Inclusão na educação superior interfere no ciclo de reprodução das desigualdades

Foto: Gustavo Diehl - SECOM UFRGS Vestibular 2018 (com alterações).

Por Ana Luíza Matos de Oliveira *

Com mais cortes na educação superior,  esta área tem estado ainda mais sob escrutínio popular: são questionados os recursos que o país emprega em educação superior, que supostamente não dariam retorno à sociedade. Vejamos alguns retornos que o investimento em políticas públicas para ampliar e diversificar o acesso à educação superior pode ter para o Brasil neste breve texto.

Os dados mostram que o quadro da educação superior mudou muito no início do século XXI com a inserção de mais pobres, de negros e a ampliação de vagas de graduação em Unidades da Federação fora do eixo Sul-Sudeste-Brasília. Gráfico retirado da minha tese de doutorado (https://bit.ly/2Hekxhj) mostra que de 2001 a 2015 cresce a quantidade de estudantes sem rendimento ou com renda per capita domiciliar de até ¼ de Salário Mínimo (SM), mas os aumentos mais expressivos em termos absolutos ocorrem entre os estudantes com renda per capita domiciliar entre ¼ de SM e 2 SM. Obteve também crescimento, mas menor, o grupo com renda entre 2 e 3 SM. Caiu o número de estudantes renda de mais de 3 SM. O gráfico 1 considera os estudantes de graduação de instituições públicas e privadas, pois no período analisado tanto o setor privado como o setor público cresceram ancorados em políticas públicas voltadas à inclusão, como o Prouni, Reuni, Ações Afirmativas, FIES, entre tantas outras.

Gráfico 1 – Estudantes da graduação por faixas de renda per capita (2001-2015)

E por que é importante diversificar o acesso à educação superior? É importante, entre outros motivos, porque, junto ao Chile, o Brasil é o país em que ter um diploma de graduação mais impacta nos rendimentos futuros: o Brasil é um dos países com maior diferencial de renda entre uma pessoa com graduação e uma pessoa sem graduação. Continuar a colocar na educação superior somente os membros das camadas mais privilegiadas da sociedade significa aprofundar desigualdades históricas. Assim, interferir no ciclo de reprodução das desigualdades, colocando mais pobres na educação superior, é uma medida que pode impactar as estruturas desiguais da sociedade brasileira.

O quadro seria ótimo, não fosse o fato de que esta inclusão está em risco: desde 2015, com a crise econômica que impacta nas decisões de gasto das famílias e com o corte nos gastos com educação em geral e educação superior, o sentido da inclusão parece estar mudando, ao menos quanto à renda. Não voltamos ao quadro de 2001 (como mostra o gráfico 2), mas a inclusão no mínimo parece ter desacelerado.

Gráfico 2 – Participação dos 70% mais pobres e 30% mais ricos entre os estudantes de graduação, Brasil (2001 – 2017)

* Ana Luíza Matos de Oliveira é Economista, Professora visitante da Faculdade Latinoamericana de Ciências Sociais (FLACSO) e Doutora em Desenvolvimento Econômico (Economia Social e do Trabalho) pela Unicamp.

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