiga as leis do universo no que diz respeito à matéria e à energia” [5]. Nessa definição já é possível depreender a abrangência dessa área que não está limitada aos átomos, tampouco a Albert Einstein com sua teoria da relatividade. Aliás, é na física que a primeira mulher ganhou o Prêmio Nobel e foi a primeira pessoa a ganhar duas premiações: Marie Curie, que demonstrou a existência da radioatividade natural [6].

O manuseio com segurança da radioatividade é um exemplo de uma das áreas de atuação de quem tem formação em Física, eis que o monitoramento e o funcionamento do uso da radiação, de forma adequada, são exigidos pelo Ministério da Saúde, como nas clínicas médicas que realizam os exames de raio-x [7] e também na energia nuclear que é uma questão de defesa nacional. 

Nesse sentido, o que se quer demonstrar é que a graduação em Física permite uma diversidade de atuação, não ficando restrita ao ensino e sendo plenamente capaz às meninas. 

Porém a decisão de seguir uma carreira é sempre um desafio e Rafaelle Souza, formada na Universidade Estadual da Paraíba e atualmente professora, além de moderadora da página do Instagram @fisica_contextualizada, conta um pouco de como foi a sua escolha:

“Já sonhei em ser médica, já quis ser dentista, já passei em provas de vestibulares para administração, engenharia elétrica e matemática, este último até comecei a cursar, mas tranquei. Já quis ser policial, passei em concurso público para guarda municipal de João Pessoa-PB e até passei na tão temida prova de TAF (Teste de Aptidão Física) – essa parte foi incrível porque para conseguir tive que deixar de ser sedentária (rsrs). Já quis ser empresária por influência dos meus pais que são comerciantes, mas acho que não seria tão paciente. E no meio de tantas coisas e opções, escolhi cursar Física e ser professora.

A Física, em minha opinião, é uma matéria encantadora e muito desafiadora; é uma das ciências mais antigas originada na antiguidade grega (só que essa é outra história). Ela abrange uma vasta área de estudo, desde a estrutura elementar da matéria até a evolução de todo o Universo. Os princípios físicos explicam uma grande quantidade de fenômenos do cotidiano, permitem compreender o funcionamento de máquinas e aparelhos que estão sempre presentes no dia-a-dia. E tudo isso me encantava.”

Leia a entrevista completa aqui:

A Física, portanto, permitirá uma atuação acadêmica em pesquisa no trabalho em laboratórios para a produção de tecnologia ou na docência para aquelas que se identificam com a carreira de professora. Além disso, haverá uma atuação empresarial no setor produtivo, como telecomunicações, iluminação e energia, defesa nacional, controle ambiental [8]. A área ambiental é promissora para a carreira de física, em razão da busca pela sustentabilidade. A física ambiental auxiliará na compreensão das características e das propriedades físicas da atmosfera e do solo para o estudo das mudanças climáticas [9]. 

Ilustração colorida sobre física | Vetor Premium

Assim, a Física é uma área que envolve atuação na pesquisa e na indústria, pois está relacionada com a produção de tecnologia, além de constituir uma das matérias da educação básica. Enfim, seja na área acadêmica seja na área empresarial, há diversas opções para a escolha dessa carreira. 

Além da atuação como pesquisadora, há diversas oportunidades, como explica a Drª Mônica Nunes (@mosnunes), formada na Universidade Estadual de Campinas e atualmente pós-doutoranda na Syracuse University (New York, U.S.) , com pesquisa em parceria com o Fermilab (de Fermi National Accelerator Laboratory):

“Eu sempre quis ir para a pesquisa, mas antigamente eu não tinha ideia de todas as possibilidades de atuação de um físico. Minhas expectativas com o curso foram muito maiores do que eu esperava! Durante o curso meu olhar sobre o profissional se abriu muito, mas ainda assim não mudei de ideia com relação ao caminho que eu gostaria de seguir. As novas oportunidades que eu descobri foram a possibilidade de trabalho em bancos, indústria, consultoria… Mas no geral, físicos podem seguir na área acadêmica fazendo pesquisa e lecionando em universidades, podem lecionar em escolas, podem trabalhar em laboratórios e centros de pesquisas, podem ir para bancos e indústrias por exemplo, podem trabalhar com divulgação de ciências… Tem muito campo para atuação!”

Leia a entrevista completa aqui: 

Onde estudar

Há diversas opções de universidades que oferecem o curso de Física, em todos os estados brasileiros. Em planilha disponibilizada pelo Ranking Universitário Folha 2019 [10] são listadas 144 instituições de ensino superior, com maioria de universidades Federais, concentradas nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste.

Fonte: Autoras, adaptado de [10].

De acordo com o ranking, as universidades brasileiras mais bem conceituadas em relação ao curso de Física são a Universidade de São Paulo, a Universidade Estadual de Campinas e a Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Mulheres na Física

Sobre a presença de mulheres, a área de física passa pelo mesmo problema de representatividade que as demais carreiras de exatas [11]. Elas entraram tardiamente nesta área no país, quando Yolande Monteux, uma das pioneiras no estudo de raios cósmicos, se formou pela USP, em 1937 [12].

