Ozonioterapia e óleo de Cannabis são técnicas promissoras para aliviar dor em animais

Por Caroline Marques Maia

Resultados científicos positivos e melhora na qualidade de vida dos pacientes são cada vez mais evidentes

Tratar a dor é um aspecto importante para melhorar o bem-estar dos animais, mas os tratamentos convencionais com analgésicos podem causar sérios efeitos colaterais. Em situações de dor crônica, a questão é ainda mais complicada, porque o uso desses medicamentos pode ser prejudicial para a saúde dos animais a longo prazo. Nesse cenário, tratamentos alternativos que apresentam bons resultados e poucos efeitos adversos acabam se tornando uma opção interessante. A ozonioterapia e a administração de canabinóides são técnicas alternativas para tratar a dor e outros problemas de saúde animal, que vêm ganhando cada vez mais espaço. 

Não é de hoje que o ozônio vem sendo utilizado como uma técnica de tratamento. “Ele é usado desde a primeira guerra mundial e, contrariamente ao que se fala, existem muitas evidências científicas que sustentam a ozonioterapia em humanos e animais”, comenta Stelio Luna, docente da Unesp que coordena um grupo de pesquisas sobre dor e qualidade de vida em animais. Com relação ao tratamento com canabinóides na veterinária, mesmo ainda com poucos estudos em animais, pesquisas em humanos e a prática clínica têm trazido bons resultados. “A maioria dos meus pacientes recebe Cannabis e eu vejo realmente um efeito analgésico bastante rápido”, destaca Nadia Crosignani, docente da Universidade da República, em Montevidéu, no Uruguai, que trabalha e pesquisa os efeitos dos canabinóides em cães e cavalos. 

A ozonioterapia

O tratamento com ozônio é uma técnica alternativa que está ganhando cada vez mais espaço na medicina humana, mesmo ainda não tendo a aprovação do Conselho Federal de Medicina no Brasil. A técnica, que utiliza o gás ozônio como agente terapêutico, está sendo usada também na medicina veterinária e tem a vantagem de poder tratar diversos problemas de saúde dos animais. “A gente consegue tratar principalmente infecções, sejam de origem bacteriana, fúngica ou viral, dado o potencial antimicrobiano do ozônio, e ele também tem uma ação especial como agente analgésico e anti-inflamatório”, comenta Rafael Traldi, veterinário instrutor dos Cursos de Ozonioterapia do Instituto Bioethicus e um dos fundadores da Associação Brasileira de Ozonioterapeutas Veterinários.

Os estudos nessa área mostram que a aplicação de ozônio terapêutico pode ter os mesmos efeitos do tratamento mais convencional. “Nós temos um estudo mostrando que o uso de ozônio por via intraretal foi tão eficaz como o uso de anti-inflamatório para tratar a dor pós-operatória em cães”, destaca Stelio. O estudo foi publicado em 2013 na revista The Veterinary Journal. Na prática, a ozonioterapia também tem apresentado resultados positivos. “Muitos pacientes que são tratados com ozonioterapia, seja de maneira isolada ou em conjunto com a alopatia – tratamento convencional, têm uma melhora significativa”, pontua Rafael. 

Administração de soro ozonizado em cão intoxicado. Créditos: Rafael Traldi

Mas então, por que a ozonioterapia não é mais difundida e aceita como uma técnica eficaz para o tratamento de diversos problemas de saúde dos animais? A resposta pode estar no poder econômico envolvido, segundo Stelio. “O problema dessas terapias, é que elas não são vinculadas aos laboratórios farmacêuticos. O poder econômico por trás da medicina convencional acaba gerando a tendência de denegrir essas terapias alternativas, como se elas não tivessem evidência científica”. Mas o veterinário alerta que, de fato, existem outros tratamentos alternativos que não tem nenhuma comprovação científica, com os quais temos que tomar cuidado. “Há muitas terapias que realmente não têm evidência científica, mas esse não é o caso da ozonioterapia”. 

O tratamento com ozônio também pode ser aplicado em conjunto com acupuntura, outra técnica de tratamento alternativo, e ter bons resultados. “Um trabalho publicado pelo professor Stelio investigou o efeito da aplicação de ozônio em pontos de acupuntura, comparado com analgésicos e anti-inflamatórios tradicionais em cadelas que fizeram castração, demonstrando a eficácia dessa técnica, que podemos chamar de ozoniopuntura. Então você tem o sinergismo entre essas duas técnicas”, destaca Rafael.

