O mistério do Homem de Sandy Cove

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Sandy Cove, Nova Scotia, circa 1910.

No dia 8 de setembro de 1863, um corpo sem pernas foi descoberto por George Colin Albright, um garoto de oito anos, na praia de Sandy Cove, Nova Scotia, no Canadá. Parecia estar ao relento há algumas horas, mas não estava morto. Aparentava no máximo uns vinte anos de idade e tossia violentamente. Quem era ele? Como ele foi parar ali?

Resgatado pelos habitantes da vila de Digby, aquele homem recuperou a saúde mas revelou-se melancolicamente taciturno: por mais que lhe questionassem, nunca revelava sua identidade. Na verdade, ele mal podia falar. Embora tenha sido encontrado apenas com uma lata de biscoito água-e-sal e uma garrafa de água, suas mãos eram limpas e lisas, o que talvez indicasse que era bem-nascido. As pernas pareciam ter sido amputadas — pouco acima dos joelhos — por um bom cirurgião.

Tentativas de comunicação foram feitas em inglês, francês, espanhol, italiano e até latim. Sem sucesso. O mistério de sua identidade deu lugar a uma série de rumores: ele seria um veterano da Guerra Civil americana ou um pirata, ou um espião ou um assassino, quem sabe até um Habsburgo exilado ou perdido. Na falta de um nome, passou a ser chamado de Jerome, interpretação dada a um de seus murmúrios pouco inteligíveis.

Durante quase 50 anos, Jerome recebeu uma magra pensão da municipalidade e ficou aos cuidados de diversas famílias da região de Sandy Cove. Diante das intermináveis perguntas dos curiosos, sempre manteve-se em silêncio. Curiosamente, Jerome faleceu enquanto o Titanic afundava. Em 15 de abril de 1912, o Halifax Morning Chronicle soltou uma notinha sobre o misterioso recém-falecido, em que concluía: “O povo desta localidade já desistiu de resolver esse grande mistério encerrado hoje com sua morte. Termina assim um dos maiores segredos já ocorridos neste continente.”

Ao longo desse século e meio de mistério, algumas teorias têm sido levantadas. Além de perder as pernas, Jerome poderia ter sofrido alguma lesão cerebral, o que lhe impedia de falar de modo compreensível ou de lembrar-se de quem era.

Em Jerome: Solving the Mystery of Nova Scotia’s Silent Castaway, o historiador Fraser Mooney Jr. propõe outra hipótese: Jerome seria um estrangeiro que sofreu um acidente num rio em Chipman, Nova Brunswick, do outro lado da Baía de Fundy, em 1859. Suas pernas teriam sido amputadas após o acidente por causa da gangrena. Após recobrar a consciência ele só gritava por gamba — pernas, em italiano — e passou a ser conhecido como Gamby.

Segundo Mooney, depois de alguns anos os moradores de Chipman resolveram se livrar de Gamby e pagaram ao capitão de uma escuna para que o levasse embora. É possível que esse capitão também tenha resolvido se livrar do inválido, lançando-o ao mar. Ou então, numa tentativa de fuga, o próprio homem jogou-se do barco.

Na falta de evidências concretas — não existe uma foto sequer de Jerome (ou Gamby) —, muitos ainda duvidam da hipótese de Mooney. De qualquer forma, nunca saberemos. Como ocorreria no século XX como o Homem de Somerton, até hoje ninguém sabe quem realmente foi o Homem de Sandy Cove.

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