Pelo mau uso do ‘literalmente’

Se você vive sendo literalmente execrado por abusar do uso figurativo do advérbio “literalmente”, saiba que está em boa companhia. Até o próprio Times — o famoso jornal londrino — andou judiando do advérbio nos primórdios de 1949. O resultado foram algumas cartas dos leitores literalmente hilárias publicadas ao longo do mês de abril daquele ano:

Sir,

Sua recente reportagem sobre um jogador de tênis que “literalmente dinamitou seus adversários para fora do campo” sugere que está sendo preciso ser menos sutil para vencer. Como, por exemplo, indica a palavra “literalmente” em uma metáfora, não seria inadequado o uso de dinamite em uma partida de primeria classe?

Atenciosamente,
B.W.M. Young

Sir,

Talvez o uso mais pitoresco do “literalmente” foi daquele escritor que afirmava que “durante cinco anos Mr. Gladstone esteve literalmente colado ao Banco Central.”

Cordialmente,
E.W. Fordham

Outros leitores que aproveitaram para apresentar suas próprias experiências com o literal advérbio:

Sir,

Eu apresento o seguinte, longo e adoravelmente lembrado exemplo de meus dias de “penny dreadful”: “Dick, calorosamente perseguido pelo caçador de couro cabeludo, virou-se sobre sua sela, atirou e literalmente dizimou o índio”.

Cordialmente,
Edward Evans

Penny dreadful era o equivalente vitoriano dos contos de ficção pulp, publicados em papel vagabundo e vendidos a preços baixíssimos.

Também houve relato de abuso por parte de uma agência de viagem:

Sir,

Um guia para a Grécia amplamente lido no pré-guerra costumava descrever os habitantes daquele país como tão interessados em política que poderiam ser vistos diariamente “em cafés e restaurantes literalmente devorando seus jornais”.

Atenciosamente,
F.J.B. Watson

Mr. Davidson foi um jornalista que se arrependeu e também escreveu para reconhecer, ainda que com décadas de atraso, seu mau uso do literalmente:

Sir,

Quando eu era editor-assistente do “Saturday Review” no começo dos anos 1920, durante uma ausência temporária do editor eu permiti que um revisor declarasse, naquelas páginas augustas, que seu coração estava literalmente em suas botas.

Atenciosamente,
Ivy Davidson

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