Patentes Patéticas (nº. 82)

http://www.google.com/patents/US112

Quanto mais antiga uma patente, mais provável que ela seja de algo realmente útil. Afinal, muita coisa ainda não havia sido inventada e, portanto, podia ser registrada — só que isso inclui muitas patentes patéticas. O pioneiro dessa série deve ter sido Hezekiah L. Thistle, com sua Saddle for Removing the Sick and for Other Purposes [Sela para remoção dos doentes e outros propósitos], que consiste em uma

sela para transportar os doentes e feridos e para servir também como cangalha [pack saddle] quando não usada para o propósito acima, seja construída na maneira precisa aqui descrita ou em qualquer outra, produzindo uma sela para um propósito substancialmente similar.

Patenteada em 21 de janeiro de 1837, sob o número 112* [e disponível apenas em pdf], a sela especial de Thistle é um aperfeiçoamento da sela comum, ou melhor de uma sela de carga ou cangalha. Em duas curtas páginas — uma de ilustrações e uma com apenas 70 linhas de texto — Hezekiah Thistle descreve seu invento.

Sua vantagem, por assim dizer, é que ela possibilita o transporte de doentes (ou defuntos) sobre cavalos. Trata-se de uma espécie de caixão (sem tampa) que é apoiado sobre molas fixadas numa sela de madeira. Por segurança, há amarras couro extras. Afinal, pra que usar uma carroça quando um único animal basta para carregar um ferido, moribundo e/ou defunto?

O que Thistle — natural de Nova Orleans, Lousiana — deixa de lado é o manejo. O cavalo-ambulância (ou cavalo-rabecão) seria conduzido por alguém a pé (ou a cavalo) ou andaria sozinho? A ilustração completa nos leva a crer na segunda possibilidade. Talvez as vantagens parecesem óbvias naqueles tempos de velho-oeste e por isso não há nenhuma justificativa ou discussão técnica na patente. O texto de Thistle é meramente descritivo. Curiosamente, o resumo que sempre citamos ficava no fim da patente…

Essa patente foi tão patética que nenhuma de suas propostas foi aproveitada. Após o invento, os doentes ou falecidos continuaram a ser levados em carroções ou carros-de-boi enquanto que a carga continuou sendo transportada em cangalhas acolchoadas e amarradas bem junto ao lombo do animal — isso quando não havia carros-de-boi, carroções ou mesmo as primeiras marias-fumaça.

______________________
* O leitor mais sagaz deve estar se perguntando: Se o U.S. Patent Office foi fundado em 1790, como havia apenas 112 patentes em 1837? Não havia muitas, na verdade. Cerca de 10.000 patentes foram destruídas em um incêndio ocorrido em dezembro de 1836. Como a coleção de patentes ficou incompleta, o USPTO resolveu recomeçar a numeração. Atualmente, essas patentes pré-incêndio são as patentes-X, pois receberam um X após o número original.

Em si, o desastre foi triplamente irônico. Ironia nº. 1: o desastre ocorreu durante a construção de um depósito mais “à prova de fogo”. Ironia nº. 2: o dano foi grande embora o incêndio tenha ocorrido em um depósito temporário situado ao lado de uma estação dos bombeiros. Ironia nº. 3: os bombeiros mal conseguiram apagar o incêndio porque, às vésperas do inverno, suas mangueiras ficaram congeladas!

chevron_left
chevron_right

Join the conversation

comment 0 comments
  • rafinha.bianchin

    Numa sela especial, os familiares/amigos mais próximos não poderiam ir junto com o seu morto, o que torna o projeto simplesment incoscequente.
    E não sabia que saia textos no domingo.

    • Renato Pincelli

      Boa observação, rafinha. E o texto só saiu hoje porque ontem queria evitar a fadiga...

    • rafinha.bianchin

      Ah, tá explicado. "Para que fazer hoje o que se pode deixar para amanhã"? A princípio, parece apenas uma inversão da famosa máxima, mas é um pensamento que faz mais sentido do que o original, por certo ponto de vista. Reflitam, por favor!
      PS.: Esse pensamento não é valido, repito, NÃO É VALIDO para blogueiros cujos textos servem de motivação para dezenas (ou centenas? Milhares?) de pessoas que visitam diariamente o site, além de investirem pesadamente contra a(s) tecla(s) F5/ctrl+r.

Leave a comment

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Comment
Name
Email
Website