No último mês do ano sempre sobra bastante tempo para assistir filmes e séries de documentários. Se você não teve tanto tempo disponível em dezembro mas vai ter férias em janeiro, eis as minhas recomendações:
Beyond Bollywood (54 min., 2013) — Todo dia, milhares de indianos chegam a Bombaim e muitos estão atrás de um sonho: trabalhar num dos 1100 filmes que Bollywood produz a cada ano. Neste documentário, Adam Dow e Ruchika Muchhala retratam os bastidores da indústria cinematográfica mais prolífica do mundo. Conhecemos gente como Pooja, moça do interior aspirante a dançarina; Harry, australiano ambicioso com a própria carreira; Premji, ex-garçom que virou gerente de produção e sindicalista e Ojia, a trans que faz cabelo e maquiagem dos filmes.
Sour Grapes (85 min., 2016) — Ele era um jovem asiático carismático; se infiltrou num grupo influente de colecionadores de vinho, começou a participar de leilões com lances cada vez mais altos e transformou uma loja de vinhos em casa leilões para vender suas garrafas. Quem é Rudy Kirnawan? De onde vêm seus vinhos e seu dinheiro? Como ele vende uma garrafa de 1929 de uma vinha que só começou a produzir em 1934? Quem responde essas perguntas são o vinhateiro francês Laurent Ponsot, que descobriu que seus vinhos estavam sendo falsificados, o colecionador americano Bill Koch, que após pagar 4 milhões de dólares percebeu ter 400 garrafas falsas em sua adega e uma equipe de especialistas, jornalistas e ex-investigadores do FBI.
First Contact: Lost Tribe of the Amazon (49 min., 2016) — Fome, doenças, invasores alienígenas. Quem não fugiria diante dessas ameaças? É isso o que está acontecendo com as últimas tribos indígenas na fronteira do Brasil com o Peru. Neste documentário sobre o primeiro contato de nativos que se mantiveram isolados desde que chegaram à América, acompanhamos duas reações distintas das populações ribeirinhas e dos governos brasileiro e peruano. No lado de cá da fronteira, o processo é controlado por funcionários da FUNAI, como o antropólogo Carlos Meirelles. Na Amazônia peruana, a situação é mais tensa pela falta de um trabalho antropológico e pela própria legislação local, que simplesmente proíbe qualquer tipo de contato.
Resistance (71 min., 2014) — Quando se fala em resistência bacteriana, fala-se muito nos números e nos micróbios e pouco nas pessoas. Pessoas como o menino que contraiu pneumonia e acabou em coma; o senhor que foi infectado por uma bactéria resistente enquanto surfava e perdeu o movimento das pernas; o médico que perdeu uma paciente para um microorganismo resistente e a mãe que, literalmente de um dia pro outro, perdeu o bebê de 1 ano e meio para uma superbactéria. Esse documentário dá voz a essas pessoas e também ouve médicos, cientistas, agentes reguladores, produtores rurais e jornalistas sobre os abusos dos antibióticos em três esferas: na vida cotidiana (com os sabonetes bactericidas, por exemplo), na medicina (com a banalização da prescrição de antibióticos para quase qualquer coisa) e na pecuária (com o uso de antibióticos como aditivos em rações). Diante de um problema que cresce cada vez mais, são apresentadas duas formas de reagir: a europeia, que reforça regulações, compartilhamento de dados e banimento de usos indevidos; e a americana, onde questões políticas e econômicas criam uma resistência às medidas reguladoras tão assustadora quanto uma epidemia descontrolada.
Hip-Hop Evolution (2016) — Em quatro episódios (cerca de 48 min. cada), o MC Shad Kabango nos apresenta, por meio de entrevistas e raras imagens de arquivo, a história desse movimento que reúne break-dance, mixagem, rap e grafitti, das primeiras festas no Bronx em chamas dos anos 1970 ao gangsta rap da virada do século. No primeiro episódio, os anos 70 e as origens do hip-hop com a trindade desse ritmo: DJ Kool Herc, Afrika Bambaataa e Grandmaster Flash. No segundo, os anos 80, a descida do hip-hop das periferias para o centro de NY e o surpreendente empurrão dado por outro movimento periférico nascente, o punk. Infelizmente ainda não tive tempo de ver os demais episódios, mas creio que valem a pena.
