Patentes Patéticas (nº. 63)

Punishment wheelQuando se trata de disciplinar as crianças, os pais modernos têm um monte de dúvidas. Elas devem ou não ser punidas por seu comportamento (ou falta de)? Se sim, como deve ser a punição: física, moral, psicológica ou uma combinação de todos? O conflito com os pais é sempre problemático, criando sentimentos de vingança entre os filhos? Castigos destroem a família? Como lidar? Tentando resolver todos esses problemas, tornar o processo de punição divertido para as crianças e ainda ganhar uma grana, o casal americano Jose e Mary Jo Gonzalez inventou a Punishment Wheel [Roda dos Castigos], formada por

uma roda-base dividida em uma pluralidade de setores por linhas. Os setores circulares são ainda subdivididos pela intersecção de linhas radiais com circulos concêntricos definindo, assim, setores anulares. Uma pluralidade de decalques adesivos, prontos para se conformar aos setores anulares da roda, é fornecida ao usuário. Cada decalque traz inscrito um castigo. O usuário seleciona um jogo de decalques com os castigos de sua escolha dentre aqueles fornecidos e põe cada decalque em cada setor anular da roda. Decalques em branco também são disponibilizados para que o usuário possa escrever os castigos de sua própria escolha. Montada rotavelmente sobre a roda-base, há uma roda seletora com um apontador anexo para selecionar o castigo. Quando a roda seletora pára, impõe-se o castigo conforme indicação do apontador.

Já até vejo um slogan: “Decalques anti-recalque!”. Falando sério, esse é o sumário da patente 4.834.657, aprovada em 30 de maio de 1989. Aparentemente, a Roda da Infortuna do casal Gonzalez deve ter surpreendido o escritório de patentes americano pela inusitada originalidade. Apesar das referências a patentes sobre rodas das fortunas em jogos, indica-se que “não há nenhuma aplicação relatada no United States Patent and Trademark Office” e que “não há pesquisa com financiamento federal(!) envolvida.” Seria no mínimo bizarro ter pesquisa federal nessa área.

Nativos de Olympia, Washington, os Gonzalez justificam-se:

A invenção relaciona-se ao campo de aparelhos para modificar o comportamento de pessoas imaturas, especialmente crianças. É nossa intensão prover um método e aparato para a prática do método, no qual a criança participará na escolha do castigo que ela vai receber por seu comportamento impróprio. Isso se realiza quando a criança gira uma roda com um indicador sobre um display com vários castigos possíveis. O castigo, assim, é indicado quando a roda repousa. Do ponto de vista da criança, parece que um objeto inanimado é quem escolhe e impõe  o castigo, em vez dos pais. Portanto, elimina-se o conflito adulto-criança.

Na patente, os inventores ainda sugerem os castigos a serem oferecidos nessa mistura de Roda a Roda com Supernanny: NO TV [SEM TV], GROUNDED [EM CASA], TIME OUT [PROIBIR A CRIANÇA DE SE ENVOLVER EM QUALQUER ATIVIDADE], K.P. [KITCHEN PATROL: PATRULHA DA COZINHA i.e., TAREFAS DOMÉSTICAS], NO DESSERT [SEM SOBREMESA], DONATE A TOY [DOE UM BRINQUEDO], NO SPORTS [SEM ESPORTES], NO FRIENDS [SEM AMIGOS] e SWATS [PANCADAS]. Opcionalmente, pode haver uma placa que dá uma segunda chance ao moleque, outra que deixa a escolha a critério do adulto ou até mesmo à criança.

No entanto, há um quê de ingenuidade infantil na ideia dos Gonzalez. Se, por exemplo, a roda indicar que a criança deve escolher o castigo, ela obviamente vai escolher o menos pior (ou talvez algo que nem seja um castigo, como ficar sem tarefa). Se a escolhar recair sobre o responsável, o conflito, que deveria ser evitado, pode ressurgir. Mesmo que nada disso aconteça, o adulto ainda poderia escolher justamente os piores castigos. Nesse caso, seria um tanto sádico usar uma ferramenta lúdica para obter uma punição severa. Além de tudo isso, não fica claro como proceder em caso de indefinição, quando o seletor pára entre dois castigos.

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