Isso aconteceu porque a carreira de física no início do século XX tinha um caráter internacional. Como não havia muitos cursos no país, quem quisesse seguir esta profissão precisava se formar no exterior, o que representava dificuldades para mulheres em uma época em que viajar sozinha não era considerado apropriado para moças de “boa família”. 

Dessa forma, ainda na década de 1940 Elisa Frota Pessoa e Sonia Ashauer se formaram na área, mas foi somente na década de 1960, com a expansão do sistema universitário no país, que as pioneiras em física doutoraram-se em diferentes estados da Federação, a exemplo de Amélia Império Hamburguer, Victoria Hercowitz e Alice Maciel. 

Nas décadas seguintes houve um avanço, e as mulheres foram entrando na física em números cada vez maiores. Ainda assim, a presença delas é significativamente menor do que a masculina, e vai decrescendo conforme se avança na carreira devido ao efeito tesoura e ao teto de vidro. Tais fenômenos dificultam o percurso de mulheres em todas as profissões pelas discriminações e incompreensões sobre as dificuldades impostas pelas obrigações familiares, que ainda recaem majoritariamente sobre as mulheres. 

Enquanto 30% dos estudantes de graduação em física são mulheres, este número cai para 20% no mestrado e para 15% no doutorado [13]. Ainda assim, a presença delas aumentou consideravelmente nos últimos anos, sendo que dados da pesquisa Gender in the Global Landscape, da Elsevier (2017) apontam que a quantidade de mulheres pesquisadoras em física e astronomia no Brasil passou de 21,52% (1.144) entre 1996 e 2000 para 33,18% entre 2011 e 2015 [14].

Tais dados mostram que embora ainda haja um longo caminho a ser percorrido, as mulheres estão conquistando seu espaço e comprovando que não vão aceitar menos do que merecem. Um importante passo neste sentido foi a recente inclusão de uma aba sobre licença maternidade  no currículo Lattes, resultado da luta de anos do movimento Parent In Science, e que permitirá às mulheres justificarem os períodos de “pouca produtividade” causados pela maternidade.

Por isso, se você gosta de física e pensa em cursar uma graduação nesta área, não se intimide pelos dados apresentados. O percurso pode ser árduo, mas os resultados são recompensadores e pode ter certeza que a sua presença fará diferença e servirá de exemplo para as meninas que vierem depois de você. 

Nas palavras da Profª Márcia Barbosa: 

A maior dificuldade é vencer o machismo de todos os dias: mansplaining, maninterrupting, gaslighting and bropriating. É o machismo completo que nunca acaba.

A maior satisfação ocorre quando meus estudantes terminam o doutorado e seguem independentes. Fico olhando cheia de esperanças o futuro deste país brilhar.

***

Para inspirar mais mulheres prosperando nesta área, foram citadas três físicas neste artigo e existem muitas outras mulheres que estudam ou são formadas em física e falam sobre o assunto na internet, como a Drª Gabriela Bailas, dona do canal do Youtube Física e Afins; Julia Marcolan, mestranda em física computacional e que mantém o podcast “Qual Julia disse isso?”, junto com a matemática Julia Jaccoud; e a doutoranda em astrofísica Roberta Duarte, que faz divulgação científica sobre buracos negros nas redes sociais.   

Agradecemos à Profª Márcia Barbosa, Profª Rafaelle e à Drª Mônica Nunes pela contribuição neste post.

Autoras: Gabriela F. Ferreira, Luisa F. Ríos Pinto, Carolina F. Ferreira, Paula Penedo

Referências

[1] Ver em https://www.statista.com/chart/2805/nobel-prize-winners-by-gender/ Acesso em 5 maio 2021

[2] Ver em https://brasilescola.uol.com.br/fisica/construtores-fisica.htm Acesso em 05 maio 2021

[3] Ver em  https://www.guiadacarreira.com.br/cursos/curso-de-fisica/ Acesso em 28 abr. 2021

[4] Ver em https://querobolsa.com.br/cursos-e-faculdades/fisica Acesso em 28 abr. 2021

[5] Ver em https://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=f%C3%ADsica Acesso em 27 abr. 2021 

[6] Ver em https://brasilescola.uol.com.br/quimica/maria-curie-descoberta-radioatividade.htm Acesso em 27 abr. 2021

[7] Ver em https://www.fisica.ufc.br/wp/graduacao/licenciatura/area-de-atuacao-licenciatura/ Acesso em 27 abr. 2021

[8] Ver em https://www.ifsc.usp.br/~cursosgrad/index.php/bacharelado-em-fisica/mercado Acesso em 27 abr. 2021

[9] Ver em https://www.guiadacarreira.com.br/guia-das-profissoes/fisica/ Acesso em 27 abr. 2021

[10] Ver em: https://ruf.folha.uol.com.br/2019/ranking-de-cursos/fisica/

[11] Ver em: http://www1.fisica.org.br/gt-genero/images/arquivos/Mulheres_Pioneiras_/livro-mulheres-na-fisica.pdf

[12] Ver em: http://www.if.ufrgs.br/~barbosa/Publications/Gender/gender-book-trabalhadoras-fisica.pdf

[13] Ver em: https://revistaensinosuperior.com.br/presenca-feminina-ciencias/

[14] Ver em: https://luisacomciencia.wordpress.com/2018/05/17/mulheres-na-ciencia-e-suas-participacoes-por-area/

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