As terríveis revelações de Maria Monk

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[Traduzido de Awful Disclosures, publicado pelo Dr. Romeo Vitelli em Providentia]

Foi em 1836 que se publicou em Nova York um livro que parecia uma bomba de efeito moral. Em The Awful Disclosures of Maria Monk or The Hidden Secrets of a Nun’s Life in a Convent Exposed [As terríveis revelações de Maria Monk ou Os segredos ocultos da vida de um convento de freiras expostos] uma suposta ex-monja apresentava descrições lúgubres de sua vida num convento de Montreal e da exploração sexual à qual foi submetida naquele lugar.

Segundo o livro, Maria Monk e outras freiras das Irmãs da Caridade do Hotel-Dieu (também chamadas de “Irmãs Negras”) sofriam constantes abusos sexuais por parte de padres de um seminário vizinho. Por meio de um túnel secreto que ligava o seminário ao convento, os padres entravam nas celas para transar com as freiras quase todos os dias. As irmãs que resistissem aos avanços sexuais dos padres seriam assassinadas. Maria afirmava ter passado sete anos no convento antes de ter sido engravidada por um padre. Temendo pela vida da criança, ela fugiu do Canadá para os Estados Unidos, onde deu à luz.

MMonk

O timing para publicar e vender um livro desse gênero era perfeito. Devido ao crescente fluxo de imigrantes irlandeses, havia um considerável anti-catolicismo nos EUA daquela época, um período no qual rumores sobre o clero católico e seus vícios se espalhavam rapidamente. Dois anos antes do livro de Monk sair, outra obra do tipo, igualmente repleta de alegações de conversões forçadas e abusos, havia sido publicada pela ex-freira Rebecca Reed. Diante de rumores de que uma freira estava sendo mantida contra a sua vontade, um convento em Massachussetts chegou a ser incendiado por uma turba de protestantes.

O livro de Monk jogou mais lenha nessa fogueira, gerando uma tremenda pressão dos protestantes de Nova York e Montreal pela investigação do convento. O Bispo de Montreal abriu um inquérito, que foi logo arquivado por falta de provas e que acabou visto como um abafamento do caso. Uma investigação de fôlego foi lançada pelo jornalista nova-iorquino William Leete Stone [1792-1844]. Acompanhado de outros protestantes, Stone foi até o convento canadense apenas para descobrir que não havia nenhum túnel secreto e muito menos uma ex-freira chamada Maria Monk.

Essa investigação resultou num dilúvio de argumentos e contra-argumentos. Os apoiadores de Maria acusaram a Igreja de ter destruído todas as evidências que confirmariam a história. Os críticos (em número cada vez maior) usaram as inconsistências do caso para desacreditá-la. Mais tarde, muitos diriam que Maria era insana. A mãe dela afirmaria que Maria sofreu um dano cerebral aos sete anos após “jogar uma caixa de lápis na cabeça dela”. Maria Monk não só não havia sido freira como sequer era católica e tinha um histórico de contar delirantes relatos de abuso a qualquer um disposto a ouvir.

Há indícios de que, durante sua suposta passagem pelo convento, Maria esteve encarcerada num asilo madaleno após ser detida por prostituição. Ela foi tirada dali por um guardião legal, William Hoyt, que acabou se tornando seu amante e foi o responsável pela impressão do livro (além de embolsar o lucro das vendas). Maria pouco contribuiu para a obra, que teria sido feita por um editor/escritor-fantasma. Apesar das polêmicas (ou talvez por causa delas), Maria publicou uma sequência intitulada Further Disclosures [Revelações Adicionais], que vendeu relativamente bem. A essa altura, Monk havia se separado de Hoyt e foi viver com outro guardião, que acabou abandonando-a pouco depois de embolsar seus direitos autorais.Maria-Monk

Depois do nascimento de um segundo filho ilegítimo em 1838, os poucos apoiadores de Maria abandonaram-na e ela viveu seus últimos anos em meio à miséria e ao alcoolismo. Após ser detida por furtar a carteira de um homem com quem estava morando, Maria Monk faleceu numa prisão nova-iorquina em 1849. Apesar de seu triste fim, seu livro foi reimpresso diversas vezes, sendo citado como verdadeiro por muitas fontes anti-católicas até hoje.

Embora os relatos de abusos no convento sejam fantasiosos, talvez um caso de pseudologia fatastica, Maria tinha motivos bem reais para se apresentar como vítima: ela foi claramente explorada por seus companheiros e descartada por ambos quando já não era mais útil aos seus interesses.

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  • Mayara Xavier

    Uau! História interessantíssima! Estudei a vida toda em colégio católico e existia o boato (muito enraizado por sinal) de que existia um túnel que ligava o colégio ao seminário, por onde os padres atravessariam quase todos os dias para terem relações sexuais com as freiras. Adorei saber de onde veio essa estória, mas admito que fiquei interessada em ler o livro. Parabéns pelo trabalho!

    • Zênia de León

      zenia_deleon@yahoo.com.br
      Tenho o livro-Igreja dos tempos bárbaros. Inquisição, ameaças com inferno, perseguições, tudo isso,pelo que dizem os arquivos, exisitiu mesmo, lamentavelmente na Igreja fundada por Cristo. Os humanso daquele tempo, dos tempos bárbaros da igreja, eram cruéis sob o manto sagrado do cristianismo. Depois das acusaçoes de Martin Lutero, a coisa vem mudando e hoje a Igreja Católica preocupa-se com os excluidos, famintos, sem teto, e não existem mais conventos e mosteiros com aqueleas práticas terríveis narradas dos antigos. Papa Francisco pune os pedófilos e a Igreja não teme acusações mesmo que outras religiões usem os fatos do passado para tentar denegri-la.

  • Silva.Nadir

    Como devemos desconfiar de tudo, não acredito que as freiras dentro de um convento, seja qual for o país, gozem dos direitos humanos que deveriam ser a todas elas garantidos e também aos padres, monges etc. Onde tem fumaça ....
    tem fogo....

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