Chasing Ice (75 min., 2012) — Nos anos 1980, ele abandonou a geologia para fotografar a natureza. Inicialmente cético em relação às mudanças climáticas, James Balog viu o impacto colossal do aquecimento global quando passou a fotografar as paisagens mais frágeis diante desse fenômeno: as geleiras. Autor de uma das fotos de capa mais famosas da National Geographic dos últimos anos, Balog se deu conta de que, como ele, muitas pessoas precisavam ver evidências palpáveis como uma imagem fotográfica. Para isso, Balog buscou uma equipe de engenheiros e cientistas para registrar, em time-lapse, dois anos de mudanças em geleiras da Groenlândia, Islândia, Alasca e Montana. Este documentário mostra dos desafios logísticos, tecnológicos e até mesmo físicos (o fotógrafo teve várias lesões nos joelhos) por trás dessa empreitada. O resultado, de tirar o fôlego, é ao mesmo tempo maravilhoso e assustador — e absolutamente inquestionável.
Rolling Papers (79 min., 2016) — “É a primeira vez que faço entrevista com um Oopa-Loompa”, diz um repórter todo certinho numa enfumaçada praça de Denver em 20 de abril de 2014. A cena, cômica e insólita, está neste documentário que acompanha o primeiro ano da legalização da maconha no Colorado e o trabalho de Ricardo Baca, primeiro editor de um grande jornal americano especializado em erva. No The Denver Post, Baca e seus colaboradores criaram um site dedicado ao tema — The Cannabist — e fazem matérias para o jornal impresso contando histórias como a das mães com filhos que precisam de CBD, usuários que reclamam de uma fabricante de alimentos com maconha, os eventos ligados à chapação e os conflitos entre a legislação local e federal. Durante a produção do documentário, o Uruguai também legalizou a ganja e Baca foi ver como as coisas andam por lá. Em ambos os casos, o clima ainda é de incerteza, mas uma pergunta sempre se repete com os entrevistados: “Você está chapado agora?”. Com participação especial de Whoopi Goldberg, este documentário é imperdível para quem quiser conhecer não só a situação do Colorado mas também os bastidores de um bom trabalho jornalístico.
Twinsters (88 min., 2015) — Estudante de moda em Londres, coreana adotada por franceses, Anaïs Bordier nunca havia estado num vídeo do Youtube. Então quem era aquela menina idêntica a ela num vídeo engraçado encontrado por um amigo? O nome dela é Samantha Futerman, atriz de origem coreana adotada por americanos. Quando apareceram mensagens de Londres buscando fazer contato Sam ignorou pois não conhecia ninguém lá. Mas peraí, isso aqui não é uma resenha de ficção, certo? Exatamente, por mais incrível que pareça, Anaïs e Sam se conheceram pela internet (pop), se reconheceram de imediato (pop) e quiseram se encontrar tão logo quanto possível (pop). Mas será que eram realmente irmãs gêmeas? Se sim, como elas foram parar em lugares tão diferentes? O que aconteceu com a mãe delas? Neste documentário divertido, fofo e muito tocante, acompanhamos em registros feitos pelos amigos e pelas famílias a jornada de (re)encontro dessas duas irmãs separadas logo após o nascimento e a desafiadora busca para compreender seu passado. Juntas, elas descobrem que família, afinal, é o que você quiser que seja.
(Dis)Honesty: the truth about lies (89 min., 2015) — Em tempos de pós-verdade, não faltam desculpas para mentir: é algo que todo mundo faz, que pode ter boas intenções e que aparentemente não vai prejudicar ninguém. Neste documentário, o cientista comportamental Dan Ariely e seus colaboradores apresentam diversos estudos que fizeram sobre o comportamento desonesto. Entre as perguntas: quem é mais desonesto: homem ou mulher? banqueiros ou políticos? ser religioso faz diferença? Os resultados de Ariely et. al. são ilustrados por casos da vida real, com mentiras de todos os tamanhos: do jornalista que inventava histórias quando criança e da mãe que forjou documentos para matricular os filhos numa escola melhor ao gerente de uma empresa de telecom condendado por fraude contábil e os operadores do mercado financeiro que passaram anos ganhando dinheiro com informações privilegiadas. No fim, os mentirosos entrevistados contam o que mudou depois que foram pegos com a boca na botija e Ariely e outros cientistas propõem pequenas mudanças de comportamento que podem nos levar a um mundo mais honesto.
