Neurô, o metrô neural

neurô
Flagrante microscópico de um neurônio tomando um neurô, isto é, lançando um axônio através de um microtubo. [Imagem: Xiuling Li/University of Illinois]

Linhas de metrô e redes de neurônios têm muitas coisas em comum. Ambos os sistemas são complexos, caros, exigem conexões delicadas e crescem de modo lento e subterrâneo. Sim, neurônios também crescem em túneis e pesquisadores da Universidade de Illinois e da Universidade de Winsconsin estão usando microtubos para replicar esse ambiente sob o microscópio. Recém-descoberta, a técnica permite não só a observação direta do crescimento neuronal, mas vai facilitar o estudo das redes neurais e pode até acelerar e guiar o crescimento de neurônios para reparação de danos.

Durante muito tempo, os cientistas pensaram que os neurônios não cresciam nem se reproduziam no cérebro. Assim, pensava-se que o número de neurônios simplesmente ia caindo ao longo da vida, com a consequente queda das funções cerebrais. Na última década, diversas pesquisas revelaram que não é bem assim. Apesar de observado, esse crescimento neuronal ainda não foi reproduzido no laboratório da maneira exata como ocorre no cérebro.

Entrando pelo cano

O motivo é simples: neurônios não gostam das placas de vidro, com sua planura chata e fria. Sentem-se mais à vontade em ambientes macios e aconchegantes, como o interior do cérebro. Técnicas anteriores tentaram reproduzir esse ambiente cerebral usando canais escavados em placas de vidro ou outros materiais sólidos, mas nesse caso as células nervosas ficam, digamos, nervosas e se comportam de maneira distinta do que acontece no corpo. Não é algo muito útil para o estudo in-vivo. Nem muito prático, no caso dos substratos sólidos e opacos, que impossibilitam a observação microscópica.

Usar microtubos transparentes por onde os neurônios possam crescer de maneira guiada parece a solução perfeita. A ideia veio de um professor de Engenharia Elétrica e Engenharia da Computação da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign: Xiuling Li. Co-autor do estudo com o professor Justin Williams, da Universidade de Winsconsin em Madison, o prof. Li define os microtubos como uma poderosa plataforma tridimensional para a cultura neural, que permite acelerar e medir o processo de crescimento dos neurônios. Outro autor do estudo é Paul Froeter, graduando da Universidade de Illinois. Foi Froeter quem descobriu os microtubos de material transparente que podem ser usados nas placas de microscópio e permitir a observação.

Tomando o neurô

Em artigo publicado online em 20/10 no site da revista American Chemical Society Nano, a equipe descreve a técnica do microtubo, os resultados das primeiras observações e propõe seus usos. A técnica usa uma rede de microtubos formados por membranas finíssimas de nitreto de silício (SiNx). Essas membranas de cerâmica são enroladas facilmente em tubos de dimensões precisas e translúcidos. Esses microtubos já eram usados para fins eletrônicos no laboratório do Prof. Li, em aplicações como indutores 3D. Na aplicação neuronal, os tubinhos têm o tamanho aproximado de um neurônio, podem ser longos como um fio de cabelo e foram separados por intervalos iguais ao seu comprimento.

As primeiras observações foram promissoras. Li e seus colaboradores confirmaram uma de suas hipóteses: os axônios não só crescem em túneis como crescem mais depressa dentro deles. A aceleração dentro do microtubo foi até 20 vezes maior do que no espaço entre dois túneis. É como se fosse um neurô, um metrô de neurônio. No time-lapse a seguir, é possível observar como a célula nervosa “anda” mais rápido quando toma o túnel formado pelo microtubo:

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[Imagem: Xiuling Li/University of Illinois]

A curto prazo, Li et al. buscam aperfeiçoar os microtubos. Entre os planos, está o desenvolvimento de versões dos tubos com eletrodos, o que permitiria a medição direta dos sinais elétricos transmitidos pelos axônios, inclusive durante seu crescimento. A longo prazo, um dos objetivos dos pesquisadores é que os microtubos possam ter um uso terapêutico: eles poderiam ser implantados como infra-estrutura em áreas com danos neurais para promover a regeneração controlada dos neurônios, refazendo as redes e conexões.

Referência

rb2_large_gray25LI, X.; WILLIAMS, J.; FROETER, P. Toward Intelligent Synthetic Neural Circuits: Directing and Accelerating Neuron Cell Growth by Self-Rolled-Up Silicon Nitride Microtube Array [A Caminho de Circuitos Neurais Sintéticos Inteligentes: direcionando e acelerando o crescimento de células neuronais por arranjo de microtubo de nitreto de silício auto-enrolado]. ACS Nano. online at pubs.acs.org/doi/abs/10.1021/nn504876y

[via phys.org]

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  • Samuel Bomfim

    Excelente avanço! Uma possibilidade também para o melhoramento de entender doenças neurodegenerativas, como a esclerose lateral aminiotrófica!

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