“Grandes promessas são a alma de um anúncio”

Que anúncios publicitários nem sempre sejam bem vistos pelos intelectuais mais refinados, não é novidade. Em meados do século XVIII, Dr. Johnson, o célebre escritor e lexicógrafo inglês, talvez tenha sido o primeiro estudioso a debruçar-se sobre o assunto e questionar os poderes da publicidade num pequeno ensaio. Esse ensaio foi publicado num número de 1759 do Idler [Ocioso] e reproduzido por Sampson em sua History of Advertising (1874). A seguir, traduzimos os trechos mais interessantes e pertinentes ao nosso século [e não resistimos a inserir uns complementos e pitacos entre os colchetes]:

O que quer que seja comum é desprezado. Anúncios são tão numerosos hoje em dia que são frequentemente vistos com negligência. Portanto, é necessário ganhar a atenção pela magnificência das promessas e pela eloquência, ora sublime, ora patética. Promessas, grandes promessas, são a alma de um anúncio. […] Há alguns, porém, que conhecem a predisposição humana a favor de uma sinceridade honesta. Um vendedor de fluidos embelezadores vende uma loção que repele rugas, limpa sardas, alisa a pele e revigora a carne; e mesmo assim, com verdadeiro horror à ostentação, confessa que ela [a loção] não vai restaurar o frescor dos quinze [anos] numa senhora de cinquenta. […] Tem sido afirmado pelos mais severos juízes que o arrependimento salutar de cenas trágicas é facilmente apagado pela felicidade do epílogo. As mesmas inconveniências surgem da disposição imprópria de anúncios. O mais nobre dos objetos pode ser associado de modo tal a se tornar ridículo. Os próprios camelos e dromedários podem perder muito de sua dignidade entre a “verdadeira flor de mostarda” e “o original Daffy’s Elixir.” [e mais ainda em maços de cigarro!]. Não pude deixar de sentir alguma indignação quando encontrei um ilustre guerreiro indígena [norte-americano] imediatamente sucedido de um “pedaço fresco de manteiga Dublin”. O negócio da publicidade está agora tão próximo da perfeição que não fácil propor qualquer aperfeiçoamento. Mas toda arte deve ser exercida com a devida subordinação ao bem público. Assim, não posso deixar de propor uma questão aos senhores do ouvido público: será que às vezes eles não brincam demais com nossas paixões? Como quando a casa lotérica nos convida a comprar bilhetes por um relato dos prêmios que vendeu no ano passado. E será que os controversistas publicitários não se indulgem demais à linguagem áspera sem qualquer provocação que a cause? Como na disputa sobre amoladores para lâminas, agora felizmente pacificada, e na altercação que presentemente subsiste no que concerne ao Eau de Luce. Num anúncio permite-se que cada um fale bem de si mesmo, mas não sei porque supomos que ele possa assumir o privilégio de censurar seu próximo. Ele pode proclamar sua própria virtude ou habilidade, mas não deve excluir os outros da mesma pretensão. Cada homem que anuncia sua própria excelência deveria escrever com alguma consciência de um personagem que ousa chamar a atenção do público. Ele devia se lembrar que seu nome estará no mesmo papel daquele do Rei da Prússia e Imperador da Alemanha, e fazer-se por merecer tal associação. Similarmente, alguma consideração deve ser dada à posteridade. Há homens de diligência e curiosidade [talvez como eu e você, caro leitor], que entesouram os jornais do dia [i.e, daquela época ou mesmo da nossa em alguns casos] meramente porque os outros os negligenciam e, com o tempo eles [os jornais] serão escassos. Quando estas coleções forem lidas em outro século [como o XXI ou o XXXV], como tamanhas contradições serão reconciliadas? Como a fama será possivelmente distribuida entre os alfaiates e modistas da presente época?

Referência

SAMPSON, Henry. A History of Advertising from the Earliest Times, Illlustrated by Anecdotes, Curious Specimens and Biographical Notes [Uma História dos Anúncios desde os Tempos mais Antigos, Ilustrada por Anedotas, Espécimes Curiosos e Notas Biográficas]. Londres: Chatto & Windus, 1874.
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