Visita ao inferno (107 min., 2016) — Neste documentário exclusivo do Netflix, o diretor Werner Herzog acompanha o vulcanólogo britânico Clive Oppenheimer numa jornada para retratar não apenas alguns dos mais incríveis vulcões do mundo, mas a sua relação com as pessoas que vivem e trabalham em volta deles. Gente como o chefe tribal de uma ilha de Vanuatu, cuja tribo reverencia o vulcão como morada dos mortos e a modesta geóloga que faz o monitoramento do vulcão Merapi, na Indonésia. O entusiasmado arqueólogo americano que encontra fósseis humanos numa área vulcânica da Etiópia. A cidade soterrada nos anos 1970 por uma espetacular erupção ma Islândia. Uma incomum colaboração de cientistas norte-coreanos e britânicos no Monte Paektu, há milênios considerado berço da Coreia do Norte e um dos palcos da revolução comunista. Mais surpreendente é a esquisita mitologia dos habitantes de outra ilha de Vanuatu, que adoram um deus chamado John Frum.
For the Love of Spock (111 min., 2016) — Mesmo quem nunca viu Jornada nas Estrelas conhece aquele cara de orelhas pontudas, sobrancelhas altas, que tem uma saudação com os dedos em V e uma personalidade extremamente lógica. Este documentário seria um retrato de Mr. Spock, o mestiço de vulcano e humano que era o cientista da Enterprise e inspirou gerações de fãs, mas a vida não foi tão lógica quanto o personagem. Quando Leonard Nimoy faleceu durante as filmagens, seu filho, Adam Nimoy, diretor deste documentário, mudou o enfoque do filme. Mais que uma homenagem ao personagem que todo mundo conhece, tornou-se uma janela qual se apresentam os lados menos conhecidos do homem por trás de Spock: seus bicos no começo da carreira, seus hábitos dentro e fora das telas, seus relacionamentos familiares e o Nimoy cantor, fotógrafo e piloto de monomotor. Com entrevistas com o próprio Nimoy, seu filho, colegas e personalidades como William Shatner, George Takei, Jim Parsons, Mayim Bialik, J. J. Abrams, Zachary Quinto, Bobak Ferdowski e Neil deGrasse Tyson, este documentário merece a classificação de “Fascinante”, como diria Spock.
Highway thru Hell (2010) — Pode-se questionar o que algo que o próprio Netflix classifica como reality show faz numa lista de documentários, mas calma. Em dez episódios de aproximadamente 45 minutos, acompanhamos uma rotina que é bastante exótica para nós: a de uma empresa de resgate e reboque numa das estradas isoladas do Canadá, descrita como o “triângulo das Bermudas dos acidentes de caminhões” durante o inverno. Esses caras dirigem os mais diversos tipos de caminhões reboque e precisam de uma mistura de exatas (Física) e humanas (lidar com pessoas em situações de risco) para trabalhar. Em meio a avalanches e acidentes fatais, conhecemos personalidades diversas por trás desses serviços: Jamie Davis, o chefe que tenta manter a empresa em ordem e busca convencer o vaidoso filho mais velho, Brandon, a seguir com o negócio da família; Adam Gazola, o motorista que geralmente salva o dia; Kevin Ritchie, o cara com ar de roqueiro que está sempre fumando e às vezes esquenta a cabeça; Robert, o rebocador mais velho, turrão, que detesta as câmeras e sempre quer fazer as coisas à moda antiga; Narayan Samy, o faz-tudo de origem polinésia e Al Quiring, o rival de Jamie.
Robson
Coloquei a maioria na minha lista. Obrigado!!!
O que andei vendo no Netflix em outubro | hypercubic
[…] branca e repleta de esqueletos? Dirigido e produzido por Jeff Orlowski (de Chasing Ice, que recomendamos há quase um ano), este documentário exclusivo da Netflix busca mostrar uma catástrofe desta escala que está […]