O que eu ganho com isso?

Minha mãe já dizia: “filho, é impossível fazer tudo sozinho”. Para dizer a verdade, eu sempre duvidei disso. No entanto (como sempre), ela estava certa. Certas coisas na vida não podemos fazer sozinhos. Para elas, precisamos da colaboração do outro. Já a bastante tempo, acredita-se na idéia de que “trabalhar colaborativamente” é uma das principais características que diferenciam os seres humanos dos outros primatas.

Intrinsicamente ligada à idéia de cooperação/colaboração está a idéia de (1) ter objetivos comuns e (2) divisão dos resultados. Para que haja uma colaboração efetiva é preciso, para começo de conversa, que haja objetivos comuns. Se eu quero A e você quer B, a possibilidade de colaboração entre nós será mínima. Caso o objetivo seja comum, é preciso pensar em como o resultado da colaboração será “dividido” após obtido. Se vamos colaborar um com o outro para obter, por exemplo, R$100,00, precisamos ter uma idéia e expectativas sobre como esse montante será divido após sua obtenção.
É interessante notar que, apesar de chimpazés colaborarem uns com os outros em várias tarefas, caso exista alguma possibilidade e/ou expectativa de que o resultado não será dividido de maneira justa, eles preferem não colaborar. Exemplo: imagine que para obter duas bananas, dois macacos precisem trabalhar colaborativamente (eles precisam agir juntos para abrir a porta de onde as bananas estão). Se as duas bananas estiverem mais perto de um dos macacos (aumentando a possibilidade desse macaco simplesmente pegar as duas bananas e ir embora), geralmente a colaboração entre eles é mínima. Mas se uma banana está perto de um e a outra perto do outro, eles ‘colaboram’ um com outro sem problemas, cada um pega uma banana e vai para casa feliz.
Em outras palavras, a colaboração entre os macacos é diretamente influenciada pela expectativa que eles têm sobre a divisão dos resultados após obtidos. E tem mais: geralmente, o macaco que pega as duas bananas, raramente divide com o outro (mesmo quando o outro é o próprio filhote). Será que o nosso potencial colaborativo é muito diferente disso?
Felix Warneken, Karoline Lohse, Alicia Melis e Mike Tomasello investigaram essa questão em um estudo publicado recentemente (Junho/2011). Em 2006, Alicia Melis fez um estudo com chimpazés onde ela montou um aparato em que, para obter a comida, os macacos precisavam agir cooperativemente. Basicamente, o aparato consistia de uma plataforma localizada dentro de uma caixa de vidro. A comida era colocada nessa plataforma. Para pegar a comida, os macacos precisavam puxar a plataforma para perto deles (utilizando uma corda localizada em cada lado da plataforma) e então alcançar a comida através de um buraco na caixa de vidro. A plataforma só movia em direção aos macacos quando cada um puxava a corda do seu lado ao mesmo tempo. Em uma das situações, a caixa de vidro tinha dois buracos (um para cada macaco), de maneira que cada um poderia pega a sua comida (banana). Na outra situação, a caixa tinha apenas um buraco, aumentando a possibilidade de que apenas um dos macacos ficaria com as duas bananas. Foi nesse estudo que Alicia Melis mostrou que quando há a possibilidade de que apenas um dos macacos fique com as bananas, eles colaboram menos um com o outro.
Felix Warneken e seus colaboradores fizeram exatamente o mesmo estudo com crianças de 3 anos de idade. O aparato foi o mesmo (ao invés de banana, no entanto, eles utilizaram adesivos coloridos, balas e chicletes). As crianças, ao contrário do que mostrava algumas pesquisas anteriores, foram bem colaborativas umas com as outras, independente da possibilidade de divisão dos resultados, ou seja, não importa o número de buracos na caixa de vidro, elas agiram cooperativamente quase 90% das vezes.
Quando havia apenas um buraco na caixa de vidro, elas dividiam a recompensa com a outra. O interessante, no entanto, foi a forma como elas dividiam os resultados. Oitenta por cento das vezes, a divisão foi “implícita”. Por exemplo, se havia dois chicletes na plataforma, elas puxavam juntas a plataforma, uma criança pegava um chiclete e simplesmente deixava o outro na plataforma. Apenas 11% das vezes a divisão foi explícita, com uma criança pegando os dois chicletes e entregando um à outra criança (ou uma criança pegando um chiclete e apontando para a outra criança que ela poderia ficar com o outro chiclete).
Os resultados sugerem que a idéia de divisão igualitária e ação colaborativa sem competição começa cedo na ontogenia humana (mais cedo do que se pensava antes). Eles sugerem também que os fatores que influenciam a colaboração entre os seres humanos é qualitativamente diferente dos fatores que influenciam a colaboração entre primatas.
Os resultados parecem contra-intuitivos quando pensamos nos tipos de colaboração e divisão de resultados que vemos na maior parte das nossas interações na vida adulta (principalmente as que vemos na vida pública). Mas pelo menos temos uma idéia de que a essência é colaborativa e igualitária.
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Referência:

Warneken, F., Lohse, K., Melis, A., & Tomasello, M. (2010). Young Children Share the Spoils After Collaboration Psychological Science, 22 (2), 267-273 DOI: 10.1177/0956797610395392

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