Juliana Di Beo
Com maestria a diretora de cinema Greta Gerwig realizou um feito sem precedentes: fez o filme Barbie (2023) se tornar o primeiro blockbuster feminino, e o live-action de maior bilheteria do ano. Além da repercussão no mercado cinematográfico, o filme pode ter contribuído para a Mattel faturar cerca de US$ 125 milhões em brinquedos.
A partir do filme é natural lembrar da Barbie de nossa infância, há 20 ou 30 anos. Diferente de muitas pessoas, nem sempre elas seguem guardadas como recordação. Boa parte delas, infelizmente, pode ter tido um fim trágico: se tornado mais um plástico em um aterro sanitário, que vai levar mais de 500 anos para se decompor.
A empresa estima que milhares de barbies foram vendidas após a estreia do filme, que somam mais de um bilhão de bonecas desde seu lançamento em 1959. E foram necessários 60 anos para que a Mattel, uma das três maiores empresas de brinquedos do mundo, iniciasse um programa de reciclagem e sustentabilidade desse enorme volume de plástico que produz.
A empresa, que há pelo menos 78 anos contribui com a indústria perversa do plástico e também com o desmatamento de florestas tropicais na Indonésia para produzir as caixas de exposição das bonecas, inaugurou sua primeira ação sustentável no começo de 2021, com o lançamento da Mattel Playback. Nesse programa, os consumidores enviam produtos da Barbie, Fisher-Price, Matchbox ou MEGA toys para a empresa, que reutiliza esse plástico para confeccionar novos brinquedos. Esse programa é restrito a quatro países – Estados Unidos, Canadá, Alemanha e Reino Unido – ou seja, apenas 2,66% de seu mercado formado por 150 países. Apesar de estar longe do ideal, é uma iniciativa que poderia ser ampliada.
A ação foi o início de outras que – esperamos – se multipliquem daqui pra frente. Ainda em 2021, a empresa lançou a coleção “Barbie Loves the Ocean”, contendo três barbies feitas com plástico reciclado retirados do oceano. A iniciativa contou com a parceria da empresa recicladora de plásticos Envision Plastics e o lixo plástico coletado vem da península mexicana de Baja, região que realiza ações para mitigar a poluição plástica.
Em julho de 2022, a empresa estabeleceu uma parceria com o Instituto Jane Goodall – a primatologista estadunidense reconhecida pelo seu trabalho com gorilas – com o lançamento de uma linha de bonecas relacionadas a profissões sustentáveis, que conta com uma boneca inspirada na cientista e uma equipe de carreira ecológica (que inclui diretora de sustentabilidade, engenheira de energia renovável, cientista de conservação e ativista ambiental). Todas as bonecas foram produzidas com plástico reciclado coletado do oceano, e receberam o selo de Carbono Neutro certificado pelo Climate Impact Partners.
Essas coleções certificadas foram anunciadas com o propósito de atingir, até 2030, a produção com 100% de materiais reutilizáveis, recicláveis ou de origem biológica. A empresa pretende também reduzir 25% do plástico de suas embalagens.
A vida com menos plástico está longe de ser alcançada. Um estudo publicado na revista Plos One em março de 2023, estimou que há cerca de mais de 170 trilhões de partículas de plástico no oceano, o que somaria 2,3 milhões de toneladas de plástico. Apesar, daquela Barbie de nossa infância representar uma porcentagem ínfima de resíduo comparada a essa quantidade gigantesca, ela é parte do problema, que só cresce. Por isso, torcemos para que todos façamos um mea culpa sobre o consumismo do plástico, para que as milhões de Barbies encontrem um fim mais nobre e longe dos oceanos.
BLUM, B (2023) ‘Barbie’ se aproveita da ironia para vender um feminismo plastificado. Folha de S. Paulo.
ETX Daily (2023) #TECH: Não há como escapar da pegada de carbono da Barbie New Straits Time.
ERIKSEN M, COWGER W, ERDLE LM, COFFIN S, VILLARRUBIA-GÓMEZ P, MOORE CJ, et al (2023) A growing plastic smog, now estimated to be over 170 trillion plastic particles afloat in the world’s oceans—Urgent solutions required PLoS ONE 18(3).
KALADEMIR, D (2023) A maioria dos materiais é reciclável, então por que os brinquedos de crianças não podem ser sustentáveis? Yale Environment Review.
DOCKTERMAN, E, LANG, C (2023) How Barbie Took Over the World, Time
CRESCI E PERDI Cresci e Perdi Unidades
FICOU PEQUENO Desapegos para bebês e crianças com precinho de brechó infantil
TERRACYCLE Programa de Reciclagem de Brinquedos Hasbro
Juliana Di Beo é bióloga pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Integra a Rede Ressoa Oceano, na qual atua com divulgação científica para fortalecer a cultura oceânica
Como citar:
Di Beo, Juliana. (2023). Depois de 70 anos no mercado, Mattel inicia reciclagem de brinquedos. Revista Blogs Unicamp, V9, N2 Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/revista/2023/11/29/depois-de-70-anos-no-mercado-mattel-inicia-reciclagem-de-brinquedos/ Acesso em dd/mm/aaaa.
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