IgNobel 2016: as pesquisas mais improváveis do ano

Existem pesquisas científicas que parecem engraçadas, dignas de cientistas malucos de desenhos animados. Botar calças em ratos, se coçar diante do espelho, fazer perguntas aos mentirosos (e acreditar nas respostas), observar e descrever o mundo de cabeça pra baixo. Todas essas são, na verdade, pesquisas científicas bem sérias. E ninguém as leva tão a sério quanto a revista Annals of Improbable Research, que acaba de premiar esses trabalhos com o IgNobel.

Realizada ontem à noite na Universidade de Harvard tendo como tema o Tempo, a 26ª. cerimônia de premiação do IgNobel foi bagunçada como já é tradição. Foram proferidas as palestras 24/7 (uma descrição técnica em 24 segundos seguida de um resumo em 7 palavras) e apresentada a ópera The Last Second (sobre um complô para acrescentar um segundo extra em todos os relógios do mundo e ganhar dinheiro com isso). Em meio a duas chuvas de aviõezinhos de papel e um campeonato de jogo-da-velha com um neurocirurgião, um cientista de foguetes e cinco laureados da versão chata do IgNobel (o Prêmio Nobel), foram anunciados os ganhadores em 10 categorias:

1) Reprodução
Laureado: Ahmed Shafik (Egito)
Pelo estudo dos efeitos do uso de calças de poliéster, algodão ou lã na vida sexual de ratos (e, mais tarde, de seres humanos). Shafik concluiu que os ratinhos usuários de calças de poliéster ou mistas têm menos atividade sexual (1), o que também seria o caso entre humanos (2). O cientista egípcio cometeu a desfeita de não comparecer por ter morrido em 2007.

Referências: (1) “Effect of Different Types of Textiles on Sexual Activity. Experimental study,” Ahmed Shafik, European Urology, vol. 24, no. 3, 1993, pp. 375-80. (2) “Contraceptive Efficacy of Polyester-Induced Azoospermia in Normal Men,” Ahmed Shafik, Contraception, vol. 45, 1992, pp. 439-451.

2) Economia
Laureados: Mark Avis, Sarah Forbes e Shelagh Ferguson (Nova Zelândia e Reino Unido)
Pela descrição das personalidades percebidas de diferentes rochas do ponto de vista do marketing. Avis e Forbes compareceram à cerimônia.

Referência: “The Brand Personality of Rocks: A Critical Evaluation of a Brand Personality Scale,” Mark Avis, Sarah Forbes, Shelagh Ferguson, Marketing Theory, vol. 14, no. 4, 2014, pp. 451-475.

3) Física
Laureados: Gábor Horváth, Miklós Blahó, György Kriska, Ramón Hegedüs, Balázs Gerics, Róbert Farkas, Susanne Åkesson, Péter Malik e Hansruedi Wildermuth (Hungria, Espanha, Suécia e Suíça)
Por descobrirem porque os cavalos brancos são os mais resistentes às mutucas (Tabanus sp.): aparentemente, essas moscas atraídas pelas cores escuras (1). Quem também gosta de coisas escuras são as libélulas, que são fatalmente atraídas por lápides negras (2), segundo os pesquisadores. Desse grande grupo, apenas Susanne Åkesson compareceu à premiação.

Referências: (1) “An Unexpected Advantage of Whiteness in Horses: The Most Horsefly-Proof Horse Has a Depolarizing White Coat,” Gábor Horváth, Miklós Blahó, György Kriska, Ramón Hegedüs, Balázs Gerics, Róbert Farkas and Susanne Åkesson, Proceedings of the Royal Society B, vol. 277 no. 1688, pp. June 2010, pp. 1643-1650. (2) “Ecological Traps for Dragonflies in a Cemetery: The Attraction of Sympetrum species (Odonata: Libellulidae) by Horizontally Polarizing Black Grave-Stones,” Gábor Horváth, Péter Malik, György Kriska, Hansruedi Wildermuth, Freshwater Biology, vol. 52, vol. 9, September 2007, pp. 1700–9.

4) Química
Laureada: Volkswagen (Alemanha)
Segundo o comitê do IgNobel, a fabricante alemã foi premiada por “resolver o problema das excessivas emissões de poluentes automotivos por meio da produção reduzida automática e eletromecanicamente de poluentes quando os carros estão sendo testados”. Mal-humorada, a VW não mandou um representante para receber seu prêmio.