O tratamento com canabinóides

Os canabinóides são derivados de plantas do gênero Cannabis, que inclui a planta popularmente conhecida como maconha, considerada uma droga ilícita no Brasil. Assim, o tratamento com Cannabis geralmente é um tema polêmico. “Os canabinóides são, de certa forma, denegridos do ponto de vista farmacológico por conta do uso da maconha como entorpecente, mas isso é um paradoxo. Enquanto o álcool, que é uma das piores drogas em nível de efeito físico ou psíquico, é liberado, outras substâncias com uma toxicidade menor e com menos efeitos adversos, como os canabinóides, são proibidas. A ingerência do poder político muitas vezes acaba dificultando o uso de substâncias que poderiam ter um efeito muito positivo”, pontua Stelio.

Estudos científicos vêm demonstrando a eficácia dos canabinóides no tratamento de alguns problemas de saúde. “Já há bastante evidência científica na medicina humana para tratamento de alguns tipos de convulsão ou de dor, e agora começamos a ter alguns resultados interessantes na medicina veterinária também. Em um estudo nosso em andamento na universidade de Montevidéu, em parceria com a professora Nadia Crosignani, os resultados têm sido bem promissores no sentido de reduzir a dor em animais com osteoartrose, que é uma das principais doenças que gera um processo inflamatório doloroso importante”, comenta Stelio.

Nadia, docente da Universidade da República Uruguai em Montevideo, administrando óleo de Cannabis via oral para o cão Aquiles, que tem dor crônica por osteoartrose. Créditos: Erica Gutierre.

O principal estudo científico já concluído que sustenta o tratamento de dor em animais com canabinóides foi realizado na Universidade de Cornell nos Estados Unidos e publicado na revista Frontiers in Veterinary Science em 2018. “Esse estudo, que é bem confiável do ponto de vista de rigor científico, avaliou cães com osteoartrose que receberam o tratamento com canabinóides durante quatro semanas. Os cães apresentaram grande melhora, com diminuição de dor crônica causada pela osteoartrose”, comenta Nadia. 

Segundo a veterinária, outros estudos na área avaliaram a absorção da Cannabis via oral e transdérmica, ou seja, através da pele, ou comparando a absorção oral por óleo ou um tipo de ‘bolacha’ que é ingerida pelos cães. “Já sabemos que a melhor forma de administrar a Cannabis para os cães é bucal, através do óleo de Cannabis, porque mesmo que engulam uma parte, ocorre absorção sublingual, gerando maior pico de concentração e maior permanência na corrente sanguínea do que as ‘bolachas’, em que a absorção ocorre apenas nos intestinos”.

Uma vantagem do canabidiol é que mesmo apresentando alguns efeitos colaterais, não existem riscos de morte por overdose como ocorre com outras drogas. “A dose letal para os animais é tão alta que é impraticável, mas temos que estar atentos ao efeito de sedação se houver a ingestão de uma dose alta acidental. Nesses casos precisamos ficar de olho na pressão arterial e na glicemia do animal”, pontua a veterinária. Além disso, precisamos conscientizar os tutores que embora o tratamento com Cannabis esteja trazendo resultados promissores, ainda não se sabe todos os possíveis riscos. “As pessoas muitas vezes têm a falsa ideia de que sendo um tratamento natural, não pode causar nada de ruim para o animal, mas a verdade é que não sabemos. E como os medicamentos de farmácia são caros, as pessoas podem acabar optando por remédios caseiros, dos quais não dá para ter certeza sobre concentração e pureza, o que pode ocasionar ineficácia ou efeitos colaterais que podem ser graves”, finaliza Nadia.

Os resultados dos tratamentos com canabinóides e ozonioterapia tem sido tão promissores que a terapia com ozônio em animais no Brasil tem a aprovação da Associação Brasileira de Ozonioterapeutas Veterinários (ABO3Vet), fundada em 2017, e na América Latina está se formando a Associação de Medicina Veterinária Canabinoide (AMVC Latam), que conta com um representante brasileiro.

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