O histórico ciclo do agente transmissor da doença de Chagas, o protozoário Trypanosoma cruzi, se tornou um clássico do ensino de biologia, estampando os livros didáticos e com presença marcante em inúmeros vestibulares. Pois este foi o primeiro e mais completo ciclo incluindo hospedeiro e vetor descrito no mundo e publicado em 1909 na centenária revista científica Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, de autoria do próprio Carlos Chagas.
O artigo, apenas no ano passado, contou com mais de 2.500 acessos no SciELO (base de dados que indexa a revista). A importância da descoberta que resultou na indicação de Chagas para o prêmio Nobel, foi também descrita em alemão, à época língua de grande impacto na comunicação científica.

Com 107 anos de publicações ininterruptas a revista do Instituto Oswaldo Cruz está longe de parar no tempo e ficar apenas na memória. Os editores tem trabalhado duro para dar mais visibilidade e melhorar a qualidade da publicação que hoje é a quarta com maior fator de impacto do país (1,789), segundo dados do Journal of Citation Reports.
Em 1997, quando a revista foi indexada no SciELO era a segunda com maior impacto internacional do país (FI=0,440), em 2006 passou a barreira de uma unidade (1,208), sendo a primeira do país e chegou a 2,097 em 2009. A expectativa é que esse fator cresça nos próximos anos.
A equipe de três editores – Claude Pirmez (editora-chefe), Hooman Momen e Adeilton Alves Brandão – se reveza para mergulhar nos 12 novos artigos submetidos semanalmente e na administração desta revista publicada em 8 fascículos por ano. A média de tempo para um artigo submetido ser avaliado gira em torno de 3 meses, informam os editores desta revista inteiramente em inglês.
A Memórias tinha fascículos semestrais a anuais até 1927, tornou-se trimestral, e a partir de 1994 variou de quadrimestral, semestral ou anual, instabilidade que reflete as dificuldades enfrentadas por publicações brasileiras. O site que até 2012 era similar a publicação impressa, ganhou versão mais dinâmica e atraente, com informações relevantes para os leitores como os artigos mais acessados, ferramenta de busca e submissão online. Por incrível que pareça, esse formato ainda é exceção entre as publicações científicas brasileiras, que tendem a usufruir de um layout quadrado, como se os artigos tivessem parado no tempo e estivessem a espera de leitores fiéis à revista.
Novos tempos
A convite dos editores entusiasmado levei, no último dia 9 de setembro, um pouco da experiência do trabalho desenvolvido no Ciência em Revista em aproximar a divulgação científica da comunicação científica tradicional. Felizmente as revistas brasileiras, aos poucos, se atentam para os benefícios que as redes sociais, blogs e outros veículos de comunicação agregam a seu favor.
Superando as 91 milhões de contas no Facebook o Brasil só é superado pela Índia e Estados Unidos, e segue como rede social preferida entre os mais de 53 milhões de internautas (CGI, 2014).

Uma análise feita (05/09/2016) entre as 20 revistas científicas brasileiras da área médica com mais acessos no SciELO no último ano revela que 13 já possuem perfil no Facebook. No Entanto, 4 delas com menos de 40 curtidas (incluindo a Memórias com apenas 8), portanto, não ativas, 6 com mais de 1000 curtidas, das quais metade não são atualizadas a 3 ou 15 meses, além de outras 3 fanpages, uma desatualizada há mais de 15 meses. Esses dados nos mostram que apesar de serem publicações da área que mais gera interesse público e com maior volume de publicações, ainda lhes falta investir nesta que é a rede social mais popular do país. Mas a Memórias conta agora com a expertise de Claudia Jurberg, tecnologista da Fiocruz com experiência em divulgação científica e que atual editora assistente de mídias sociais da revista.
Mídias sociais
O trabalho que a Ciência em Revista realizou com editores científicos (2013-2015 Projeto Fapesp 2013/10075-8) indica que investir em redes sociais como o Facebook exige um planejamento estratégico (leia o tutorial), com ao menos uma pessoa responsável para fazer postagens frequentes, interagir com o público e publicar conteúdos exclusivos.
A rede social potencialmente amplia o número de leitores e submissões da revista, inicia um diálogo com os leitores e muitas vezes traz uma mudança de percepção no papel da publicação, que passa não apenas a ser uma fonte de informação sobre o tema de sua especialidade – já que compartilha informações relevantes da área, não necessariamente apenas publicadas em suas páginas – mas a se posicionar de maneira mais ativa em relação a temas da atualidade, por exemplo como no caso do zika vírus, ou seja, reforça um impacto social, sempre desejável.

Torço para que a exemplo das escolhas de Memórias outras revistas científicas se convençam da importância e dos benefícios que a comunicação nas redes sociais poderão lhes trazer. Não a toa, as grandes revistas internacionais, há décadas se dedicam em realizar comunicações estratégicas de seus conteúdos, contando com profissionais de comunicação em suas equipes e com diálogo frequente com a mídia. Neste processo, os autores de artigos científicos devem ser atores chave que estejam disponíveis a divulgar seus trabalhos, a fornecer materiais interessantes e com linguagem simplificada e, claro, a compartilhar seu artigo nas redes sociais pessoais ou acadêmicas.
Na próxima postagem vou trazer um interessante exemplo sobre o uso social de um belo artigo científico publicado na Memórias do Instituto Oswaldo Cruz. Em tempo, no último dia 12 de setembro a revista Memórias inaugurou seu perfil no Facebook, atualmente com 137 curtidas. Bravo!
Fico feliz e ao mesmo tempo esperançosa ao ler artigos como este. Desde que fiz minha iniciação científica, passei a sentir uma necessidade enorme em divulgar ciência. De que me adianta escrever sobre metodologias de ensino, conteúdos e outros aspectos ligados ao ensino do esporte, se quem está diretamente ligado à prática e distante do mundo acadêmico, não tem o mínimo acesso a informações tão relevantes? Foi num momento de reflexão de minha própria atuação como mestranda e como professora é que me dei conta de que necessitamos dessa via de comunicação consistente. Me intriga imaginar que o mundo acadêmico pode, em muitos casos, se "retroalimentar". Do mesmo modo que me desanima pensar que tantos professores se afastam das novidades que a literatura traz pelo simples fato de não haver essa democratização do conhecimento. Parabenizo a ação dessa revista, assim como do blog e do Labjor. Que esse trabalho cresça e nos permita uma real comunicação entre mundos, se assim posso dizer.
Paula, obrigada por compartilhar esta reflexão. A academia volta a se abrir para a sociedade de um modo mais direto por meio dos blogs e redes sociais, que nos permitem dialogar com o público diretamente sem precisar ser mediada - necessariamente - por jornalistas. Acho que a divulgação científica precisa fazer parte dos currículos de todo futuro cientista para sensibilizá-lo para a importância da comunicação mais ampla com a sociedade. Boa sorte pra você! abraço, Germana.