Referência: “EPA, California Notify Volkswagen of Clean Air Act Violations”, U.S. Environmental Protection Agency news release, September 18, 2015.

5) Medicina
Laureados: Christoph Helmchen, Carina Palzer, Thomas Münte, Silke Anders e Andreas Sprenger (Alemanha)
Por descobrirem que, se você estiver com uma coceira do lado direito do corpo, pode aliviá-la ao olhar para um espelho e coçar o lado esquerdo do corpo (e vice-versa). Pode parecer ridículo mas funciona, segundo Spreger, que foi receber o prêmio. E é especialmente útil quando você tem um braço engessado, por exemplo, e precisa coçá-lo.

Referência: “Itch Relief by Mirror Scratching. A Psychophysical Study,” Christoph Helmchen, Carina Palzer, Thomas F. Münte, Silke Anders, Andreas Sprenger, PLoS ONE, vol. 8, no 12, December 26, 2013, e82756.

6) Psicologia
Laureados: Evelyne Debey, Maarten De Schryver, Gordon Logan, Kristina Suchotzki e Bruno Verschuere (Bélgica, Holanda, Alemanha, Canadá e EUA)
Por questionar 1000 mentirosos de várias idades sobre a frequência com que eles mentem e por decidir acreditar nas respostas recebidas. Todo o grupo compareceu ao evento (mentira, foi só o Bruno Verschuere mesmo).

Referência: “From Junior to Senior Pinocchio: A Cross-Sectional Lifespan Investigation of Deception,” Evelyne Debey, Maarten De Schryver, Gordon D. Logan, Kristina Suchotzki, and Bruno Verschuere, Acta Psychologica, vol. 160, 2015, pp. 58-68.

7) Paz
Laureados: Gordon Pennycook, James Allan Cheyne, Nathaniel Barr, Derek Koehler e Jonathan Fugelsang (Canadá e EUA)
Por um estudo intitulado “On the Reception and Detection of Pseudo-Profound Bullshit” [Sobre a recepção e detecção de merdas pseudo-profundas], publicado em novembro passado no jornal Judgement and Decision Making. Pennycook, Barr, Koehler e Fugelsang foram detectados na recepção do prêmio.

8) Biologia
Laureados: Charles Foster e Thomas Thwaites (Reino Unido)
Os dois laureados dividiram o prêmio por motivos distintos, mas parecidos. Foster por ter vivido como uma besta de maneira selvagem como um texugo, um veado (o animal, não o  gênero), uma lontra, uma raposa e um pássaro (1). Twaithes foi agraciado pela “criação de próteses de extensão de seus membros que permitiram-lhe mover-se à maneira de cabras e passar tempo com elas nas montanhas” (2) e compareceu à caráter para receber seu IgNobel.

Referências: (1) Being a Beast, by Charles Foster, Profile Books, 2016, ISBN 978-1781255346. (2) GoatMan; How I Took a Holiday from Being Human, Thomas Thwaites, Princeton Architectural Press, 2016, ISBN 978-1616894054.

9) Literatura
Laureado: Fredrik Sjöberg
Por ter escrito uma autobiografia de três volumes centrada nos prazeres de coletar moscas vivas e mortas numa ilha sueca semi-deserta. Sjöberg foi um dos mais entusiasmados recepientes do IgNobel. Depois de passar 15 anos escrevendo uma obra que ninguém leu, o cientista sueco considera o prêmio o auge de sua carreira.

Referência: The Fly Trap, primeiro volume da trilogia autobiográfica En Flugsamlares Vag (The Path of a Fly Collector), já vertido para o inglês. Pantheon Books, 2015, ISBN 978-1101870150.

10) Percepção
Laureados: Atsuki Higashiyama e Kohei Adachi (Japão)
Por investigar se as coisas parecem diferentes em termos de distância e tamanho quando você se curva e mete a cabeça entre as pernas. Higashiyama foi buscar o prêmio.

Referência: “Perceived size and Perceived Distance of Targets Viewed From Between the Legs: Evidence for Proprioceptive Theory,” Atsuki Higashiyama and Kohei Adachi, Vision Research, vol. 46, no. 23, November 2006, pp. 3961–76.

Em todas as categorias, os agraciados receberam o mesmo prêmio: um relógio bem grande e 10 trilhões de dólares (dólares zimbabuanos, que não valem quase nada). O vídeo do evento, que foi transmitido ao vivo pela internet, pode ser conferido na íntegra a seguir:

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