Patentes Patéticas (nº. 89)

http://www.google.com/patents/US4173016Timidez é um problema muito sério, mas soluções não faltam. Carlisle H. Dickson pode até ter sido um tímido bastante introvertido, mas o caso dele deve ter sido o mais sério de todos. Ispo facto, Dickson é o criador do Interpersonal-introduction signalling system [Sistema de sinalização e apresentação interpessoal]:

Um sistema de sinalização e apresentação interpessoal que inclui um transceptor (um emissor e receptor) com raio de resposta relativamente curto e de tamanho tal que permita o conveniente uso por uma pessoa. Um sistema de códigos define uma pluralidade de categorias, cada uma das quais com uma caracteristica particularmente identificável. Cada pessoa carregando um transceptor pode selecionar um código em particular para ser emitido e um código em particular para aceitação, sendo tal informação escolhida transmitida e/ou recebida. Ao aceitar um sinal ou informação, um sinal diferente é enviado pelo receptor para indicar a aceitação da pessoa transmissora. O transceptor inclui um indicador para alertar a pessoa receptora e indicar a necessidade da transmissão de uma resposta. Assim, a codificação permite que diversas pessoas envolvidas definam a diferentes categorias de pessoas com características únicas selecionadas para o contato.

Trocar sinais através de códigos — o que Dickson conseguiu foi praticamente patentear a comunicação interpessoal. Como não dá pra patentear linguagens, sejam línguas vocalizadas, escritas ou códigos gestuais, Dickson afirma ter criado um sistema com base em sinais de rádio. Obviamente, ele também não deveria patentear comunicação via rádio. Mas de alguma forma ele conseguiu, pois, segundo a patente 4.173.016 [pdf], Carlisle H. Dickson é o inventor de tal sistema supra-descrito. Não que a aprovação tenha sido fácil: o pedido foi apresentado em 04/01/1973, mas só foi aprovado em 30/10/1979(!).

Embora pareça uma solução para um problema relativamente comum, deve ter sido difícil mesmo entender os motivos de Dickson. Entre os antecedentes, o inventor e morador de Milwaukee, cita sistemas de controle remoto por rádio, equipamentos de medição de distância e sistemas anti-colisão para aeronaves. A diferença, segundo Dickson, é que esses sistemas permitem apenas e tão somente a comunicação entre outros sistemas ou objetos, não entre humanos. O que Dickson propõe é algo similar para comunicação interpessoal. Mas como funciona o transceptor de Dickson? Ele mesmo explica na patente:

Como exemplo do uso da presente invenção, o aparelho pode ser usado em um baile ou coisa parecida para moças e rapazes. Sinais em código para o evento podem ser postados ou combinados de alguma forma. Uma moça pode codificar seu receptor para responder apenas ao sinal que significa “Eu sou do sexo masculino, quero dançar com você e minha música favorita é hard rock”. Quando o sinal é recebido, o aparelho da moça indica a recepção do sinal apropriado de que tal moço pode se aproximar dela com a segurança da aceitação baseada em interesses mútuos. Geralmente a moça tem um transceptor similar e pode controlar sua resposta a tal transmissão, seja automaticamente ou por um ato positivo, através de uma transmissão adequadamente codificada que é, por sua vez, recebida pelo emissor [do sinal anterior]. Quando tal comunicação é estabelecida, o rapaz pode se aproximar da moça seguindo o sinal, que terá seu nível relacionado à distância da separação. A qualquer momento ela pode desligar o seu emissor, o receptor ou ambos.

Meninas, não temam! Se a moça não gostar do sujeito que está dando as caras, ela pode simplesmente trocar o sinal que está emitindo, passando de algo como “loira gostosa a fim de dançar” para “baranga louca pra casar”. Sim, o sistema tem os mesmos defeitos da interação boca-a-boca — a possibilidade de ser enganado ou levar um pé na bunda — com o adicional de ocupar o seu bolso com um radinho nada atraente.

Para não parecer um forever-alone-master tentando resolver o próprio problema (ou um aproveitador de tímidos hardcore, desses que ficam socialmente paralisados), Dickson ainda afirma que seu sistema pode ser útil nos “negócios, controles ou usos similares”. Cita o exemplo de seguranças que “numa multidão podem prontamente se identificar mutuamente como agentes da lei” (como se policiais já não tivessem seus walkie-talkies) ou de pessoas que, num leilão, “desejam combinar seu poder de compra para poder comprar rapidamente e localizarem-se prontamente” (como se alguém fosse a um leilão para cooperar em vez de competir).

O uso de radiotransmissores para se comunicar pode ser realmente necessário em determinadas situações. Mas no caso de um baile ou qualquer outro evento social, seria algo bastante patético: aquele que fosse realmente inseguro a ponto de confiar num sistema desses seria provavelmente o único a usar seu aparelho — e não dá pra conversar se você for o único a “falar sua língua”. Dar a cara a tapa pode ser algo dolorido muitas vezes, mas geralmente não custa nada.

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comment 0 comments
  • rafinha.bianchin

    Eu sou um tímido-hardcore-para-situações-de-comemoração-social, mas me sinto mais seguro falando por mim mesmo (mas há controvérsias).
    Aliás, "Hominídio" não se escreve como "Hominídeo"?

    • Renato Pincelli

      Eu fiquei boiando sobre sua pergunta até me lembrar da minha descrição. É "Hominídeo" mesmo e eu ainda não havia percebido o equívoco.

    • rafinha.bianchin

      A idéia era essa mesmo. Mas coloca 'Hominidae' que aí não tem erro ;D

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