Faleceu, no dia 23 de junho deste ano, a professora Lucy Seki, um dos maiores nomes da pesquisa com línguas indígenas na América Latina.
Lucy Seki nasceu em Belo Horizonte (Minas Gerais), em 27 de março de 1939. Estudou bacharelado em História na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), momento em que iniciava seu interesse pelos povos indígenas. Mas o fascínio de Lucy pela cultura indígena começou, de fato, só a partir de 1968, quando conheceu os índios Kamaiurá, no alto Xingu, enquanto era auxiliar da antropóloga Carmem Junqueira, então professora titular da PUC-SP. Nesse período, o contato entre índios e brancos ainda era muito restrito, devido à política dos irmãos Villas Boas. Dessa sua primeira experiência no trabalho de campo, resultaram estudos da fonologia da língua Kamaiurá e de alguns aspectos de sua gramática, presentes em seus trabalhos de mestrado e doutorado, na Universidade Patrice Lumumba, em Moscou. Em 1977, Lucy foi contratada pela Unicamp, universidade onde lecionou durante toda a sua vida. Pelo país afora, Lucy despertou o interesse pela tipologia linguística e pelas línguas indígenas em várias gerações de linguistas brasileiros.
Sua obra “Gramática do Kamaiurá: Língua Tupi-Guarani do Alto Xingu”, publicada em 2000, foi considerada a única descrição gramatical abrangente de uma língua indígena brasileira, publicada por um brasileiro. Em 2010, Lucy foi eleita membro honorário da Linguistic Society of America — um título conferido em reconhecimento a linguistas não residentes nos EUA que tenham feito contribuições significativas a nossa área. Em 2012 Lucy publicou sua monumental compilação de narrativas Kamaiurá, “O que habitava a boca de nossos ancestrais”, resultado de mais de 40 anos de pesquisas. Lucy fundou, também, a revista LIAMES (Línguas Indígenas da América do Sul), o mais importante periódico científico brasileiro, dedicado exclusivamente às línguas indígenas do continente.
Lucy Seki foi e é uma das mais importantes pesquisadoras no campo das línguas indígenas brasileiras. Especialista nas línguas Kamaiurá (família Tupi-Guaraní) e Krenák (tronco Macro-Jê), Lucy contribuiu também para o conhecimento de várias outras línguas indígenas, tanto em seus próprios estudos, como através da orientação de dezenas de teses e dissertações.
Quem teve o prazer de conhece-la, percebeu que, além de linguista, Lucy era uma mãe amorosa, não só para seus filhos biológicos, como também para os índios com os quais conviveu durante toda a sua vida. Gostava de cantar e cantava lindamente. Nas festas em sua casa, era sempre possível ouvir Mercedes Sosa, Violeta Parra, cantos indígenas e tantas outras formas de arte que, juntamente com sua vida, nos fizeram ver quem era Lucy. Tinha uma voz calma e doce, que por vezes até deixava esconder seu gênio forte e sua firmeza de vida. Nos seus últimos anos, Lucy dizia sentir falta das viagens ao Xingu, dos cantos das mulheres indígenas, de comer peixe assado ao anoitecer, da vida simples dos Kamaiurá.
Lucy faleceu no dia 23 de junho deste ano, deixando dois filhos e dois netos. No dia em que faleceu, Ludoviko dos Santos escreveu: “Chora meu coração, choram meus olhos, entristece-se meu universo. Minha amiga Lucy resolveu ir cuidar da linguagem dos anjos. Pena para nós, sorte dos anjos”.
Lucy Seki se foi fisicamente, mas seu nome e sua trajetória jamais poderão ser esquecidos. Ela certamente deixará um legado inenarrável aos novos pesquisadores de línguas indígenas, além de uma saudade enorme no coração daqueles que tiveram o imenso prazer de conhece-la.
Que Lucy sempre viva!
Viva a grande Lucy, mulher de fibra e grande pesquisadora de línguas indígenas. Ótima homenagem a ela!
Ótimo post Paulo.
Em breve teremos o acervo da professora Lucy no CEDAE, provavelmente em meados de março.
Será lindo ter o acervo da Lucy no CEDAE, Thiago! Parabéns pelo trabalho de vocês em reunir tudo isso. O Angel me disse que vocês fariam essa seleção. Espero poder ver tudo em março. Um abraço. Paulo.