Da griffe ao fast fashion: uma análise das estratégias de produção de coleções colaborativas, por Bárbara Venturini Ábile
As coleções colaborativas, ou seja, a fabricação e a venda de roupas realizada por uma marca de luxo e uma marca fast fashion começaram a ser de meu interesse a partir de 2014. Nessa época, acompanhei o lançamento da coleção VERSACE FOR RIACHUELO enquanto assistente de visual merchandising da própria Riachuelo.
Antes de começar, é importante apresentar uma sucinta definição de fast fashion. É um modo de produção que surgiu na década de 1990, caracterizado pela fabricação, confecção e venda de peças de roupas de forma massificada e rápida, com distribuição em larga escala e, se compararmos com as marcas de luxo, com produtos vendidos por um preço baixo.
A primeira descoberta da pesquisa foi que o encontro entre duas marcas diferentes na confecção de um produto se trata de um movimento comum no mundo globalizado, nomeado pelos estudiosos do marketing como co-branding. Na indústria da moda, tais encontros ocorrem desde 2004, quando pela primeira vez uma fast fashion uniu-se com um criador de moda, resultando na coleção KARL LAGERFELD FOR H&M.
O sucesso foi tanto que desde então a H&M faz parcerias com outras marcas de luxo, como foi o caso de sua aliança com a Versace em 2012. No Brasil, onde a H&M não tem nenhuma loja, a Riachuelo se destaca pelo seu histórico extenso de coleções desse tipo. Não coincidentemente, a marca brasileira realizou parcerias com as já citadas marcas Karl Lagerfeld e Versace.
Tomamos os quatro casos citados como base de nossa análise e percebemos um padrão entre eles: as peças possuíam a etiqueta da marca de luxo, mas eram produzidas e vendidas pelas fast fashions, apenas em lojas selecionadas. Marcella Kanner, responsável pelos co-brandings da Riachuelo, nos explicou em entrevista que o desenho das peças dessas coleções é realizado pelo estilista da marca de luxo enquanto a execução e a produção de tais peças ficam sob responsabilidade da fast fashion.
O responsável pela criação da peça, baseia-se em elementos e características de sua marca, como cores, modelos de sucesso e estampas. Então, embora parte da força de uma marca de luxo esteja ancorada em seu nome de prestígio, esse não era o único elemento a ser mobilizado nessas coleções. As peças também precisavam representar as características das marcas de luxo de alguma forma. Havia, portanto, um esforço de fazer com que a roupa da coleção colaborativa parecesse de fato uma peça original da marca.
Quando prontas, as propostas em desenho são entregue às equipes de marketing e de estilismo da fast fashion que, baseando-se em suas pesquisas internas, estudarão eventuais mudanças nos desenhos das roupas que a marca de luxo propôs. Chegando a um acordo, a fast fashion inicia a execução e a finalização da peça que será vendida. Por exemplo, a coleção VERSACE FOR RIACHUELO foi desenhada em Milão, Itália, pela responsável criativa da marca, Donatella Versace, mas totalmente produzida dentro de fábricas da Riachuelo na China e, no Brasil, em Fortaleza.
Para além do aspecto estético, também nos interessava na dissertação analisar o processo de aliança entre essas marcas. Tendo isso como objetivo, partimos da ideia de que tais alianças são divulgadas pela mídia (e consequentemente, vistas pelos consumidores) como algo improvável. O filme publicitário da parceria entre H&M e Karl Lagerfeld é revelador nesse sentido:
As frases e as representações do vídeo nos dão o tom dessa improbabilidade. Ou seja, é visto como improvável a abertura de marcas de luxo, como Karl Lagerfeld e Versace, à aliança com marcas fast fashions, como H&M e Riachuelo. Foi essa a ideia que guiou meus passos nessa pesquisa.
Esta pesquisa foi possível graças ao apoio financeiro da Capes e da FAPESP. E também contou com o auxílio do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, principalmente do Departamento de Sociologia. Da mesma forma, sem o acompanhamento dos colegas do Grupo de Estudos em Bourdieu (GEBU) e do Collège d’études mondiales, da Fondation Maison Sciences de l’Homme, essas reflexões não teriam sido tão produtivas.
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