Quebrando o tabu de Rayleigh

John_William_Strutt

Ninguém percebeu mas a Segunda Guerra Óptica acabou de terminar. Quatro laboratórios lutavam para ver quem iria derrubar um limite que é o equivalente óptico da barreira do som.

Quando você registra uma imagem, cada ponto do objeto deveria corresponder a um ponto na fotografia. Isso seria o ideal, mas não é o que acontece. Uma maneira simples de aumentar a qualidade do registro é colocar mais pontos em cada imagem — é o aumento da resolução.

Tradicionalmente, têm sido usadas técnicas como mecanismos com abertura maior ou iluminação com comprimentos de ondas menores. Em sistemas digitais, pode-se aumentar o número de pixels por imagem. Essa abordagem, porém, só funciona até certo ponto, conhecido como Limite de Rayleigh.

O problema deve-se à natureza ondulatória da luz, que leva à difração, especialmente nas bordas da imagem. O resultado é que — independente da gravação ser analógica ou digital — a imagem de um ponto estará mais para um borrão. Esse fenômeno ocorre em qualquer sistema dependente da luz visível, de telescópios a microscópios.

Definido no início do séc. XX por John William Strutt, 3º. Barão de Rayleigh [1842-1919], o Limite de Resolução é a distância mínima que pode ser distinguida com o uso de luz visível: cerca de 0,1 micrômetro. Para efeito de comparação, uma bactéria tem 2 micrômetros de comprimentos. A partir daqui não adianta tentar colocar mais pixels por imagem, pois o resultado sempre ficaria borrado. No entanto, o Limite de Rayleigh poderia ser superável, como um análogo visual da barreira do som. E não faltaram físicos querendo bater essa barreira.

Ao redor do mundo, quatro grupos de pesquisa lutavam com aparelhos ópticos para ver quem encontraria a imagem mais precisa já registrada. O objetivo era fazer uma imagem de dois pontos separados por uma distância menor que o Limite de Rayleigh. Quem conseguiu o feito foi o time de cientistas da Universidade Complutense de Madri (Espanha) e da Universidade Palacký (Rep. Tcheca).

Não parece, mas essa imagem pixelada é das mais precisas já registradas: os dois pontos estão situados na distância-limite de Rayleigh. [Imagem: Martin Paúr/Universidade Palacký]

Sob liderança de Luis Sánchez Soto, professor de física da Complutense, os cientistas conseguiram registrar imagens que quebraram o tabu de Lord Rayleigh por uma larga margem: os pontos situavam-se a uma distância até 17 vezes menor que o limite de resolução.

Para conseguir esse feito, os pesquisadores construíram um aparelho de holografia digital baseado em algo conhecido como limite quântico inferior de Cramér-Rao (qCLRB, na sigla em inglês). O qCLRB é uma ferramenta estatística que pode ser aplicada ao processamento de imagens.

Os resultados, que foram publicados na revista Optica, indicam que o Limite de Rayleigh não é imbatível pois pode ser superado com uma boa estratégia de detecção. Em vez de se basear na intensidade da luz, Sáchez Soto e seus colegas propõem um sistema que “otimiza a informação obtível e pode superar o Limite de Rayleigh.” Além de reescrever os livros didáticos de física, a descoberta pode permitir que o aumento da resolução continue, especialmente em telescópios e microscópios.

Referência

rb2_large_gray25Martin Paúr et al, Achieving the ultimate optical resolution [Alcançando a resolução óptica definitiva], Optica, vol. 3, n.10, pp. 1144-1147. DOI: 10.1364/OPTICA.3.001144

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