Caminho da Bioeconomia no Brasil

Alguma vez na sua vida você já se perguntou se realmente o que você tem feito faz algum sentido? Se poderá ser aplicado para algo ou se fará bem a alguém?

Confesso que por muito tempo eu me perguntei isso no decorrer da minha carreira, primeiro durante a minha iniciação científica, depois durante meu estágio obrigatório, e finalmente no meu doutorado. Mas se questionar sobre isso simplesmente não te traz grandes respostas se você não souber onde procurar.

Felizmente, uma pesquisa publicada na Revista Brasileira de Inovação veio me trazer algumas perspectivas positivas sobre o que tenho feito, e recentemente, esse trabalho também foi utilizado de base para o evento Fronteiras tecnológicas da bioenergia e desafios da inovação no Brasil.

Explicando resumidamente o artigo, os autores utilizaram conteúdo de patentes e artigos científicos para identificar quais as tecnologias associadas a bioenergia aparentavam ser mais promissoras no cenário atual, e inferir, dessa forma, o rumo que a BIOECONOMIA vem seguindo. Nesse trabalho foram citados dois tópicos de grande interesse: biocombustíveis (biodiesel, etanol, etc.) e biomassa (focando em milho e cana-de-açúcar), identificando também um aumento na rede de colaborações com o Brasil que encontra-se em destaque quando o assunto é cana-de-açúcar para produção de etanol. Além disso o trabalho também apontou duas áreas que têm recebido atenção especial nos últimos anos, algas para produção de biocombustível e biogás.

Nessa contextualização o evento veio para complementar a discussão apresentada no artigo com a presença de quatro convidados: Prof. Dr. Gonçalo G. A. Pereira (UNICAMP), Profª. Drª. Bruna de Souza Moraes (Pesquisadora do NIPE), Dr. Leonardo Brantes Bacellar Mendes (CENPES/Petrobrás) e Alessandro Gardemann (Presidente da ABiogás).

A mesa redonda teve início com a apresentação do pesquisador Leonardo Mendes, que desenvolve uma pesquisa super aplicada: geração de biomassa para produção de biocombustíveis, utilizando para isso uma “plantação” de algas. Foram apresentadas algumas grandes vantagens de utilizar cultivo de algas, e entre elas podemos citar a velocidade de crescimento, a quantidade de biomassa gerada em um m² e principalmente o fato de poder ser produzida em regiões impróprias para agricultura. Porém, ainda não é tão acessível economicamente quanto uma plantação de cana-de-açúcar (por exemplo), e o cuidado que se deve ter com o cultivo para que o composto de interesse seja produzido em alta qualidade é alta. Mas ainda assim, o pesquisador afirmou que só o fato de não ser preciso deslocar florestas nem áreas agrícolas para o cultivo já justifica o projeto.

A segunda a expôr sua opinião foi a pesquisadora Bruna Moraes, que iniciou sua carreira com tratamento de resíduos, e nesse contexto um projeto de biogás surgia apenas como um tratamento anaeróbico, utilizado em seu pós-doc para tratar a vinhaça residual durante a produção do bioetanol. Durante sua apresentação, ela deixou clara o cuidado com a composição da matéria-prima, que pode impactar na composição da vinhaça, e consequentemente, na dificuldade para o cultivo dos microorganismos produtores de biogás. Além disso, ela trouxe a necessidade da pesquisa em bancada ser realizada com um foco industrial, com o olhar o que o mercado busca, para que assim “esse setor da bioenergia consiga ter uma abrangência maior”.

Seguindo nesse tema, foi a vez do Alessandro Gadermann, com sua visão empresarial, mostrar um pouco do outro lado. E pra começar ele disse que “por mais legal que seja o conceito, se não for economicamente viável, ninguém vai fazer”, e que o mercado do biogás busca nesse momento a aplicação, a construção de plantas piloto para descobrir o próximo gargalo para, então, retornar à pesquisa básica para busca de soluções. E ele, também, mostrou a grande necessidade de aplicar todo o conhecimento que já adquirimos até agora, de agir.

E por último, o professor Gonçalo Pereira fez uma apresentação breve sobre o problema energético no mundo apresentando algumas soluções encontradas na pesquisa. A primeira apresentada, o Etanol, composto produzido em poucas horas por uma levedura e que pode substituir alguns do compostos retirados do petróleo (e que demoraram milhões de anos para serem formados). Além disso ele apresentou a Cana energia como potencial para aumento de produtividade de etanol de segunda-geração e o Carro elétrico, que utiliza a energia armazenada em moléculas de etanol para gerar eletricidade. E assim como o Alessandro, o professor Gonçalo também ressaltou a importância de utilizar o conhecimento para atender demandas de mercado. Além disso, ele apresentou o Renovabio, uma política nacional que veio para incentivar o cumprimento das metas de descarbonização através da geração de uma nova fonte de renda para os produtores de biocombustíveis, CBIO, crédito de descarbonização que foi transformado em ativo financeiro.

E durante as discussões surgiram temas que sem dúvidas deveriam ser tratados com mais atenção, que envolve o olhar o processo como um todo, identificar como a pesquisa realizada se encaixa no cenário global, a busca por pesquisas mais aplicadas olhando pro mercado, o incentivo a inovação, e o não reinventar a roda, utilizar tudo aquilo que já foi descrito como base para construir uma nova pesquisa.

E sem dúvida seria ótimo se pudéssemos encontrar mais trabalhos e eventos que discutissem o que tem sido feito e mostrasse a opinião de diferentes atores do cenário em que nossas pesquisas estão incluídas, desenvolvendo melhor nossa liderança científica. E, para mim, esse evento foi essencial para mudar meu olhar perante meu doutorado, além de trazer uma motivação que me faltava nesse momento.

E pra você que ainda está se perguntando por que entender isso é tão importante, é só lembrar da greve dos caminhoneiros, que, em parte, aconteceu devido a uma grande dependência do petróleo em nossas vidas. E olhar pra outras fontes de produção de combustíveis e para pesquisas que possam baratear os custos de produção atual é essencial para evitar novos casos, além de melhorar nossa qualidade de vida reduzindo a poluição e cuidarmos do nosso planeta, claro!

 

Referências:

Evento Fronteiras tecnológicas da bioenergia e desafios da inovação no Brasil

Artigo: Aplicando rede de IPCs para identificar a fronteira tecnológica da bioenergia

 

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Sobre Sheila Tiemi Nagamatsu

Formada em Biotecnologia pela UFSCar, Dra. em Genética e Biologia Molecular com ênfase em Bioinformática na UNICAMP, apaixonada por desenvolvimento pessoal e, atualmente, pós-doutoranda em YALE na área de psiquiatria.

Uma resposta para Caminho da Bioeconomia no Brasil

  1. Marjorie Avelar diz:

    Posso usar algumas informações do seu artigo, citando seu nome, sua profissão e especialização em uma reportagem que estou produzindo para a Revista A Lavoura, veiculada pela Sociedade Nacional de Agricultura (www.sna.agr.br e www.sna.agr.br/publicacoes/a-lavoura).

    Estou fazendo uma matéria sobre bioeconomia. O texto deve ser veiculado em nossa edição impressa. Se for possível, por gentileza, me envie fotos suas (sem ser posadas ou selfies, de preferência no campo) e ilustrativas, se tiver, acima de 2MB para o e-mail informado aqui.

    Grata! Jornalista Marjorie Avelar

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