Patentes Patéticas (nº. 78)

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Além de usar óculos, uma maneira de parecer inteligente (ou até mesmo sensual) é mascar a ponta da haste de seus óculos enquanto se olha para o nada com um ar de quem está tendo um pensamento profundo ou buscando inspiração (mas na verdade não se vê quase nada). Enquanto pensava nisso, mascando as ponteiras de seus óculos, Adam S. Halbridge chegou a uma ideia: porque não adoçar esse ato de pensamento óptico-ruminativo? Para ter aparência ainda mais genial, ele patenteou seu Flavored boots for eyeglasses [Ponteiras flavorizada para óculos]:

A presente invenção inclui uma parte genericamente tubular com superfícies internas e externas, sendo que pelo menos a porção interna possa se conformar à superfície externa da extremidade da haste [do óculos]. A superfície externa dessa peça tubular é flavorizada com sabor de uma fruta, um doce ou algo apimentado, de modo que, ao mascar ou sugar a superfície externa dessa peça tubular, o usuário de óculos receba o sabor de fruta, doce ou pimenta. Uma característica adicional da presente invenção é que a ponteira pode ser formada de material plástico, o qual pode ser impregnado com sabor frutoso, doce ou apimentado. Outra característica da presente invenção é que material plástico pode ser flexível ou rígido. Outra característica adicional da presente invenção é que a ponteira pode ser formada por um material solúvel e comestível que seja impregnado com sabor de fruta, doce ou pimenta, de modo que a ponteira pode ser consumida pelo usuário.

Na patente nº. 5.202.707 [pdf], apresentada em na véspera do Natal de 1990 e aprovada em 13 de abril de 1993, Mr. Halbridge resumiu toda essa descrição em apenas uma sentença: “Uma ponteira flavorizada para óculos, que é colocada na extremidade da haste de um óculos e  flavorizada com sabor de frutoso, adocicado ou apimentado.” O inventor é natural de Houston, Texas.

Se você não entendeu nada até agora, vamos a uma pequena lição de anatomia do que a Wikipédia define como “dispositivos ópticos utilizados para a compensação de ametropias, e/ou protecção dos olhos” — ou óculos. Aro (16) é a parte onde as lentes são inseridas após a lapidação. Outrora eram sempre redondos e inteiriços, como os da ilustração; hoje podem ter praticamente qualquer forma e por vezes sustentam as lentes apenas pela parte superior. Ponte (18) é a parte que une os aros e que, em alguns casos, também se apoia sobre o nariz. Quando não são apoiados pela ponte, os óculos repousam sobre o nariz por meio das plaquetas (22), geralmente de plástico.

Agora, as partes que mais nos interessam: as hastes (12) são as “pernas” dos óculos e servem para apoiá-los e prendê-los pelas orelhas. As ponteiras (30) são capinhas, geralmente de plástico, que servem para evitar que as pontas das hastes, especialmente as metálicas, causem riscos e ferimentos ao quatro-olhos usuário (tembém há as charneiras, ou seja, as dobradiças).

Ok, após essa lição edificante — eu mesmo não conhecia esses termos —, vamos considerar a (in)utilidade dos óculos de Halbridge. Antes de mais nada, ele considera sua ideia original. E de fato é. Curiosamente, ele cita outras cinco patentes relacionadas, o que mostra que a ideia de ponteiras protetoras surgiu diversas vezes desde 1942. Mas como foi que nosso oculista texano convenceu o U.S. Patent Office? Vejamos sua argumentação na patente citada:

Muitos indivíduos que usam óculos frequentemente irá removê-los e colocar a ponta da haste em sua boca, seja para mascar ou chupar a ponta. Tais ações, o mascar em particular, pode deixar indentações ou marcas indesejáveis nas pontas das hastes, causando ligeiros danos aos óculos. Quando o usuário masca ou chupa a extremidade da haste, não sente nenhum gosto ou sabor. Acreditamos que muitos usuários adultos que mascam a ponta de seus óculos adorariam ter um sabor desejável à disposição quando mascam ou chupam as pontas. Acreditamos que muitos usuários jovens, crianças ou adolescentes, que podem não estar usando óculos de grau mas apenas óculos-escuros, também adorariam ter um sabor agradável se mascam as hastes de seus óculos. Adicionalmente, seria desejável ter algo que protegeria o material que forma a haste dos óculos das marcas dos dentes deixadas do modo previamente descrito.

Não podemos discordar que todo mundo quer uma vida mais doce. E os sabores propostos parecem bons: caramelo, canela, alcaçuz, doces ou frutas. Mas seria realmente confortável ter uma ponteira doce e comestível atrás da orelha? Se uma haste de plástico mordiscada já lhe parece nojenta, imagine uma toda úmida e babada, praticamente se desfazendo ou mesmo sendo inteiramente consumida por alguém que tenta sensualizar com a ponta dos óculos…

A função de uma ponteira é meramente proteger (tanto os óculos quanto o usuário) e não divertir. Se bem que Halbridge ainda propõe a alternativa de sabores apimentados — como de jalapeño —, o que poderia contribuir para a inibição desse hábito. Ou não.

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