Patentes Patéticas (nº. 99)

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A senhora precisa secar os cabelos, mas está sem eletricidade? Ou então seu secador está queimado ou sem baterias? E tudo o que a senhora tem à mão, além de um secador de cabelo elétrico inútil, é um par de pilhas e um isqueiro? A senhora, por acaso, é casada com o McGyver? Pois se não for, não precisa ser. Basta passar no camelô mais próximo. Graças a Akinobu Fujiwara e seu Gas Combustion Type Hair Drier [Secador de Cabelos do Tipo Combustão a Gás]:

secador de cabelo do tipo combustão a gás 1, que inclui um tanque de gás 29, para armazenamento do gás de combustão; um combustor 11 para combustar o gás de combustão fornecido pelo tanque de gás 29; uma ventoinha 17 trocador de calor resultante do combustor 11; uma bateria seca 31 que serve como fonte de energia para rodar o motor 19 da ventoinha 17; um dispositivo de ignição para ignitar o gás de combustão; um ejetor 7 para permitir que o ar externo seja puxado devido à pressão negativa criada por um fluxo de velocidade [sic] da combustão do gás a ser fornecido ao combustor 11; e um invólucro 3 que receba o combustor 11, a ventoinha 17 e o ejetor 7, sendo que o combustor 11 apresenta uma pluralidade de câmaras de combustão 85 compostas de paredes periféricas externas [sic] não-circulares ao redor de uma periferia de uma seção 73 de um combustor de gás.

Se parece seguro, minha senhora? Para Fujiwara-san e para o United States Patent Office, sim. Após conseguir uma patente em seu próprio país, Fujiwara entrou com um pedido de patente nos Estados Unidos em 28 de dezembro de 2001. Quase quatro anos mais tarde, a patente foi finalmente aprovada em 1º. de novembro de 2005, sob nº. 6.959.707 [pdf].

Embora não deixe isso explícito em sua patente, Fujiwara deve acreditar que um secador de cabelo a gás é mais seguro que um elétrico. Pelo simples fato de que se a senhora decidir usá-lo na banheira, não corre o risco de ser eletrocutada. No máximo, a senhora se queimaria, mas nesse caso já haveria água por perto, então tudo bem.

Não que, pra variar, a ideia seja original. Em relação a isso, Fujiwara descreve minuciosamente o funcionamento de sistemas similares anteriores à sua invenção. Segundo sua descrição, os tais secadores a gás são problemáticos por serem grandes, ineficientes e inseguros. Um dos problemas é que os sistemas concorrentes podem causar queimaduras mesmo depois de desligados: “[…] Especialmente, mesmo após um intervalo de vinte minutos, é difícil para uma mão tocar a unidade […]” sem correr riscos.

OK, mas como esses defeitos são resolvidos por Fujiwara? Basicamente, ele propõe o uso de GLP e de um material poroso para controlar o fluxo de ar e ainda a combustão do gás através de diversos pequenos orifícios. Ou, segundo a descrição da figura 4:

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disposto no ejetor 7 está uma câmara de armazenamento de GLP 61 que armazena GLP fornecido pelo tanque de gás 29 através da cânula de fornecimento de gás 49 e uma câmara de geração de gás misto [que deve ser o número 65 e que o inventor esqueceu de indicar] que permite que GLP e ar sejam misturados para produzir o gás misto que será introduzido no combustor 11, com as tomadas de ar 13 estendendo-se através da parede lateral  da câmara de geração de gás misto 63.

Não que isso seja muito esclarecedor, minha senhora.

Depois de filtrado, o GLP seria ejetado a uma “alta velocidade, próxima de uma velocidade acústica”, embora não fique claro como o gás seria lançado a tão alta velocidade (nem porque isso seria mais seguro). Depois, há uma série de pequenas pecinhas que buscam controlar a combustão, mantendo-a numa direção radial, de fora para dentro de um círculo, que é a seção da parte superior (e horizontal) do secador.

Em meio às minúcias técnicas, Fujiwara reconhece que há riscos. Mas, evidentemente, procura minimizá-los:

Embora o design seja feito de maneira a limitar a combustão do gás com vistas a evitar a ocorrência de um aciente, quando há uma deficiência tal como um aumento anormal no fluxo de gás para combustão, a chama sai pela saída do sopro quente [hot blast], mesmo quando a deficiência ocorre por qualquer chance para causar a combustão do gás a ser ejetado em um volume maior que o requerido, um largo volume de ar fluindo através das periferias das câmaras de combustão pela ação da ventoinha é misturado com gás de combustão imediatamente à frente da saída, nenhuma possibilidade ocorre para que a chama venha para fora (onde o excesso de ar é incapaz de mater a combustão da chama e a chama é distinta [sic; distinguished, no orig.; talvez o inventor japonês quisesse dizer “extinguished” ou “extinta”]).

Páçaro da dislexia feelings. Pelo que dá pra entender, o que ele afirma é “a garantia sou eu”. E o secador deve ser tão descartável quanto um isqueiro de camelô mesmo, já que funciona com “aproximadamente 28ml de GLP, mistura gasosa composta principalmente de butano” e “dois pares de baterias alcalinas LR-6”, que nada mais são do que 4 pilhas AA alcalinas. Vai levar, madame?

Se a senhora ainda está desesperada com a falta de um secador de cabelo elétrico, não entre em pânico: use a toalha mesmo. Pelo menos ela não fica sem bateria. Nem queima.

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comment 0 comments
  • rafinha.bianchin

    Parece um enigma do Igor:
    "Você tem quatro pilhas, um isqueiro e está sendo observado. Encontre uma maneira de secar o cabelo antes de dois minutos".
    Mas, sairia fogo do bocal do secador? E, a uma "velocidade acústica", que julgo ser algo em torno de 300 m/s, não haveria o sério risco de que objetos fossem lançados através do secador (a.k.a. 'bird strike')?

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