Patentes Patéticas (nº. 94)

http://www.google.com/patents/US1187218

Há inventores que parecem genuinamente inspirados pela Acme, Inc — ainda que seus inventos tenham sido criados e patenteados antes da fictícia (e patética) companhia da Warner Bros. Já vimos, por exemplo, a pá/ancinho e a cadeira de dentista elétrica. O invento de hoje é mais um clássico digno de desenhos animados.  Trata-se de uma simples “Firearm” (“Arma de Fogo”), mas com um cano curvo:

Minha invenção relaciona-se particularmente às armas de fogo usadas na guerra de trincheiras. […] Um objetivo da invenção é construir uma arma de fogo de modo tal que possa ser usada em uma trincheira com o auxílio de um periscópio, sem [a necessidade de] exposição do soldado ao fogo do inimigo. Este objetivo foi alcançado pela curvatura da extremidade do cano, de modo a defletir o projétil numa direção em ângulo com a linha longitudinal da arma de fogo.

Sim, crianças, houve um cara que inventou e patenteou uma arma de cano curvo — como aquelas que às vezes aparecem nos episódios de caça do (ou ao) Pernalonga. Ou melhor, um pedaço de cano curvo para armas de fogo. O nome do cara é Jones Wister e a patente — requisitada em 15 de março de 1916 e aprovada em 13 de junho de 1916 — é a de número 1.187.218 [disponível apenas em pdf]. Dado o contexto histórico, não é difícil perceber que a aprovação deve-se mais à Grande Guerra na Europa e suas trincheiras fatais do que à genialidade do inventor ou à praticidade do engenho.

Mr. Wister — mais um inventor de Filadélfia, Pensilvânia — não se fez de rogado na patente. Ele clama que, embora seu aperfeiçoamento seja “especialmente adaptado para uso em conexão com armas pequenas, como rifles”, sistemas similares podem ser usados em “certos tipos de canhões, sem se afastar da essência da invenção”, além de “certos tipos de metralhadoras”.

Mas será que é fisicamente possível? Funciona mesmo? O inventor tenta explicar:

Com esta construção, o projétil passará livremente através da seção curvada sem prender-se. Mas haverá uma certa quantidade de resistência friccional, devida ao projétil entrar em contato com a porção externa da parede curvada. Isso, porém, não irá dimunuir substancialmente a velocidade do projétil e, no presente caso, essa porção da parede será aumentada em espessura, conforme mostrado [pela fig. 2].

Wister twistAo tratar da munição, Wister recomenda o uso de uma “bala redonda, ajustada ao cano” ou de uma série de “balas menores, conhecidas como ‘buck shot’ [espécie de chumbinho de caça]”. Munições alongadas, segundo o inventor, exigiriam reforços na parte curva da arma, o que obviamente lhe aumentaria o peso e dificultaria o manuseio. As cargas recomendadas têm curto alcance, mas segundo o inventor isso não é um problema em caso guerra de trincheira.

Falando em facilidades de manuseio, a parte curva do cano é retrátil, o que permitiria o uso da arma em situações que exigem disparos mais intensos ou de longo alcance. Outra facilidade, ainda que opcional, é o periscópio, formado simplesmente por um par de pequenos espelhos, também retráteis, inclinados a 45º e alinhados entre si. Mas como não têm proteção, seria fácil quebrar ou perder esses espelhinhos em campos de batalhas. Ou trincheiras, que seja.

Apesar dos aperfeiçoamentos e dos detalhes interessantes, a curva de Wister pode não ter sido inédita e nem única. Soldados australianos desenvolveram “rifles periscópicos” durante a I Guerra Mundial — mas nesse caso eram rifles mantidos na horizontal, com periscópios verticais ligados à coronha e equipados com mecanismos que permitiam uma espécie de disparo indireto. Durante a II Guerra Mundial, os alemães (inspirados por Wister ou por desenhos animados?) teriam experimentado algo do tipo, mas para a guerrilha urbana em vez de trincheiras.

O que os tedescos descobriram com sua Krummlauf é que, apesar da potência em curto alcance, o equipamento não tinha vida útil longa (cerca de 300 disparos) graças aos estresses materiais de ter que desviar uma bala logo após dispará-la. Não raro, a munição saía fragmentada do cano, gerando efeitos imprevisíveis. Entupimentos também foram comuns e a dispersão dos gases do disparo era problemática.

A única certeza que temos é que é mesmo inviável dobrar canos de armas — se não fosse, nós teríamos relatos do uso dos dispositivos Wister em documentários sobre as trincheiras da I Guerra e não em desenhos animados…

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comment 0 comments
  • rafinha.bianchin

    Seria um equipamento interessante se fosse mais seguro que se lançar na terra-de-ninguém armado apenas com uma baioneta...
    E pensar que o brinquedinho alemão foi considerado uma Wunderwaffe! Alemães são estranhos no ramo bélico... mas não mais que os americanos! Só os britânicos construíam coisas decentes e ... OH, WAIT!

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