>Os Vermes de Lawrence

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Você se lembra do filme O Óleo de Lorenzo, onde os pais, desesperados, começam a estudar e a pesquisar sozinhos uma cura para o filho? O filme era baseado em fatos reais, mas às vezes até a vida gosta de fazer um remake. E assim como em um remake, o final da história pode ser ao mesmo tempo surpreendente e repetitivo.
Conforme relatam em detalhes um artigo da The Scientist e Alyson Muotri em sua coluna no G1, em 2007 os pais de Lawrence, de 13 anos, resolveram procurar um tratamento mais efetivo para o autismo do garoto nova-iorquino. Diagnosticado aos dois anos, o menino tem um quadro grave de autismo. Ele mordia os poucos colegas que tinha e demonstrava muita ansiedade e agitação. Também havia episódios de autoagressividade: ele batia a própria cabeça na parede.

O pai dele, Stewart, procurou diversos tratamentos: terapia comportamental, alterações na alimentação e musicoterapia, além de diversas combinações de medicamentos. Apesar de alguns sucessos, a melhora era quase sempre temporária: os efeitos “evaporavam” e os sintomas voltavam, muitas vezes até piores. Como muitos pais, Stewart decidiu partir para a medicina alternativa.

Medicina Alternativa de Verdade
Mas diferente de muitos pais, Stewart não procurou alívio para o autismo de seu filho em práticas pseudocientíficas, como a homeopatia. O pai de Lawrence foi racional: pesquisou sobre os sintomas do filho em literatura especializada e em revistas científicas através de sites como o PubMed.
Enquanto pesquisava, ele descobriu uma terapia usada com sucesso em pacientes com a doença de Crohn, uma doença autoimune (em que o próprio organismo ataca células intestinais). Nessa terapia, os pesquisadores usaram vermes de porcos (Trichuris suis) para regular o sistema imunológico e diminuir a inflamação. Stewart também descobriu que alguns dos sintomas autistas podem ser causados por ataques do sistema imunológico às células da glia no cérebro.
Aí, juntou: ele percebeu um nexo que ninguém reparou e, como todo cientista, decidiu testar sua hipótese. Como não podia fazer nada sozinho, apresentou sua tese a um grupo de pesquisadores do Albert Einstein College of Medicine. Os médicos acharam a descoberta inusitada, mas decidiram ajudar. Stewart conseguiu comprar ovas de T. suis para o tratamento do filho. Isso mesmo, ele resolveu implantar vermes de porco no intestino de Lawrence para tentar controlar o autismo.

Surpresas e Reprises
Supreendentemente, esse tratamento com tricuríase induzida teve sucesso — depois de dez semanas, os sintomas desapareceram. Quinze meses se passaram tranquilamente desde o começo do tratamento. Como não dá pra tirar conclusões com apenas um caso, mais pesquisas estão em andamento.
Embora o tratamento de autismo com vermes de porcos seja uma novidade, ele reforça uma antiga teoria sobre o autismo. É a hipótese da higiene. Segundo essa hipótese, a falta de contato com elementos naturais causada pela limpeza e urbanização excessivas levariam a um desequilíbrio no sistema imunológico. Além de causar outras doenças autoimunes, um sistema imunológico descontrolado (para não dizer ocioso e paranoico feito o Exército americano em plena Guerra Fria) poderia começar a atacar o cérebro. Embora possa haver diversas outras causas — inclusive genéticas —, as hipóteses ambientais e sociais são as que parecem mais plausíveis.
Apesar de toda a cobertura da mídia e do consequente hype (principalmente na Inglaterra e nos Estados Unidos), não há qualquer correlação comprovada entre autismo e a vacina tríplice viral. Mas houve, isso sim, verdadeiros surtos (só que de sarampo) causados pelo descuido de pais excessivamente protetores e crédulos (e uma mídia conservadora bastante crédula também). Ironicamente, esses são os mesmos pais que podem causar autismo, ao manter a casa sempre impecavelmente limpa, servir água filtrada e alimentos preparados perfeitamente e ao jamais deixar as crianças brincarem lá fora, na “sujeira” (terra, areia, grama, lama, etc.).
Ou você já ouviu falar de moleques pobres com barriga d’água e autistas?
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