Luz do sol, que a lesma traga e traduz

E.crispata
Elysia crispata, a.k.a. Tridachia crispata, mas pode chamar de lesma-alface

Tragar cloroplastos e sair por aí traduzindo luz em vida, seria uma boa ideia, não? Por mais alfaces que você devore, não vai conseguir. Para conseguir roubar o mecanismo da fotossíntese, é necessário roubá-lo de maneira mais sutil. É preciso ser um cleptoplasta.

A cleptoplastia é um tipo de simbiose no qual os plastídeos — especialmente os cloroplastos — de algas são sequestrados pelos seus predadores. Os organismos cleptoplastas comem as algas numa boa, como qualquer herbívoro, mas poupam os cloroplastos durante a digestão. Assim preservados, os plastídeos continuam funcionais e são “mantidos em cativeiro” pelo predador.

Esse fenômeno é relativamente comum em alguns seres unicelulares, como foraminíferos, dinoflagelados e ciliados. Mas nem sempre é preciso um microscópio para ver um cleptoplasta em ação. Os poucos animais que se apropriam indebitamente de cloroplastos são as pequenas lesmas marinhas do taxon Sacoglossa.

Depois de jantar umas algas, os bichinhos (que têm entre 7mm e 8cm) guardam os cloroplastos em seu epitélio digestivo ou mesmo em outros tecidos. Há muito essa característica chama a atenção dos cientistas interessados na evolução da endossimbiose.

Segundo um paper publicado em 2009 por Katharina Händeler et. al., a atividade fotossintética varia amplamente entre as espécies sacoglossas. Nas lesmas estudadas, foram observados três tipos de cleptoplastia: não-funcional (i.e., os cloroplastos são preservados mas não usados); de curto prazo (cloroplastos funcionam por apenas uma semana) e de longo prazo (cloroplastos funcionais por mais de um mês).

Uma das espécies com retenção de longo prazo é a Elysia crispata, que, ao longo da vida, pode ser tanto hetero- quanto autotrófica. Nos indivíduos mais jovens, de acordo com Thompson e Jarman (1989), as algas são consumidas e digeridas rapidamente e quase não há retenção de cloroplastos (que se acumulam nos parapódios). À medida que envelhecem, as lesminhas tornam-se mais dependentes da fotossíntese roubada.

Referências

rb2_large_gray25HÄNDELER, K. et. al. Functional chloroplasts in metazoan cells - a unique evolutionary strategy in animal life. Frontiers in Zoology 2009, 6:28  doi:10.1186/1742-9994-6-28
THOMPSON, T. E. & JARMAN, M. G. Nutrition of Tridachia crispata (Mörch) (Sacoglossa). Journal of Molluscan Studies, v. 55, n. 2 (10 de maio de 1989), pp. 239-244. doi: 10.1093/mollus/55.2.239
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