Celebrando Rosalind Franklin – a mulher que ajudou a desvendar a estrutura do DNA

Publicado por Marina Barreto Felisbino em

Para inaugurar a Categoria Na história, homenageamos uma figura fundamental na história da ciência, a qual muitos talvez já conhecem ou ouviram falar em função de uma grande injustiça, Rosalind Franklin.

Lembro de maneira clara quando, em uma das primeiras aulas de genética na faculdade, ouvi sua história. Aquilo me casou um espanto danado – ainda não tinha tanta consciência dessas injustiças históricas tão comuns na ciência. Lembro também de ter sentido uma grande empatia com aquela jovem cientista mulher, talvez prevendo o caminho duro que ainda me aguardava.

A corrida para se desvendar a estrutura do DNA

Rosalind Franklin foi uma brilhante cientista, recrutada em 1950 para trabalhar no King’s College London, tornou-se especialista em cristalografia de raios X. A técnica consiste em fazer passar um feixe de raios X através de um cristal da substância em estudo. Devido à simetria do agrupamento de átomos, o feixe se difunde e, por difração, dá um padrão de intensidades que pode se interpretado segundo a distribuição dos átomos no cristal.

Na época, havia uma corrida

Maurice Wilkins

Maurice Wilkins

incessante para se descrever a estrutura do DNA na qual competiam dois grupos: de uma lado Maurice Wilkins do King’s College London, e de outro James Watson e Francis Crick da Universidade de Cambridge. No meio dessa disputa de egos, Franklin, então com trinta e poucos anos, acabou não reconhecida.

James Watson e Francis Crick com seu modelo de DNA em 1953

James Watson e Francis Crick com seu modelo de DNA em 1953

Hoje é bastante comum aquela figura de escada em caracol que representa o DNA, mas em 1950 apenas se tinha conhecimento das bases químicas que compunham essa estrutura, mas não como elas se organizavam espacialmente.

A fotografia 51

Em 1952, Franklin avançava rápido e obteve com raios X ótimas imagens de DNA, especialmente a chamada Fotografia 51. Enquanto isso, em Cambridge, Watson e Crick tentavam desvendar esse enigma por outra perspectiva: construindo modelos. Trabalhando em parceria com Wilkins eles avançavam, mas ainda encontravam dificuldades. Até que, através de Wilkins, tiveram acesso às imagens produzidas por Franklin, especialmente a Fotografia 51. No seu livro de memórias Dupla Hélice (1968) Watson afirma que essa foi a peça que faltava para finalmente chegarem à conclusão que se tratava de uma dupla hélice.

Fotografia 51 produzida por Rosalind Franklin and RG Gosling.

Fotografia 51 produzida por Rosalind Franklin and RG Gosling.

O único porém dessa história é que, aparentemente, Wilkins e Franklin não tinham um bom relacionamento e as imagens foram mostradas para Watson e Crick sem o consentimento dela. Dessa forma, ela nunca soube que teve participação fundamental para o descobrimento da estrutura do DNA.

Em 1958, Franklin faleceu de câncer de ovário. Em 1962, Watson, Creek e Wilkins receberam o prêmio Nobel de medicina. O nome de Franklin nunca foi citado, a dupla de cientista de Cambridge só foi reconhecer sua participação fundamental anos mais tarde.

A história parece digna de roteiro e realmente em 2015 ela foi encenada por Nicole Kidman nos palcos de Londres, quando recebeu um prêmio por sua interpretação em Fotografia 51.

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Nicole Kidman interpretando a cientista Rosalind Franklin na peça Fotografia 51 no The London stage. Por Johan Persson.

Nicole Kidman interpretando a cientista Rosalind Franklin na peça Fotografia 51 no The London stage. Por Johan Persson.

Embora haja muita controvérsia nos relatos, fato é que Franklin teve seu trabalho usado de maneira indevida e não foi inicialmente reconhecida. Se isso se deveu ou não a uma questão sexista, não podemos dizer, mas não parece tão improvável que uma jovem cientista mulher tenha sido preterida em 1950.

Fato é também que ela foi uma brilhante pesquisadora, e estamos sempre precisados de modelos de mulheres cientistas e Rosalind cumpre muito bem esse papel. Por isso, celebramos Rosalind Franklin!


Marina Barreto Felisbino

Bióloga formada pela Unicamp em 2010 e doutora na área de Biologia Celular e Estrutural em 2016. Atualmente trabalho na Universidade do Colorado em Denver-USA, onde desenvolvo pesquisa de pós-doutorado. Apaixonada pela ciência, assim como pelo alcance das mulheres à equidade. Com o desejo que todos vejam a ciência pelos olhos delas.

3 comentários

Roberto Takata · 23 de junho de 2016 às 18:22

Oi, Felisbino,

Não sei se chegou a ver, talvez lhe interesse:
"But You Don’t Look Like A Scientist!: Women Scientists with Feminine Appearance are Deemed Less Likely to be Scientists"
http://link.springer.com/article/10.1007/s11199-016-0586-1
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Estando certo os autores, há mesmo muito trabalho a se fazer pra uma vida acadêmica mais igualitária.

[]s,

Roberto Takata

    Marina Barreto Felisbino · 24 de junho de 2016 às 09:21

    Que interessante, vou ler inteiro para ver como foi conduzido o estudo. Mas, de fato, sabemos que os esteriótipos ainda são muito fortes para o que seria "uma aparência de cientista". Além do que, tivemos aquele triste episódio do Tim Hunt em pleno 2015 que seguiu um pouco esse conceito ao dizer que "Três coisas acontecem quando há mulheres no laboratório: você se apaixona por elas, elas se apaixonam por você e elas choram quando são criticadas." Pelo menos a resposta ao comentário de toda a comunidade foi bastante enfática.

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